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A premiação do Oscar consagrou um dos mais extravagantes filmes da História

“Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo” recebeu sete das 11 estatuetas a que foi indicado. (Foto: Divulgação)

Em 95 anos de Oscar, saiu consagrado um dos mais extravagantes longas-metragens na história da conservadora premiação da Academia de Hollywood. Sim, “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo” (“TTLMT”) era o favorito. Nas últimas semanas, havia recebido os prêmios das quatro principais associações de profissionais dos EUA – produtores, diretores, atores e roteiristas. Apenas outros quatro filmes obtiveram essa proeza. Todos triunfaram no Oscar.

Mas ainda era preciso ver para acreditar. Com sete prêmios em 10 possíveis (duas das 11 indicações foram para a categoria de atriz coadjuvante), a equipe de “TTLMT” viveu, como se estivesse dentro de uma multitrama similar à do filme, um naco de realidade alternativa num metaverso de Los Angeles.

Os diretores, roteiristas e produtores Daniel Kwan e Daniel Scheinert – ou Os Daniels, a assinatura da dupla – foram chamados carinhosamente de esquisitos (“weirdos”, em inglês) por Jonathan Wang, também produtor de “TTLMT”, em seu discurso na entrega do Oscar de melhor filme.

Esquisitos, talvez, com uma trajetória em vídeos musicais e longas sem repercussão, mas agora vencedores. Foi a terceira dupla da história a receber o Oscar de direção, ao lado de Robert Wise & Jerome Robbins (“Amor estranho amor”) e dos irmãos Coen (“Onde os fracos não têm vez”).

Cada um dos Daniels levou três Oscars (filme, direção e roteiro). Para efeito de (triste) comparação: Alfred Hitchcock só recebeu um, honorário, no fim da carreira; Stanley Kubrick também só ganhou um, e de efeitos visuais (por “2001”). Quem te viu e quem te vê, Hollywood.

A onda de “TTLMT” trouxe outros improváveis vencedores de Oscar. Michelle Yeoh (melhor atriz) foi Miss Malásia e deu início à carreira em filmes de artes marciais. Ke Huyn Quan (ator coadjuvante) fez na infância “Indiana Jones e o templo da perdição” (1984) e “Os Goonies” (1985), e desapareceu do mapa.

Filha dos atores Tony Curtis e Janet Leigh, Jamie Lee Curtis (atriz coadjuvante) começou no cinema pela porta dos fundos, em “Halloween: a noite do terror” (1978), e jamais chegou perto do prestígio dos pais. E o vencedor do Oscar de montagem, Paul Rogers, só havia feito um longa-metragem antes de “TTLMT”.

Para completar a noite, outro sumido de carreira tortuosa, Brendan Fraser (“A múmia”), recebeu o prêmio de melhor ator por “A baleia”. Como se previa desde o anúncio das indicações, a reduzida presença de figuras carimbadas (Steven Spielberg, Cate Blanchett) indicava que a cerimônia teria um cortejo de novidades.

“Este é o sonho americano”, disse Ke Huyn Quan, emocionado, ao receber o Oscar. Ele comemorou intensamente a vitória dos colegas e reencontrou no palco Harrison Ford, que entregou o prêmio de melhor filme. “Os sonhos podem tornar-se realidade”, comemorou Michelle Yeoh.

Quem teve ainda mais razões para celebrar foi a produtora A24, de “TTLMT” e “A baleia”, que já havia recebido o Oscar de melhor filme por “Moonlight” (2016). Desta vez, ela acumulou os seis principais prêmios da noite, da qual participou também com as indicações de “Passagem”, do irlandês “Aftersun”, do belga “Close” e da animação “Marcel the shell with the shoes on”.

Se Os Daniels são a face mais visível de uma renovação do cinema americano pela via da cultura pop e da identificação com os espectadores jovens que cresceram sob impacto do mundo digital e da vida online, a A24 é a presença transformadora que se revela apenas a quem está atento aos bastidores da indústria.

Da escolha esperta de projetos à autonomia concedida aos cineastas, passando por estratégias de divulgação em sintonia com as redes sociais e seus usuários, a produtora vem comendo pelas bordas do mercado. “TTLMT” é a sua maior bilheteria global, com US$ 106 milhões. Mas a cesta de Oscars em 2023 não tem preço, ao colocar a A24 no lugar mais nobre da vitrine.

Outro fatia de prestígio na cerimônia – menor, mas significativa – coube a “Nada de novo no front”, que recebeu quatro prêmios: filme internacional, fotografia, trilha sonora e desenho de produção. Lançada em streaming, essa produção alemã foi lentamente ganhando espectadores e aplausos, na contramão das expectativas, e tornou-se outro personagem da noite dos improváveis.

Ao retirar-se do palco no final da cerimônia, o apresentador Jimmy Kimmel atualizou um painel com o “número de transmissões do Oscar sem incidentes”, em referência à agressão de Will Smith a Chris Rock que dominou a repercussão da premiação de 2022.

De fato, não houve problemas na bem-comportada cerimônia deste ano, mas sobrou uma piada, indiretamente, ao Brasil. Depois que o prêmio de direção foi entregue aos Daniels, Kimmel brincou que o último a ganhar dois Oscar naquela categoria havia sido George Santos – o congressista americano, de origem brasileira, envolvido em escândalo por conta das informações falsas de seu currículo.

Se houvesse Oscar de autenticidade, deveria ir para Lady Gaga. Na contramão dos figurinos que dominaram a noite, ela usou camiseta e calça jeans para cantar “Hold my hand”, indicada por “Top gun: maverick”. Em procedimento raro, a câmera ficou bem perto dela na apresentação, como se procurasse entender como uma estrela pode brilhar mesmo que propositalmente desglamourizada. Não é pouca coisa, sobretudo em Hollywood. As informações são do jornal O Globo.

 

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