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Por Redação O Sul | 16 de julho de 2017
O traficante Luiz Carlos da Rocha, o Cabeça Branca, completou 58 anos na última terça-feira, dia 11, numa cela de cerca de sete metros quadrados na Penitenciária Federal de Catanduvas, no Paraná. Longe do luxo da vida milionária, o aniversário foi comemorado sozinho em uma cama de concreto ao lado uma pia, um sanitário, uma mesa e um chuveiro. Comeu o prato do dia: arroz com feijão, filé de peixe à milanesa, polenta, salada de repolho com cenoura, farofa e, de sobremesa, frutas. O bandido foi levado para o presídio de segurança máxima no dia 4, depois de ser preso quatro dias antes na cidade de Sorriso, em Mato Grosso, numa operação da Polícia Federal que poderia virar roteiro de cinema.
Cercada de sigilo, a ação levou um ano e seis meses, planejada por um grupo restrito de apenas oito policiais federais. Tanto zelo tinha motivo: por duas décadas, o criminoso viveu como um fantasma, procurado pela polícia brasileira e de vários outros países como o maior traficante de drogas da América Latina, e com o nome na difusão vermelha da Interpol. Uma fama no submundo do crime que só pode ser comparada à de outro notório bandido: o colombiano Pablo Escobar, morto na cidade de Medellín, na Colômbia, em 1993.
Agindo nas sombras, ao contrário de Escobar, que gostava dos holofotes, Cabeça Branca comandou por mais de duas décadas um esquema de tráfico internacional de drogas responsável por abastecer mensalmente com pelo menos cinco toneladas de cocaína, com alto grau de pureza, países na Europa, na África e nos Estados Unidos. No Brasil, seria o principal fomentador da guerra travada entre quadrilhas rivais de criminosos no Rio e em São Paulo, fornecendo cocaína mais barata e sem tanta pureza para bandidos ligados às maiores facções do país.
Em mais de 20 anos de atividades no crime, a Polícia Federal estima que ele tenha reunido uma fortuna em bens que chegariam a pelo menos US$ 100 milhões (cerca de R$ 325 milhões) e movimentado uma cifra superior a R$ 1,2 bilhão. Valores que transformam Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, e Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, bandidos classificados como barões das drogas no continente, como criminosos pés-de-chinelo. Não há ninguém do nível de Cabeça Branca sendo procurado pela Polícia Federal no momento.
A PF tem informações de que o traficante teria no bolso um punhado de políticos no Paraguai, incluindo na suspeita senadores e deputados; outros tantos no Brasil, em especial na região de fronteira com o Paraguai. Teria comprado ainda, com gordas propinas, servidores públicos estaduais e federais em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo, além de supostamente pagar pelo apoio de funcionários dos portos de Santos e Itajaí, por onde escoava sua mercadoria.
Os policiais federais devem pedir esta semana a quebra dos sigilos bancário e fiscal de cerca de 30 pessoas ligadas a Luiz Carlos da Rocha. Um número ainda considerado pequeno. Na relação de alvos estão parentes e uma rede de laranjas.
Na primeira fase, a Justiça Federal autorizou o confisco de quatro apartamentos em endereços nobres no Paraná e São Paulo; três casas em condomínios nos dois estados, uma fazenda em Ponta Porã e um terreno. Também foram alvos de sequestro uma frota de veículos, como carros de luxo e caminhões usados no transporte da droga. Em dois deles, os agentes localizaram cerca de 1,3 tonelada de cocaína em fundos falsos. Os motoristas foram presos.
Em dois endereços, em imóveis usados pelo traficante, os policiais encontraram uma fortuna: cerca de US$ 4,45 milhões (em torno de R$ 13 milhões) em espécie. Em Osasco, escondidos num closet luxuoso, havia US$ 3,45 milhões guardados em malas; e no bairro do Butantã, em São Paulo, dentro de sacolas de papelão, foi localizado mais US$ 1 milhão. Também foram recolhidos relógios da marca Rolex, garrafas de vinhos caros (com um Petrus, que pode chegar a mais de R$ 27 mil), joias e bolsas de grife famosas. Essa parte ainda não foi avaliada.
Os policiais federais acreditam que Cabeça Branca rejuvenesceu à custa de pelo menos três cirurgias plásticas e implantes de cabelo. Usando documentos falsos, incluindo um passaporte, Cabeça Branca se apresentava como pecuarista e usava dois nomes: Luiz Henrique Guimarães, nascido em Varginha, Minas Gerais, em 17 de novembro de 1962; e Vitor Luis de Moraes, nascido no dia 7 de janeiro de 1962, em Tocos de Moji, também em Minas.
Durante a ação, a Polícia Federal também prendeu Wilson Roncarati, apontado como o braço direito de Cabeça Branca. Roncarati foi detido num apartamento em um prédio na Rua Professor Francisco Moratto, no bairro do Butantã, em São Paulo. A PF não descarta outras medidas. Por ser considerado um fantasma, a operação foi batizada de Spectrum. (AE)