Na última Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, Donald Trump surpreendeu o mundo ao afirmar que tinha se encontrado com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e que, naquele breve momento, havia “pintado um clima”. A fala do chefe do Executivo norte-americano foi o começo de uma aproximação pela qual o governo brasileiro vem trabalhando há meses e culminou em uma reunião presencial na Malásia para tratar de tarifas comerciais. É justamente em matéria de clima, porém, que os dois políticos permanecem tão — ou mais — antagônicos quanto antes: fontes oficiais confirmam que os Estados Unidos não enviarão representantes à Cúpula de Líderes, que acontece nas próximas quinta e sexta-feira em Belém, antecedendo a COP30.
Não deve ser muito diferente na própria conferência climática, realizada entre 10 e 21 de novembro na capital do Pará. As mesmas fontes informam que é esperada uma delegação de baixo nível dos EUA, provavelmente integrada apenas por diplomatas que já servem na embaixada americana em Brasília.
Trump decidiu retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris e tem histórico de posicionamentos negacionistas na seara climática — não surpreende, portanto, que desprestigie a conferência em Belém. Contudo, a ausência do segundo maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, atrás somente da China, gera um receio de que as discussões fiquem esvaziadas.
Em contrapartida, a notícia não chega a ser mal recebida de todo entre ambientalistas e entidades da sociedade civil. O medo, neste caso, era que o governo norte-americano marcasse presença com o objetivo de gerar pressão e prejudicar o engajamento ambiental.
Os Estados Unidos, formalmente, ainda fazem parte do Acordo de Paris, uma vez que, pelas regras atuais, a retirada de um membro precisa ser comunicada com 12 meses de antecedência. Desse modo, representantes do país podem acessar a conferência normalmente, até porque ele segue como membro da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC), mesmo abandonando o tratado.
Nas últimas semanas, chegaram a circular rumores sobre uma eventual participação do governo Trump na COP30. Uma das possibilidades mencionadas era a presença do secretário de Estado, Marco Rubio, uma das figuras mais ideológicas no entorno mais próximo do republicano. No entanto, apesar da aproximação entre os dois governos selada no encontro bilateral de domingo passado na Malásia, a posição da Casa Branca não mudou.
Cientista sênior de clima da ONG norte-americana União dos Cientistas Conscientes, fundada no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em 1969, Astrid Caldas frisa que a decisão de não participar da Cúpula dos Líderes não surpreende e só reafirma a agenda negacionista de Trump, a despeito dos acenos recentes ao Brasil. Caldas observa, entretanto, que a ausência do governo americano não reflete a de considerável parte da sociedade do país, que participará ativamente da COP30 por meio de congressistas, empresários e as próprias ONGs.
Votação sobre fundo
O desalinho sobre a conferência não é a única dissonância entre os governos brasileiro e norte-americano na pauta climática. Em recente votação no Banco Mundial que teve como resultado a aprovação do papel do organismo como gerenciador do Mecanismo de Financiamento Transitório para Florestas, o TFFF, o enviado do diretor americano — que sequer participou da votação — foi o único dos 25 membros da cúpula que se posicionou de modo contrário.
A decisão de que o Banco Mundial seja o administrador fiduciário do TFFF, uma das principais apostas da gestão petista e da presidência brasileira da COP30 para a conferência, contou com 24 votos positivos. Alguns membros, como o diretor holandês, fizeram discursos elogiosos ao projeto e sobretudo ao Brasil, lembrando até figuras históricas da luta pela preservação da Amazônia como Chico Mendes, assassinado em 1988.
Tanto nos organismos internacionais como em foros multilaterais, a Casa Branca defende o que chama de “back to bases” (de volta às bases). Isso significa retomar uma agenda global na qual temas como o combate às mudanças climáticas, políticas de gênero, inclusão e direitos das mulheres estão totalmente descartados. Foi nesse contexto que a COP30 saiu de vez do radar.
Enquanto isso, organizações ambientais enfrentam uma espécie de tensão de mão dupla. Por um lado, admitem que a ausência dos EUA nas negociações afeta muito a força do multilateralismo, essencial para avançar a agenda de mitigação. Por outro, temiam que a ala mais ideológica da gestão Trump quisesse usar a conferência do clima como plataforma para levantar bandeiras. Nessa hipótese, a presença de um representante americano em Belém serviria mais para gerar alvoroço ou sabotar a reunião do que para ajudar. Com informações do portal Globo.
