Terça-feira, 11 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 18 de setembro de 2019
Lançados aos holofotes pelo ritmo acelerado de liberações pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), os agrotóxicos, que já somam 325 novas autorizações desde janeiro, ainda despertam desconfiança na população e divisões entre especialistas. O volume foi impulsionado por fórmulas genéricas, favorecidas pela quebra de patentes, mas reações por parte da sociedade levaram o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) a defender a utilização dos produtos nas lavouras brasileiras. Agora, o governo planeja assinar um decreto visando o treinamento do manejo dos produtos, de olho em pequenos produtores, uma das principais vítimas de intoxicação. As informações são do jornal O Globo.
A proposta foi anunciada no fim de julho pelo Ministério da Agricultura e o texto está sendo construído em conjunto com o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama), responsável pela dimensão de impacto ambiental desses produtos, e com a Anvisa, que avalia aspectos de risco para a saúde humana, da aplicação nas lavouras ao consumo dos alimentos. Segundo José Guilherme Leal, secretário de defesa agropecuária da pasta, as pastas de Saúde, Meio Ambiente e Agricultura ainda estão discutindo os termos do decreto, e o texto final deve sair até o final deste ano.
O foco do novo decreto está em pequenos produtores de frutas e hortaliças. A pasta considera que, entre os grandes fazendeiros, já há conhecimento e tecnologia para garantir aplicações seguras nas lavouras. Em geral, grandes propriedades rurais contam com maquinário semiautomatizado ou totalmente automatizado para aplicar agrotóxicos – e quando há necessidade de mão de obra no momento da pulverização, ela se dá dentro de cabines acopladas aos aplicadores, que por sua vez oferecem proteção adicional ao trabalhador.
Para treinar o maior número possível de produtores/trabalhadores, o governo promete criar um sistema de cadastro de alcance nacional, à semelhança do que se viu, por exemplo, com o Cadastro Ambiental Rural (CAR). O decreto vai prever que, uma vez cadastrado, o agricultor terá de realizar um curso de aplicação de agrotóxicos, majoritariamente presencial.
O cronograma e os módulos do curso ainda não estão definidos, mas há três pontos principais: segurança para a saúde, para o meio ambiente e aplicação eficiente do ponto de vista agronômico. Na esfera da saúde, por exemplo, será obrigatório falar sobre o chamado “período de carência”, janela mínima definida pela Anvisa entre o momento da aplicação de um agrotóxico, a colheita e o consumo. Falta definir, no entanto, o custo e a duração dos treinamentos e da implementação do cadastro. Em estados que não contam com sistemas de informação capazes de abrigar um novo cadastro, o governo federal ofertará um novo.
O plano é desafiador: o Brasil tem mais de 5 milhões de propriedades rurais, em sua maioria pequenas ou médias. O treinamento será executado por entidades estaduais de extensão rural, que hoje contam com pouca capacidade de operação por falta de recursos e pessoal, universidades e institutos federais de educação técnico, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) e cooperativas agrícolas.
Há, ainda, a previsão para que as fabricantes de agrotóxicos ampliem seus programas atuais, mas não está definido se isso será obrigatório. Atualmente, a indústria de defensivos, bem como órgãos estaduais e municipais de agricultura e meio ambiente, não têm qualquer obrigação legal de treinar agricultores na aplicação de agrotóxicos e, por isso, quando há treinamento – e se há – seu conteúdo varia de lugar para lugar. As grandes fabricantes têm iniciativas próprias de orientação acerca do uso dos próprios produtos, mas não há regra que determine como e com que frequência isso deve ser realizado.
Brasil é o maior consumidor do mundo
O Brasil é, atualmente, o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Segundo a Food and Agriculture Organization (FAO), braço da ONU voltado para a segurança alimentar e agricultura, o país dedicou US$ 10 bilhões aos produtos no último ano. Por outro lado, como costuma ponderar o setor, as terras produtivas brasileiras são as mais extensas do planeta, e o clima tropical favorece que os produtores desfrutem de duas ou até três safras por ano, o que exigiria um consumo maior do que o de outros países.
Segundo o último levantamento da FAO, que leva em conta dados de 2016, a proporção do uso de agrotóxicos no Brasil em relação às terras produtivas é de 4,31 quilos por hectare (kg/ha), uma média bem menor do que muitos países europeus e bem abaixo de outros grandes produtores, como a China.