Nove em cada dez mulheres relatam já ter enfrentado algum tipo de violência durante deslocamentos noturnos para atividades de lazer, segundo pesquisa dos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva, com apoio da Uber. Os episódios citados incluem assédio, importunação sexual, sequestro e estupro.
A violência mais comum é a de olhares insistentes e cantadas inconvenientes, mencionada por 72% das entrevistadas. O crime de importunação sexual aparece em seguida, vivido por 35% das mulheres, enquanto 34% relatam assalto, furto ou sequestro relâmpago. Entre mulheres negras, 21% afirmam ter sofrido racismo durante deslocamentos à noite.
Para 10% das entrevistadas, saídas noturnas para bares, restaurantes, festas, shows, teatros e outros eventos resultaram em estupro — percentual que dobra entre mulheres LGBTQIAPN+.
O medo é constante: apenas 21% das mulheres dizem não sentir receio ao sair à noite para lazer. Outras 63% relatam sentir “um pouco de medo”, e 16% afirmam sentir “muito medo”. Entre mulheres pretas, esse índice chega a 20%.
O retorno para casa é percebido como a etapa mais insegura do trajeto por 35% das mulheres. Entre entrevistadas de 18 a 34 anos, o percentual sobe para 42%. Como consequência, a maior parte evita circular sozinha: 53% preferem estar acompanhadas por parceiros, 39% por familiares e 35% por amigos. Apenas 6% costumam sair desacompanhadas.
Para reduzir riscos, 99% das entrevistadas adotam algum tipo de estratégia que restringe sua liberdade. Entre elas estão evitar determinadas roupas e acessórios (78%), escolher caminhos mais longos quando considerados mais seguros (73%) e até deixar de sair à noite (66% das mulheres; entre mulheres pretas, 63%).
“A violência sexual não é um episódio isolado, mas uma barreira concreta ao direito ao lazer e ao pleno uso da cidade, afetando diretamente como as mulheres vivem, circulam e organizam suas rotinas”, afirma Maíra Saruê, diretora de pesquisa do Instituto Locomotiva. Segundo ela, a limitação da autonomia feminina é reflexo de desigualdades estruturais, como menor remuneração e sobrecarga de tarefas de cuidado, fatores que já restringem o tempo disponível para lazer.
Maíra ressalta que a ausência das mulheres dos espaços públicos retroalimenta o problema. “Quando uma mulher deixa de frequentar determinados ambientes por medo, isso impacta não só sua autonomia e bem-estar, mas também reduz a presença de outras mulheres nesses locais”, afirma.
As entrevistadas relacionam a insegurança noturna a falhas estruturais da cidade, como falta de iluminação adequada, ruas pouco movimentadas e ausência de policiamento.
A pesquisa “Mulheres e mobilidade noturna: percepções sobre (in)segurança nos momentos de lazer” ouviu 1.200 mulheres de 18 a 59 anos, todas com hábito de sair à noite para lazer ao menos duas vezes por mês.
(Com informações do Valor)
