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Mundo Como uma missão humanitária salvou milhares de dinamarqueses da morte em campos de concentração

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Ônibus dinamarquês chega a Odense, na Dinamarca; missão humanitária foi possível com diplomacia de países escandinavos (Foto: Reprodução/Museu Nacional da Dinamarca)

Durante a infância e a adolescência, a memória mais forte do historiador dinamarquês Hans Sode-Madsen era a do silêncio opressivo que pairava em sua casa, uma das consequências perturbadoras, segundo ele, de conviver com um ex-prisioneiro de um campo de concentração nazista na Segunda Guerra Mundial.

Seu pai, o policial Erik Madsen, sobreviveu oito meses em cativeiro, até ser resgatado durante maior operação humanitária da Dinamarca. Sode-Madsen desvenda a importância da participação dinamarquesa nessa missão voluntária que salvou mais de 17 mil pessoas das forças alemães no seu livro “De hvide busser – reddet fra Hitlers helvede” (“Os ônibus brancos – resgatados do inferno de Hitler”, em tradução livre, ainda sem edição em português).

Aos 73 anos, o historiador narra pela primeira vez, na reedição lançada este ano, os traumas deixados pelo campo de concentração não só em seu pai, mas em toda a família.

“Minha infância e juventude não foram muito felizes. Então quando comecei a estudar História na Universidade de Copenhague não tinha intenção de escrever qualquer coisa sobre a ocupação alemã ou sobre suas consequências para minha família”, diz.

Anos depois, porém, conheceu em seu local de trabalho, o Arquivo Nacional dinamarquês, dois oficiais que tiveram papel fundamental nas negociações de resgate, H.H. Koch e Finn Nielsen, e que começaram a fazê-lo se abrir para aquela “jornada tardia de volta à história de sua infância”, como ele descreve.

Completando-se 70 anos da missão humanitária, a pesquisa histórica serviu de base para uma exposição também chamada “Os ônibus brancos”, que está em cartaz no Museu Nacional da Dinamarca, em Copenhague, até janeiro de 2016.

Mais de seis mil presos
A ocupação alemã da Dinamarca começou em 1940, inicialmente considerada “pacífica” e sob a promessa de não interferência em assuntos domésticos. Aos poucos, no entanto, comunistas, judeus e resistentes foram presos.

Em 1943, os alemães declararam lei marcial e desarmaram os militares. Em setembro de 1944, dois mil policiais foram levados para campos de concentração. Ao todo, 6,1 mil dinamarqueses foram deportados.

O policial Erik Madsen estava entre eles. Aos 26 anos, vivia com a família em Copenhague e, durante uma visita à escola de polícia da capital, foi preso junto a outros colegas e levado dentro de um vagão de gado ao campo de concentração de Neuengamme, próximo a Hamburgo, na Alemanha.

O sinal de chegada ao campo era o fedor: de vegetais podres usados na alimentação misturado a detritos de detentos e corpos. Na entrada, roupas e bens eram confiscados; cabelo e pelos do corpo eram raspados com navalhas cegas, sob o argumento de evitar piolhos.

Os banhos comunitários eram congelantes, e eram usados, também contra piolhos, produtos químicos que queimavam a pele. A rotina começava às 4h30 com trabalhos forçados e cessava apenas às 21h, com intervalos para refeições escassas.

Apesar da degradação física, as cartas enviadas por Madsen a sua casa eram cheias de esperança, relembra o historiador.

No entanto, depois que ele voltou para casa, em maio de 1945, a realidade se mostrou diferente. O historiador tinha 2 anos quando o pai foi preso. Portanto, diz que sua memória sempre foi a de uma pessoa acuada.

“Ele não falou sobre o que passou nos meses anteriores. O silêncio era e ainda é uma atitude comum entre os ex-prisioneiros. Lembro-me dele como um homem muito nervoso, e, ao mesmo tempo, muito solitário e reservado. Para ser honesto, tinha medo e pouco contato com ele até os 18 anos”, desabafa.

O cuidado com as pessoas que voltavam era tão grande que não sobrava espaço para as crianças. As mais sortudas tinham avós que podiam preencher esta lacuna. No meu caso, minha avó e minha tia foram um fator salvador”, lembra Sode-Madsen, que admite ter vivido problemas psicológicos por conta do trauma do pai.

“Como muitos filhos de ex-prisioneiros, tive um colapso nervoso. Mas, com a ajuda de um psicólogo, consigo levar uma vida muito melhor hoje.”

De policial uniformizado, o pai passou a trabalhar numa oficina mecânica. Quase uma década depois, enviou uma carta ao serviço de seguros do país, contando ainda sofrer traumas da experiência, como medo de estar próximo de pessoas ou sair à noite.

Compensações financeiras e aposentadorias prematuras foram distribuídas a muitos ex-detentos, inclusive a Erik, que faleceu em 2001, aos 83 anos.

Pressão dinamarquesa
Nem todos voltaram para casa. Cerca de 10% dos dinamarqueses morreram nos campos. O índice é, entretanto, o menor entre as nações europeias – que chegam a ultrapassar os 80% –, e muito se deve, segundo Sode Madsen, à operação humanitária.

Desde o início das prisões no país, autoridades dinamarquesas passaram a pressionar os alemães para que a ajuda aos prisioneiros fosse permitida, inicialmente reivindicando o direito a correspondências, envio de roupas e alimentos.

Logo, intensificaram-se as negociações de libertação junto ao Ministério das Relações Exteriores.

Em 1944, uma pequena operação salvou poucos dinamarqueses. O sucesso da ação aumentou as ambições de um resgate maior, e a ideia que surgiu do governo dinamarquês em Copenhague passou pelo comitê de resgate da Noruega e chegou à Cruz Vermelha sueca.

Após muitas tentativas frustradas de chegar a um acordo com a Alemanha, a missão para livrar escandinavos dos campos de concentração se materializou em fevereiro de 1945, num momento em que os nazistas já davam sinais de perder a guerra.

Foi o conde sueco Folke Benadotte quem conseguiu o aperto de mãos com o Heinrich Himmler, então coordenador dos campos de concentração, concordando com a libertação dos presos. Por isso, a operação ficou conhecida entre historiadores pelo nome do conde.

Mas Sode-Madsen traz à tona em seu livro, considerado obra de referência sobre este capítulo na história, o mérito dinamarquês, de onde surgiu a iniciativa e saíram os comboios, como os “ônibus brancos”.

Foram 75 veículos, dos quais 36 ônibus pintados na cor branca, para evitar confusão com os veículos militares alemães. Neles, um grupo de cerca de 300 militares, médicos e enfermeiras deixaram seus lares voluntariamente para se aventurar em terras inimigas.

A equipe montou base em Padborg, na fronteira entre a Dinamarca e a Alemanha. Ali, as vítimas recebiam atendimento médico e ficavam em quarentena antes de seguirem viagem. Os primeiros resgatados chegaram em casa em março de 1945, e a operação seguiu até maio daquele ano.

Cada jornada era capaz de transportar mil pessoas, que, ao final, não se limitavam apenas a escandinavos. A cada desembarque dos ônibus, as ruas ficavam lotadas de parentes e curiosos, naquele momento mais esperançosos com o futuro das famílias e o fim da guerra.  (BBC)

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