Ícone do site Jornal O Sul

Ao completar 80 dias, caso Marielle ainda tem mais perguntas do que respostas

Manifestação cobrando respostas aos 60 dias do crime. (Foto: Fabio Café/Anistia Internacional)

“Quem matou Marielle e Anderson?”. A pergunta que numa simples pesquisa no Google traz 354.000 menções está espalhada pelas redes sociais e martela a cabeça de investigadores há 80 dias, completos no sábado. São mais perguntas que respostas, e a cobrança aumenta a cada tweet e faz subir a pressão sobre uma polícia que está sob uma intervenção federal com prazo para acabar: dezembro de 2018.

A qualquer hora em que se chega no prédio mais velho da Rua General Ivan Raposo, na Barra da Tijuca, se vê o vai e vem de agentes da Polícia Civil que deixaram outros tantos casos de lado para tentar montar o quebra-cabeça mais intrincado que a DH (Delegacia de Homicídios) do Rio de Janeiro já teve desde sua revitalização, em janeiro de 2010.

Até hoje a DH praticamente não falou nada sobre o caso. Não confirmou nomes de suspeitos que vieram à tona; não confirmou linhas de investigação adotadas; não confirmou sequer se os disparos que fuzilaram a vereadora do PSOL e seu motorista vieram de uma submetralhadora HK MP5. A equipe do delegado Giniton Lages optou pelo silêncio absoluto. “Podem fazer a pressão que quiserem, mas não vou resolver de qualquer jeito. Não tenho pressa. Preciso investigar a fundo para reunir provas e prender os assassinos”, desabafa a amigos mais próximos.

Desde o momento do crime a imprensa tem conversado com pessoas ligadas a suspeitos, entrevistado políticos, amigos e parentes das vítimas e outras dezenas de pessoas que podem ajudar a jogar luz sobre um crime que, até agora, carece de uma resposta essencial: por que mataram Marielle e Anderson? Essa é a questão mais intrigante para todos, de investigadores a amigos. “Já tentamos entender todos os cenários e não encontramos uma resposta plausível para isso. Não encontramos uma motivação razoável para que alguém fizesse tamanha covardia”, diz o deputado estadual Marcelo Freixo.

Foi com base no depoimento de uma testemunha que a Delegacia de Homicídios começou a montar aquela que é sua principal linha de investigação hoje, passados quase três meses. Um policial militar que integrava a milícia de Orlando Oliveira de Araújo, que domina especialmente a região da Curicica, em Jacarepaguá (Zona Oeste do Rio), procurou um amigo que resolveu levar a história adiante. Pouco se sabe, até aqui, sobre o que, efetivamente, o PM/miliciano falou oficialmente.

Ele teria relatado um suposto encontro ocorrido entre seu ex-chefe Orlando e o vereador Marcello Siciliano (PHS), colega de plenário de Marielle, num dos mais badalados restaurantes do Recreio dos Bandeirantes, também na Zona Oeste. O encontro teria ocorrido em junho de 2017 e, nele, Siciliano teria encomendado a morte de Marielle com um tapa na mesa e uma frase em tom firme: “Tem que resolver a piranha do Freixo”. Procurado, um funcionário do restaurante disse que não há arquivamento de imagens de câmeras de tanto tempo atrás.

A testemunha ainda deu números telefônicos que poderiam ter sido usados por integrantes da quadrilha de Orlando que teriam executado a missão. Esses dados estão sendo cruzados pela investigação, mas até agora não se confirmaram. Ele deu ainda quatro nomes de possíveis suspeitos: um PM identificado como Alan, um ex-bombeiro deficiente físico de apelido Claudinho; um ex-PM conhecido como Machado; e outro homem chamado de Leandro Mingau.

No pano de fundo da versão trazida pela chamada “testemunha-chave”, no entanto, estão mistérios que intrigam parte da polícia e da própria política fluminense. E o problema está em como essa testemunha-chave chegou de repente com a história detalhada, até a DH. “Um dia um PM acordou, resolveu perder arma e carteira, porque no fim das contas ele vai ser expulso da corporação, e contar toda a verdade de um caso que nada tinha a ver com ele? É preciso cautela nessa versão. E era o que faríamos. Averiguar cada frase dele. Mas veio o vazamento dos delegados da PF, e aí…”, desabafa um investigador da Delegacia de Homicídios.

O depoimento foi revelado pelo jornal O Globo. A testemunha foi levada até o chefe de Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, por três delegados da Polícia Federal: Felício Laterça, Lorenzo Pompílio da Hora e Helio Khristian Cunha de Almeida. Khristian já investigava o vereador Siciliano em outro inquérito, que apura irregularidades fiscais da casa de shows Barra Music, da qual Siciliano foi sócio, e chegou a interrogá-lo em 16 de novembro do ano passado. O inquérito ainda não foi concluído.

Sair da versão mobile