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Por Redação O Sul | 3 de setembro de 2017
A punição a quem comete abuso sexual dentro do transporte público divide juízes em São Paulo. Segundo levantamento feito pelo jornal O Globo em sentenças de segunda instância que analisam esse tipo de crime, quase metade dos magistrados entende que o acusado cometeu crime de estupro com violência, que prevê pena de prisão. Por outro lado, uma turma de juízes considera que a pessoa constrangeu a vítima e, por isso, não precisa ir para a cadeia. Nesse caso, apenas enquadrado na lei de contravenções penais, obrigando-a a pagamento de multas ou prestação de serviços comunitários para escapar da prisão.
Foi esse o entendimento do juiz José Eugênio do Amaral Souza Neto, que, na quarta-feira, soltou Diego Ferreira de Novais, de 27 anos, preso em flagrante no dia anterior por ejacular em uma mulher dentro de um ônibus na Avenida Paulista, região central da capital paulista.
A reportagem analisou 13 decisões de segunda instância sobre casos semelhantes ao ocorrido na Avenida Paulista. O levantamento mostra que os juízes se dividem quando precisam enquadrar o crime no Código Penal.
Em seis dos processos analisados, os magistrados entenderam que houve constrangimento com atentado ao pudor, uma contravenção, que prevê punições mais leves, como serviço comunitário e multa. Em outras sete sentenças, os juízes interpretaram que os acusados cometeram uma violência, o crime de estupro, que prevê penas mais duras. Em 2009, a lei do estupro foi alterada e passou a abarcar “atos libidinosos”, com ou sem “conjunção carnal”, praticados contra mulheres ou homens.
A polêmica em torno de casos de abuso dentro do transporte público levou o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Paulo Dimas de Bellis Mascaretti, a ir a público ontem para defender mudanças na lei para que se puna “com mais rigor atos dessa natureza”.
Segundo Mascaretti, os juízes ficam à mercê de leis que “beneficiam o autor do abuso”. Os princípios jurídicos muitas vezes são “conflitantes”, nas palavras do magistrado, mas cabe a quem está julgando conciliá-los.
Segundo a advogada Isabela Guimarães Del Monde, cofundadora da Rede Feminista de Juristas, não é equivocada a interpretação de alguns juízes de que o caso do homem que ejaculou em uma passageira dentro do ônibus é uma contravenção, e não estupro.
“No Direito Penal, violência e constrangimento têm definições muito claras. Isso não diz respeito ao constrangimento da vítima (prevista na lei de contravenções), ela obviamente foi violentada. Mas o juiz diz que ela não foi restrita, segurada, o cabelo não foi puxado para que o cara conseguisse ejacular nela, o que seria a violência (prevista no crime de estupro)”, afirma. Isabela defende que os acusados em crimes desse tipo sejam condenados a participar de cursos sobre “violência, masculinidade e machismo”. (O Globo)