Com a publicação da decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o núcleo crucial da tentativa de golpe de Estado, as defesas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos outros sete aliados terão até a próxima segunda-feira (27) para apresentar seus recursos na Corte.
Advogados vão se debruçar sobre o conteúdo da decisão colegiada. O posicionamento dos magistrados terá papel fundamental na definição dos caminhos possíveis para tentar reverter o resultado.
Quando há condenação, a legislação permite a apresentação de dois tipos de recursos — os embargos de declaração e os embargos infringentes. Estes últimos só são aceitos se houver, pelo menos, dois votos pela absolvição, o que não aconteceu no julgamento desse caso.
Os dois pedidos demandam que as defesas analisem detalhadamente os votos apresentados pelos ministros, que vão constar do acórdão — o documento que expressa a decisão colegiada dos magistrados.
É a partir deste material que eles podem colher os argumentos para questionar as conclusões da Turma.
Em regra, são recursos que não mudam o resultado definido pelos ministros.
Mas, a depender das teses construídas pelos advogados, eles podem pedir o chamado efeito modificativo, para tentar mudar, por exemplo, o tamanho das penas, ou reconhecer situações que extinguem a pena — como a prescrição.
Veja a seguir as regras para cada um dos recursos:
Embargos infringentes
O Supremo permite a análise de embargos infringentes quando a decisão não é unânime, ou seja, quando há votos divergentes dos ministros. Este tipo de recurso ficou conhecido no julgamento do Mensalão.
Segundo entendimentos anteriores do tribunal, os embargos infringentes são possíveis “quando caracterizada divergência relevante, a ponto de gerar dúvida razoável sobre o acerto de determinada decisão”.
Quando a Corte elaborou suas regras internas, deixou clara a previsão de embargos infringentes para as determinações do plenário — que conta com a participação de 11 ministros. Estabeleceu que o recurso só pode ser aceito se houver, no mínimo, 4 votos divergentes.
Na época, as ações penais só eram julgadas pela totalidade dos ministros. Não havia deliberação de processos penais nas Turmas, que têm 5 integrantes. Por isso, não há previsão escrita do uso destes instrumentos para combater decisões dos colegiados.
Assim, o Supremo construiu, ao longo do tempo, o entendimento sobre a aplicação dos embargos infringentes nas Turmas: eles podem ser apresentados caso existam dois votos divergentes, pela absolvição dos réus. Isso não ocorreu no caso do núcleo crucial.
Por exemplo: recentemente, o ministro Alexandre de Moraes rejeitou um pedido de embargos infringentes por falta de dois votos pela absolvição.
O caso envolvia a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pichou “Perdeu, mané” na estátua “A Justiça” durante os atos de 8 de janeiro.
A defesa pediu a absolvição com base em divergências parciais dos ministros Luiz Fux e Cristiano Zanin. Fux votou pela condenação em um dos cinco crimes; Zanin também votou pela punição, mas com diferença no tempo da pena.
Como não houve dois votos pela absolvição, Moraes entendeu que os pedidos não poderiam ser admitidos.
A defesa pode apresentar o pedido, mas a análise da admissibilidade cabe ao relator, em decisão individual. Se ele rejeitar o recurso, a defesa pode apresentar um outro pedido para que o tema seja analisado de forma colegiada, na Primeira Turma.
Embargos de declaração
As defesas também podem apresentar embargos de declaração, julgados pela própria Primeira Turma.
Esse recurso é usado para apontar contradições ou trechos da decisão que não ficaram claros.
Ou seja, para apresentar este tipo de recurso, as defesas terão que se debruçar sobre os detalhes do julgamento colegiado em busca de pontos que possam ser questionados.
Normalmente, os embargos de declaração não mudam o resultado.
Mas, em alguns casos, o STF admite efeitos modificativos. Isso significa que, se o recurso for aceito, a decisão pode ser alterada — como na redução da pena ou até na extinção da punição.
Condenação
Por 4 votos a 1, a Primeira Turma entendeu, em setembro, que ficou comprovada a atuação de uma organização criminosa que atuou para manter Bolsonaro no poder e que: agiu para minar a confiança da sociedade nas urnas eletrônicas; pressionou militares para aderirem à ruptura institucional; usou a máquina pública contra adversários, num esquema que envolveu espionagem ilegal e disseminou dados falsos, além de ter atacado o judiciário; traçou plano golpistas que previam até a prisão e morte de autoridades.
Atos, que no entendimento do Supremo e da PGR, culminaram nos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023 às sedes dos Três Poderes em Brasília.
O núcleo crucial foi considerado o responsável pelo planejamento e articulação dos atos golpistas.