Na maioria dos países ocidentais, o casamento constituiu um contrato duradouro e não era permitido o rompimento, a não ser em casos de faltas gravíssimas cometidas por um dos cônjuges. Entre elas estavam o abandono do lar, adultério, alcoolismo e violência física. “Depois de tanto ultraje, como podem ficar amigos?”, alguém devia se perguntar.
O número de divórcios aumentou e passou a causar preocupação. Em Viena, na Áustria, entre 1915 e 1925, pulou de 617 para 3.241. Os conservadores se apavoraram e tentaram a todo custo conter essa tendência. Algumas vezes adotaram soluções tragicômicas, como a de 1929, em Cleveland, nos Estados Unidos. É inacreditável, mas pretenderam resolver o problema fazendo do bridge (jogo de cartas) matéria obrigatória nas escolas municipais.
Diziam que o lar americano se encontrava em decadência porque nele quase não se jogava o bridge. E que muitos casamentos se desfizeram porque o casal, em vez de jogar cartas entre si, passou a sair, cada um para o seu lado. Ao ensinar o jogo às crianças, estariam preparando-as para uma vida conjugal sólida.
Separações não eram amigáveis.
Naquela época não havia separações amigáveis. Embora, como acontece hoje, as mulheres fossem responsáveis pela maioria dos pedidos de divórcio, a situação delas era bem difícil. Apesar de só se separarem quando o casamento se tornava insuportável, elas eram discriminadas e representavam uma vergonha para a família.
Sem dúvida, a felicidade no casamento dependia e depende das expectativas que se depositam na vida a dois. Antigamente as opções de atividades fora do convívio familiar eram bastante limitadas, não só para as mulheres que cuidavam da casa e dos filhos, como para os homens, que do trabalho iam direto para o aconchego do lar. Desconhecendo outras possibilidades de vida, não almejavam nada diferente e o grau de insatisfação era muito menor. Havia um conformismo generalizado.
Emancipação feminina mudou expectativas com casamento.
Entretanto, o movimento de emancipação feminina e a liberação sexual dos anos 1960 trouxeram mudanças profundas na expectativa de permanência de uma relação conjugal. Surgiram muitas opções de lazer, de desenvolver interesses, de conhecer outras pessoas e lugares.
Sem falar em uma maior permissividade social para novas experimentações, nunca ousadas anteriormente. Ao contrário da época em que, excetuando os casos de intenso sofrimento, ninguém se separava, hoje a duração dos casamentos é cada vez menor. Isso ocorre porque, quando uma pessoa se vê privada das suas perspectivas, que são de alguma forma possíveis, a frustração é inegável.
E é por isso também que ideias como liberdade sexual, separação por falta de desejo sexual, questionamentos sobre a importância ou não da fidelidade conjugal, provocam reações de indignação. É perturbador perceber que existem maneiras mais prazerosas de viver, mas fora do alcance. Que o casamento está em crise não é novidade. E isso começou a acontecer depois que o cônjuge passou a ser escolhido por amor e não mais por interesses familiares. (Regina Navarro Lins/AD)