Deveria servir de alerta aos congressistas o resultado de pesquisa Datafolha mostrando que três em cada quatro brasileiros (76%) são contra o aumento do número de deputados federais de 513 para 531, aprovado pela Câmara no início do mês passado e em análise no Senado. De acordo com o levantamento, apenas 20% se mostraram favoráveis.
Pela Constituição, cada uma das 27 unidades da Federação tem no mínimo oito e no máximo 70 deputados, dependendo do tamanho da população. Em agosto de 2023, ao julgar ação impetrada pelo governo do Pará, o Supremo Tribunal Federal fixou prazo, até 30 de junho deste ano, para que o Congresso redistribuísse as cadeiras com base na população apurada pelo último Censo — isso não acontecia desde 1993. O que era para ser um rearranjo das bancadas acabou se transformando em oportunidade para aumentá-las. A aritmética criativa dos congressistas resultou no acréscimo de 18 deputados, realidade que destoa de outros países. Os Estados Unidos têm o mesmo número de representantes (435) desde 1929. A Itália reduziu os seus de 630 para 400. A Alemanha, de 736 para 630. E por aí afora.
Se confirmado, o inchaço custará R$ 64,6 milhões anuais, segundo cálculo da própria Diretoria Geral da Câmara. O valor leva em conta apenas custos diretos, como salários dos novos deputados, estruturas de gabinete e outras despesas do mandato. Sem falar nas emendas parlamentares. No ano passado, cada deputado teve direito a R$ 38 milhões apenas em emendas individuais. Uma conta trivial de multiplicação mostra que, mantido esse patamar, os custos chegariam perto de R$ 750 milhões. Em meio à grave crise fiscal do país, aumentar despesas é um contrassenso. Tanto que a Câmara tem cobrado acertadamente do governo medidas para equilibrar suas contas.
O aumento também geraria efeito cascata nas Assembleias Legislativas, uma vez que a Constituição vincula o número de deputados estaduais ao tamanho das bancadas na Câmara. Levantamento feito pelo Globo mostrou que a criação de 30 novas vagas nas Assembleias teria impacto anual de quase R$ 75 milhões nos cofres estaduais — apenas em custos diretos.
Pela proposta aprovada, a partir de 2027, os estados que deveriam perder cadeiras ficariam como estão, enquanto aqueles cuja população passou a ser proporcionalmente maior ganhariam deputados. Seus defensores alegam que a simples redistribuição resultaria em perda de recursos de emendas para alguns estados e em desequilíbrio federativo. É um argumento sem sentido. Os recursos das emendas no Brasil já são exorbitantes e precisam ser cortados — para todos os Estados.
Atualizações periódicas de bancadas são necessárias para equilibrar distorções da demografia. É natural que, ao longo das décadas, determinados estados ganhem população e outros percam. O certo seria recalibrar as bancadas. Por isso o Senado tem obrigação de barrar a irresponsabilidade gestada na Câmara. O Brasil não precisa de mais parlamentares, categoria que integra a elite do funcionalismo. Congressistas deveriam olhar com atenção a pesquisa Datafolha. Insistir em ampliar a Câmara para manter seus interesses paroquiais significa ir na contramão do que pensam os brasileiros. Para quem vive sob constante escrutínio do eleitorado, não é bom desafiar a vontade popular. A resposta poderá vir nas urnas. (Opinião/Jornal O Globo)