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A decisão da Segunda Turma do Supremo de retirar do juiz Sérgio Moro trechos de delações contra Lula poderá ser útil para Michel Temer

Ao reverter uma decisão unânime tomada há seis meses para aprovar, por 3 votos a 2, a retirada de trechos das delações premiadas de executivos da empreiteira Odebrecht das mãos do juiz Sérgio Moro para a mesa de um juiz federal a ser sorteado em São Paulo, a Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) não cedeu apenas aos interesses do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Há um beneficiário oculto: o presidente Michel Temer, segundo maior interessado na medida.

No caso do líder petista, os advogados tentam livrá-lo dos rigores de Moro, sob o argumento de que os processos envolvendo Lula não possuem conexão com a corrupção na Petrobras. Por decisão do Supremo, o juiz da Lava-Jato tem competência para julgar apenas os desvios relacionados à estatal.

No escândalo da JBS/Friboi, a defesa de Temer se apoia no mesmo argumento para sustentar que o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF, não seria o juiz natural das denúncias feitas contra o presidente da República. O precedente aberto pela Segunda Turma abre, então, uma brecha para a ressurreição desse debate.

Temer questiona a atuação de Fachin desde maio do ano passado, quando a gravação de uma conversa suspeita entre o presidente e um dos donos da JBS/Friboi no Palácio do Jaburu ganhou as manchetes. O emedebista se queixa de que o ministro não teria legitimidade para atuar no caso, pois a empresa dos irmãos Joesley e Wesley Batista não era investigada não no escândalo da Petrobras, mas em outras cinco operações: Sépsis, Greenfield, Cui Bono, Carne Fraca e Bullish.

Ao ser procurado no ano passado por uma escrivã da PF (Polícia Federal) interessada em agendar o depoimento de Temer, o seu advogado Antonio Cláudio Mariz atravessou uma petição na mesa de Fachin. O documento incluía três pedidos. Primeiro, que a oitiva de Temer fosse suspensa até a conclusão da perícia na gravação da conversa. Fachin indeferiu.

A segunda solicitação: que Fachin abdicasse da relatoria, devolvendo o processo à presidência do Supremo, para sorteio de um novo relator. Alegou-se que a colaboração judicial da JBS não tinha nada a ver com a Lava-Jato. Ao ignorar também esse pedido, Fachin deu crédito à versão da Procuradoria segundo a qual Temer endossou (“Tem que manter isso, viu?”) uma suposta mesada que o delator Joesley insinuou que pagava pelo silêncio do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha. Um indício de tentativa de obstruir a Lava Jato.

No terceiro pedido, a defesa de Temer pleiteou o desmembramento do processo, para que o presidente passasse a ser investigado sozinho, sem vinculações com o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, o “deputado da mala”, e com o doleiro Lúcio Funaro, um operador financeiro de Cunha. De novo, o magistrado indeferiu.

Alvejado por duas “flechadas” do então procurador-geral da República Rodrigo Janot, Temer sacrificou a reforma da Previdência para arrancar da Câmara o “congelamento” das denúncias, por maioria no plenário. Ambas serão retiradas do freezer em janeiro do ano que vem, quando o denunciado deve deixar a Presidência.

Nessa hora, sem as prerrogativas do cargo, Temer será enviado para a primeira instância. E não será uma surpresa se seus advogados protocolarem um recurso reivindicando a reabertura da discussão sobre a competência de Fachin e requerendo a anulação dos atos praticados pelo relator.

Lula

No caso de Lula, a despeito da comemoração dos seus advogados, o tumulto processual provocado pela decisão da Segunda Turma não deve produzir prejuízos incontornáveis. Os processos permanecem nas mãos de Sergio Moro. E não dependem das delações da Odebrecht para ficar em pé.

Colecionaram-se outras provas, esclareceram os procuradores da força-tarefa de Curitiba (PR) e o próprio Moro. A ação penal sobre a reforma do sítio de Atibaia (SP) está na fase de oitiva de testemunhas. A outra, sobre a compra de uma sede para o Instituto Lula, já entrou na etapa das alegações finais. Ambas pendem para a condenação.

Já a situação de Temer é diferente. Como a Câmara proibiu o Supremo de se debruçar sobre as denúncias, não houve a abertura de ações penais. Os processos encontram-se, por assim dizer, em estágio embrionário. Uma fase ideal para que os advogados apontem incidentes processuais para melar o jogo.

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