Sexta-feira, 26 de abril de 2024
Por Redação O Sul | 10 de setembro de 2017
Aos poucos, elas se preparam para retomar o espaço. Desta vez, o objetivo é chegar para ficar. Com apoio da Comissão de Arbitragem da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), as mulheres estão trabalhando para voltar a apitar jogos da elite do futebol brasileiro. O objetivo é alcançar a Série A do Campeonato Nacional em 2019, ou no máximo em 2020.
Para isso, o projeto de capacitação das meninas ganhou novo impulso nos últimos anos. Elas são submetidas, periodicamente, a treinamento técnico e físico e também recebem apoio psicológico, para que se fortaleçam mentalmente. O quadro feminino na CBF ainda é pequeno – 14 árbitras e também há 49 assistentes -, mas a perspectiva é de crescimento.
Há treinos específicos para as mulheres, mas na maioria das vezes os cursos são mistos. As exigências, inclusive em relação à condição física, são iguais para homens e mulheres. A intenção é aprofundar cada vez mais o treinamento delas.
Além de colocar os ensinamentos em prática: já há mulheres trabalhando como árbitras centrais em jogos do Brasileiro Sub-20 e em divisões inferiores, como as séries C e D. Na Série A, a última mulher a apitar uma partida foi Sílvia Regina Oliveira: Paysandu 2 x 1 Fortaleza, em 16 de outubro de 2005, ou seja, há quase 12 anos.
Em alguns Estaduais, elas já exercem a função de árbitra central. Em Pernambuco, por exemplo, Déborah Cecília Correia apitou nove jogos este ano, entre eles dois clássicos (Sport x Santa Cruz e Náutico x Santa Cruz) e foi bastante elogiada.
No entanto, se a figura da assistente feminina se tornou corriqueira no futebol brasileiro e já é aceita com naturalidade, ter uma mulher no apito ainda é situação que enfrenta resistência, preconceito. Dentro de campo o futebol ainda é visto como um ambiente predominantemente masculino. Por isso, o trabalho de reinserção é feito com calma, gradativamente.
“Estamos começando a abrir oportunidades para que elas possam atuar em competições masculinas’’, diz o coronel Marcos Marinho, presidente da Comissão de Arbitragem da CBF. “O preconceito está caindo. As assistentes não sofrem mais. Mas, com a mulher no centro [apitando], ainda existe alguma restrição, certo receio. Precisamos ter muito cuidado, ir inserindo aos poucos’’, diz Ana Paula Oliveira, instrutora da Escola Nacional de Arbitragem.
As barreiras ainda existentes aumentam a importância de se fazer um trabalho de fortalecimento psicológico nas candidatas a árbitras centrais. “O homem já está acostumado com o ambiente masculino. A mulher não, precisa se familiarizar. Ela vai viver em um ambiente hostil e precisa saber como lidar com ele. Por isso temos esse suporte psicológico para as meninas.’’
A tutora das meninas diz que o trabalho com as mulheres é baseado em quatro pilares: físico, técnico, mental e social. “A mulher precisa saber lidar com a pressão que o homem vai colocar sobre ela, saber se impor, tomar decisões. Não basta conhecer as regras e ter bom preparo físico, tem de saber como lidar com todo esse contexto.’’
Evolução
Uma barreira que atrapalhou a arbitragem feminina no passado praticamente inexiste hoje, garantem Ana Paula e Marcos Marinho. Fisicamente, as mulheres já se mostram capazes de acompanhar o ritmo de um jogo masculino. “Hoje, elas conseguem atingir o índice do teste masculino. Já estão aprovadas na parte teórica, no mesmo nível. Por que, então, não pensar na possibilidade [de voltarem a apitar na Série A]”?, diz a tutora. “Quem sabe daqui a um, dois anos.’’
Marinho também atesta o progresso. “A gente passou a exigir o [os parâmetros do] teste masculino, e não é algo tão fácil para elas, mas estão tendo um índice maior de aprovação’’, assegura. “A Edina [Alves Batista], que é Fifa, passou no teste masculino. Por isso está apitando em competições masculinas.’’
Este ano, Edina já apitou na Série D e uma partida do Brasileiro Sub-20 (Coritiba 4 x 1 Grêmio), este no mês passado.
Ele diz ter constatado grande evolução nas mulheres em aspectos como velocidade, movimentação, leitura de jogo, desenvolvimento de técnica para se antecipar nas jogadas. “O trabalho é voltado para que elas desenvolvam isso. Técnicas de posicionamento, deslocamento. Tecnicamente, não devem nada a ninguém. O que faltava era essa presença maior nas jogadas.’’
Colocá-las em jogos da Série D, onde na teoria o ambiente poderia ser mais hostil do que na Série A, faz parte dessa preparação gradativa. “Se menina for mal, a repercussão numa Série D pode ser danosa. Mas na Série A ganha o mundo. Até um erro menor tem grande proporção. Isso pode comprometer a carreira se a menina não estiver pronta’’, diz Ana Paula. (AE)