Representantes do setor agrícola e exportadores consideram temerário o plano da futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina, de flexibilizar a fiscalização do Estado no processamento de carnes dentro dos frigoríficos. Em entrevista à imprensa, ela afirmou que pretende acabar com a vistoria diária feita por servidores e substituí-la por “práticas de autocontrole” adotadas pelos próprios frigoríficos, com auditorias periódicas do governo.
De acordo com o presidente da AEB (Associação do Comércio Exterior do Brasil), José Augusto de Castro, o Brasil mantém com vários países acordos comerciais que podem ser desfeitos em caso de decisão unilateral a respeito da vigilância sanitária, colocando em risco a sua liderança no segmento.
Castro destaca que, neste mercado, quem diz o que deve ser feito é o comprador. É ele quem faz a exigência, e, no caso de não cumprimento, ele não compra.
O Brasil hoje é líder global de exportação de carne bovina e de frango. As receitas com as vendas externas dos dois produtos giram na casa dos US$ 14 bilhões por ano.
Imagem arranhada
O atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, também criticou a proposta. Segundo ele, a medida não teria efeitos no mercado interno. Para as exportações, no entanto, seria necessário renegociar os certificados fitossanitários com todos os países que compram do Brasil. Além disso, seria preciso mudar leis no Congresso Nacional que regulam essas medidas, assim como alterar decretos presidenciais e instruções normativas.
Ainda de acordo com o titular da pasta, após a fiscalização feita pelo governo brasileiro, os países importadores costumam enviar suas próprias missões para checarem os procedimentos. No caso dos Estados Unidos e da Europa, não é aceito sequer que os ajudantes dos fiscais sejam funcionários das empresas vistoriadas.
Castro, da AEB, destaca ainda que o Brasil não é um exemplo mundial em termos de saúde sanitária. Ao contrário, ficou com a imagem arranhada por causa do escândalo revelado pela operação Carne Fraca, que investigou frigoríficos por irregularidades na documentação sobre o processamento de carnes.
O futuro secretário executivo da pasta, Marcos Montes, disse que a proposta ainda precisa ser discutida com as empresas e com o Ministério de Relações Exteriores. Ele explicou que caberia ao Itamaraty auxiliar nas discussões sobre o novo modelo de fiscalização com os países parceiros.
Montes lembrou ainda que o Estado não eliminaria o trabalho dos fiscais, que continuaria sendo feito antes do abate e, posteriormente, no momento da industrialização e da comercialização dos produtos. O abate em si, observou, é uma atividade interna da empresa e, por isso, não seria necessária a presença constante de fiscais.
Ao ser indagado se a qualidade da carne brasileira não poderá piorar com retirada dos fiscais de dentro das indústrias, ele respondeu: “Ao contrário. As empresas são a parte mais interessada. Nós acreditamos nos empresários. Conversas terão que existir para que haja confiabilidade entre o governo e o setor privado. Isso é importante para o Brasil se assegurar no mercado internacional”.
