Antes reticente, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) abriu conversas com procuradores para fazer delação premiada e contratou advogado para liderar o processo. Se as
negociações avançarem, será o tiro de misericórdia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer, que cambaleou mas não caiu com a delação de Joesley Batista, um dos donos da JBS. O novo advogado que Cunha constituiu exclusivamente para isso é o
criminalista Délio Lins e Silva Júnior, que tem escritório em Brasília.
“Delinho”, como é conhecido o advogado, atuou na delação de Diogo Ferreira, que era chefe de gabinete do ex-senador Delcídio do Amaral.
Paralelamente às sinalizações de Cunha, o doleiro Lúcio Funaro, apontado como operador do ex-deputado, também já iniciou processo de delação. O ex-assessor de Temer Rodrigo Rocha Loures, preso após ser flagrado recebendo uma mala cheia de dinheiro, pode acabar fazendo o mesmo.
Sua mulher está no oitavo mês de gestação e sua família tem pressionado por uma delação. São três depoimentos considerados fundamentais para o desfecho da situação de Temer. Se Cunha demorar, pode acabar ficando para trás dos outros potenciais colaboradores. Há quem ainda aposte em uma delação conjunta de Cunha e Funaro.
A possibilidade de delatar é agora vista sem preconceito por Cunha, que até então se recusava a tratar abertamente do tema, limitando-se a passar recados para o governo. Recentemente o ex-deputado passou a discutir o assunto com advogados e familiares que o visitam em Curitiba, na prisão.
Delação valorizada
Tudo mudou com a delação dos executivos da JBS, seguida da inesperada resistência de Temer, assim como da iniciativa bem-sucedida de sua defesa em colocar em questão o áudio da conversa com Joesley. Na avaliação de analistas políticos, Janot precisaria de fatos novos para fazer vingar, entre parlamentares, uma denúncia contra o presidente – apesar das revelações feitas até agora, a acusação corre o risco de ser barrada na Câmara, o que frustraria os esforços do procurador. Apenas provas ainda mais contundentes deixariam deputados sem argumento para barrar a abertura de ação penal contra Temer. Antes desprezada, a colaboração de Cunha subiu consideravelmente de valor.
O ex-deputado, por sua vez, pode ter na figura de Janot sua última chance de salvação, diante da ameaça iminente de ter que passar as próximas décadas atrás das grades. O mandato do procurador-geral termina em setembro e ainda não se sabe quem será seu sucessor. Alguns aliados do ex-presidente da Câmara defendem que o melhor seria aguardar para negociar uma delação mais “amena” com o substituto de Janot.
O risco, porém, seria enorme, na avaliação de outros interlocutores. Isso porque o novo chefe do Ministério Público pode simplesmente recusar qualquer tipo de negociação com Cunha, preferindo deixá-lo calado na prisão. O próprio método de condução das delações premiadas na Operação Lava-Jato não é visto com consenso pelos candidatos à sucessão de Janot.
Essa janela de oportunidades dos dois lados criou a confluência ideal para a delação de Cunha. O ex-deputado já é visto como alguém que estaria perdendo a arrogância que demonstrou até agora diante do procurador-geral, com quem trocou duros ataques desde o começo das investigações.
