O governo francês anunciou nesta quinta-feira (18) a imposição de uma nova quarentena em diversas partes do seu território, incluindo Paris, para tentar frear a terceira onda da covid-19 na Europa. Na quarta (17), o país registrou o maior número diário de casos desde novembro, com mais de 38 mil pacientes diagnosticados.
As novas medidas, que vão valer a partir deste sábado (20), afetarão os Altos da França, no Norte do país, e a Île-de-France, onde fica a capital. Dezesseis departamentos serão afetados e ficarão em lockdown por ao menos quatro semanas.
“A progressão da epidemia está se acelerando fortemente. Novas medidas, portanto, devem ser tomadas sem demora”, disse o primeiro-ministro Jean Castex, no anúncio das medidas. “Ainda temos dias difíceis pela frente, mas também temos uma perspectiva de mudança, o que nos diz que não só esses esforços são essenciais, mas que eles não serão em vão. Apenas negócios essenciais serão autorizados a abrir, incluindo comércios de livros e de música.”
Escolas e faculdades funcionarão normalmente, exceto as de ensino médio, que terão apenas 50% das aulas presencialmente. Atividades extracurriculares para menores serão autorizadas.
Serão permitidos deslocamentos num raio de 10 km, sem limites de tempo. Viagens interregionais estão vetadas, exceto por “motivos profissionais e convincentes”.
O Palácio do Eliseu vinha fazendo o possível para evitar uma nova quarentena total e seus impactos econômicos, optando por medidas como toque de recolher nacional e restrições regionais. O número de casos e a ocupação de leitos hospitalares, contudo, não para de crescer: nesta quinta, segundo o Ministério da Saúde, a quantidade de pacientes na UTI chegou ao seu maior número em 2021, atingindo 4.246.
O governo francês põe a responsabilidade das novas infecções na variante britânica do vírus, mais infecciosa. Segundo autoridades, três a cada quatro novas infecções são da variante britânica.
“Estamos em uma terceira onda em grande parte devido ao surgimento da famosa variante britânica. A situação é claramente grave, e será muito difícil até meados de abril”, disse o presidente Emmanuel Macron na noite de quarta, em uma videoconferência com prefeitos.
Em Paris, onde pacientes são realocados para o interior do país para evitar a sobrecarga dos hospitais, a incidência da doença no último dia 14 era de 425 novos casos por 100 mil habitantes — bem acima do “limite de alerta” de 250 casos por 100 mil. A taxa de ocupação hospitalar na capital é de 57 por 100 mil, 20 a mais que a média nacional.
A pressão por novas medidas de contenção aumentou após a França suspender a aplicação de doses da AstraZeneca, na última terça (16), após relatos pontuais de complicações como edemas e embolias pulmonares. A Organização Mundial de Saúde afirmou que não havia motivos para paralisar a vacinação, mas ao menos 13 nações europeias optaram por esperar uma análise da Agência Europeia de Medicamentos (EMA).
A agência anunciou nesta quinta que a vacina é “segura e eficaz” e que, mesmo sem poder descartar neste momento uma correlação com as complicações, os benefícios são superiores aos riscos.
Segundo dados da AstraZeneca, em cerca de 17 milhões de doses aplicadas, foram constatados 15 casos de trombose e 22 de embolia pulmonar. A incidência, disse a empresa, é inferior à esperada para a população geral.
Vacinação atrasada
Como Macron já dissera, com o aval do órgão, a França voltará a aplicar o inoculante. O impacto dos questionamentos sobre sua segurança, no entanto, podem ser significativos para a opinião pública no país, que tem um dos sentimentos antivacina mais fortes do planeta.
Em um levantamento feito pela fundação britânica Wellcome em 140 nações, a França teve o menor nível de confiança nas vacinas: um em cada três franceses desconfia de sua segurança. Nesta sexta (19), segundo o canal BFM TV, Castex deverá tomar uma dose da AstraZeneca em uma tentativa de assegurar a população.
O ceticismo e a curta paralisação devem atrasar ainda mais a já lenta campanha de vacinação francesa. Segundo os dados do Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças, a França já aplicou a primeira dose em 9,7% da sua população. Na União Europeia, cujos integrantes são criticados por suas campanhas pouco ágeis, a taxa é de 9,8%. O Reino Unido, para fins comparativos, já vacinou 38% de seus habitantes.
A lentidão é um empecilho para que o país controle a terceira onda da covid-19.