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Por Redação O Sul | 6 de setembro de 2019
O presidente Jair Bolsonaro vetou 36 pontos em 19 artigos do projeto de lei sobre abuso de autoridade, beneficiando principalmente a categoria policial. O texto aprovado em agosto no Congresso especifica diversas condutas que devem ser consideradas abuso de autoridade e prevê punições.
Associações de juízes, do Ministério Público e de policiais vinham pressionando o presidente a vetar determinados pontos por entender que limitavam a atividade de combate ao crime e à corrupção.
Na decisão de quinta-feira (05), publicada em edição extra do Diário Oficial, Bolsonaro vetou dispositivos como parágrafos e incisos do texto inicial, que continha 108 pontos distribuídos em 45 artigos.
Um dia antes, o presidente disse em rede social que acatou integralmente as sugestões feitas pelos ministros Sérgio Moro (Justiça e Segurança), André Mendonça (Advocacia-Geral da União), Wagner Rosário (Controladoria-Geral da União) e Jorge Oliveira (Secretaria-Geral). Na visão de três especialistas em direito penal, a maior parte dos pontos vetados se refere à atividade policial.
Há três casos emblemáticos: o artigo que punia a autoridade que usasse algemas em quem não resistisse à prisão ou ameaçasse fugir, o que punia quem fotografasse ou permitisse que o preso fosse fotografado sem o seu consentimento e o que previa como punição a proibição de exercer, por um a três anos, funções policiais ou militares no município que tiver sido praticado o crime de abuso.
Outro ponto removido, desta vez direcionado aos juízes, previa sanção à autoridade que, dentro de prazo razoável, não concedesse habeas corpus ou substituísse a prisão preventiva por outra medida cautelar quando a lei permitisse.
Já os membros do Ministério Público criticavam principalmente o artigo que punia quem iniciasse investigação sem justa causa ou contra quem se soubesse inocente. Um outro inciso também removido definia como crime o constrangimento do preso pela autoridade, mediante violência ou grave ameaça, a produzir prova contra si mesmo ou contra outra pessoa.
“A propositura legislativa gera insegurança jurídica, pois o princípio da não produção de prova contra si mesmo não é absoluto como nos casos em que se demanda apenas uma cooperação meramente passiva do investigado”, justificou o governo.
Advogados, contudo, ressaltam que o texto falava em “violência ou grave ameaça”, o que por si já exclui as possibilidades de cooperação passiva. Para além da insegurança jurídica, o governo afirma que os dispositivos vetados feriam o princípio da isonomia e prejudicavam o trabalho das forças de segurança.
De acordo com o professor Davi Tangerino, a justificativa não se sustenta. “Ferir a isonomia, por exemplo, seria dizer que uma coisa vale para alguns e não vale para outros. Não vejo essa assimetria”, diz. “Há comprometimento do governo com as forças policiais, e o presidente não quis desagradar ou contrariar essa base.”
Ele ressalta que o projeto traz duas garantias importantes que evitam insegurança para a atividade policial e jurídica. Segundo o texto, a interpretação da lei não pode ser criminalizada e só pode haver punição quando ficar provado que a autoridade teve intenção de prejudicar alguém ou satisfazer um capricho.
Tangerino também critica os vetos aos pontos referentes aos advogados, como o que tornava crime desrespeitar a inviolabilidade de escritórios e das suas comunicações, desde que relativas à atividade profissional. Para o governo, o dispositivo “gera insegurança jurídica, pois criminaliza condutas reputadas legítimas pelo ordenamento jurídico”.