Após mais de um mês e meio de angústia, o pesadelo de Lígia e Thiego chegou ao fim. O casal brasileiro, que ficou retido em um cruzeiro na Itália por causa da pandemia de coronavírus, conseguiu enfim retornar ao Brasil e chegou a São Paulo neste sábado (2), em um voo vindo de Roma, com escala em Frankfurt, na Alemanha.
Lígia Cossina preferiu esperar até o momento do embarque para confirmar que estava realmente voltando. “Estamos no limite da nossa sanidade mental”, explicou.
Durante o período em que tiveram que ficar confinados no navio, o casal foi contaminado pelo coronavírus, o que atrasou ainda mais o retorno e fez com que ficassem separados, tanto na embarcação quanto no hospital de campanha montado em um hotel para onde foram levados.
Apenas após a contraprova do primeiro teste negativo, na última terça (28), eles receberam autorização para ficar em um mesmo quarto, aguardando o voo.
Segundo Lígia, a companhia responsável pelo cruzeiro foi avisada com antecedência que o resultado sairia naquele dia e que havia um voo para o Brasil no dia seguinte, mas não tomou as providências a tempo, e por isso eles tiveram que esperar até a sexta-feira.
Ela e o marido embarcaram no navio Costa Victoria em Dubai, no dia 7 de março, para uma viagem em comemoração ao segundo aniversário de casamento. Quatro dias depois, países que estavam no roteiro passaram a proibir a embarcação de atracar e os passageiros perceberam que algo estava errado, mesmo sem receber mais informações.
No dia 11 daquele mês, a Organização Mundial de Saúde decretou a pandemia de coronavírus.
A situação se agravou a bordo no dia 23 de março, quando uma passageira argentina, com sintomas de Covid-19, foi desembarcada na Grécia. A partir dali, todos foram confinados em suas cabines.
O medo aumentou quando finalmente atracaram, no porto de Civitavecchia, em Roma, no dia seguinte, após serem barrados no porto de Veneza: naquele momento, o país era o que registrava o maior número de casos no mundo (sendo mais tarde ultrapassado por Estados Unidos e Espanha).
Ligia e Thiego passaram dias em uma cabine sem luz solar e com problemas no ar-condicionado, até que finalmente foram transferidos. Assim como os demais, recebiam três refeições diárias, em bandejas que eram colocadas no chão, na porta de suas cabines.
A brasileira diz que eles encontraram talheres sujos e fios de cabelo nas refeições e passaram a temer por sua saúde, ao perceber que as normas de higiene a bordo não estavam sendo seguidas com rigor.
Após quase três semanas, por sugestão de um passageiro, foram feitos testes, e aqueles que tiveram resultados negativos foram liberados para regressar aos seus países – foi o caso de outro casal brasileiro, Nelson e Maria de Lourdes, moradores de Santos.
Ligia e Thiego não tiveram a mesma sorte. Embora assintomáticos, ambos testaram positivo. Foi quando passaram a ocupar cabines separadas, até serem transferidos para o hospital montado no hotel em Roma, em uma operação que ela considera traumática.
Ao lado de outro passageiro, um americano, eles foram retirados do navio em um dia bastante frio e chuvoso, e colocados em um carro forrado com sacolas plásticas. As “divisórias” entre os passageiros e o motorista também eram feitas por plásticos presos por fitas adesivas.
Na chegada, ainda tiveram que aguardar do lado de fora até que toda a parte burocrática fosse resolvida e sua entrada fosse liberada. “Colocaram nossa saúde em risco mais uma vez. Passamos frio e estávamos expostos na chuva, sendo que tínhamos diagnóstico de Covid-19”, ressalta.
Com todo o trauma, Ligia lamenta que o que deveria ser uma viagem de comemoração tenha se transformado em um sofrimento tão longo, provocado pelo que chama de “um misto de histeria e despreparo” dos organizadores do cruzeiro.
Sobre a possibilidade de voltar a um navio no futuro, ou mesmo conhecer o país em outras condições, ela afirma que ainda não consegue imaginar a ideia. “Por enquanto não consigo pensar nisso, nem em fazer cruzeiro e nem em voltar para a Itália, de verdade”, garante.