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A Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina abre procedimento para apurar conduta de advogado em audiência sobre estupro

Advogado de réu absolvido de acusação de estupro questionou fotos “sensuais” da jovem Mariana Ferrer, que fez a denúncia. (Foto: Reprodução)

A OAB-SC (Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina) abriu um procedimento para investigar a conduta do advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho durante a audiência do caso Mariana Ferrer. A OAB-SC oficiou ao Poder Judiciário para acesso integral ao processo judicial, bem como ao advogado para prestar esclarecimentos a respeito de sua conduta profissional. Esse procedimento tramita internamente e tem caráter sigiloso por força legal.

A medida foi tomada após a divulgação do vídeo de audiência judicial em que a influenciadora digital Mariana Ferrer, de 23 anos, é humilhada pelo defensor do homem que ela acusa de estuprá-la – o empresário André Camargo Aranha. Nas imagens da sessão, divulgadas pelo site The Intercept Brasil, o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho diz a ela: “Jamais teria uma filha do teu nível e também peço a Deus que meu filho não encontre uma mulher que nem você”.

Durante a audiência, o advogado do réu questionou fotos “sensuais” de Mariana e afirmou que ela usava o caso para se promover no Instagram. Ele mostrou uma foto em que a influencer está com o dedo na boca (“chupando o dedinho”, em suas palavras) e diz que, no site de um fotógrafo, há imagens dela em “posições ginecológicas”. O criminalista então apresenta uma foto em que Mariana está sentada, com as pernas entreabertas, vestindo blusa e calcinha pretas. “Não tem nada de mais essa foto, né?”, ironiza Rosa Filho. “Não tem nada de mais mesmo, estou de roupa. A mulher livre não é freira, não, doutor”, explica a influencer. O empresário André de Camargo Aranha foi absolvido da acusação de estupro de vulnerável.

Em razão da repercussão nacional gerada pelas cenas divulgadas da audiência judicial sobre o caso Mariana Ferrer, o presidente da OAB-SC, Rafael Horn, também enviou ofício ao presidente do CNJ (Conselho Nacional da Justiça) e do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, requerendo a edição de uma normativa que determine a gravação integral de todos os atos processuais praticados no âmbito do Poder Judiciário. A medida amplia para a esfera nacional o pleito pela gravação em áudio e vídeo das audiências realizadas pelos Tribunais com jurisdição em Santa Catarina, que a OAB/SC sustenta desde o início de 2019.

O argumento levado ao CNJ é o mesmo apresentado à Justiça Trabalhista em Santa Catarina: garantia de proteção às prerrogativas e aos direitos de todas as partes envolvidas no processo, para o caso de eventuais incidentes ocorridos durante as audiências. “Entendemos ser este o caminho para o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, que deve fazer uso da tecnologia nos limites que não venham em prejuízo do devido processo legal, da ampla defesa e do respeito aos direitos humanos”, considera Horn.

Já o Procurador-Geral de Justiça do MP-SC (Ministério Público de Santa Catarina), Fernando da Silva Comin, enviou ao presidente Jair Messias Bolsonaro, ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sugestões de alteração do CPP (Código de Processo Penal) e do Código Penal, com “o objetivo de aumentar a proteção à dignidade da vítima de crimes sexuais e proíbem perguntas e referências à experiência sexual anterior da vítima, seu modo de ser, falar, vestir ou de se relacionar com outras pessoas”.

As principais justificativas apontadas para a mudança processual dos crimes contra a dignidade sexual são evitar a revitimização e garantir que o processo judicial não possibilite ou seja utilizado para expor a vida privada da vítima ou desqualificá-la moralmente como uma estratégia da defesa do acusado.

No ofício, Comin destaca iniciativas como essa já adotadas em países como Estados Unidos, Austrália, Canadá e Nova Zelândia, chamadas de “Rape Shield Laws”, que apresentam “dispositivos que vedam às partes realizar perguntas sobre a vida sexual pretérita de vítimas de crimes contra a dignidade sexual; proíbem o uso de evidências sobre o histórico sexual para definir a vítima como um tipo que é mais ou menos suscetível a consentir com a prática de atividades sexuais; e vedam o uso do histórico sexual da vítima para definir sua credibilidade”. As informações são da OAB-SC, do MP-SC e da Revista Consultor Jurídico.

 

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