Quando sua prisão foi decretada, Luiz Inácio Lula da Silva estava fechado em uma sala do instituto que leva seu nome, em São Paulo. Conversava com um deputado do PT e com a mulher dele, que queria dar um abraço no ex-presidente. Por um momento desconectados do noticiário, mantinham-se alheios à informação que se espalhava pelo País.
Àquela altura, ainda estavam no local alguns assessores de Lula e três aliados: a ex-presidenta Dilma Rousseff, a senadora e presidente do partido, Gleisi Hoffmann (PT-PR), e o ex-governador Cid Gomes (PDT-CE). Concordaram que seria melhor esperar o retorno dos advogados para falar com o petista.
Dentro do imóvel em que comandou as principais articulações políticas da esquerda desde sua saída do governo, em 2010, Lula foi o último a saber que seu destino estava selado.
Coube a Dilma interromper a conversa amena do petista com o deputado. Ela entrou na sala sem bater e parou em pé ao lado do sofá escuro no qual seu padrinho político se acomodara. Em seguida chegou Gleisi. Não precisaram falar nada. O ex-presidente se levantou e as acompanhou até outro recinto, onde recebeu a notícia da boca de seus defensores.
Embora a prisão do petista fosse um fato anunciado, a maioria supunha que se tornaria realidade apenas uma semana depois. Às pressas, parlamentares e dirigentes do partido foram ao encontro do ex-presidente para pôr em marcha ao menos parte do plano que Lula já havia elaborado para fazer de sua detenção uma despedida histórica.
O roteiro estava pronto, mas ninguém imaginava que precisaria começar a ser executado naquela noite de 5 de abril de 2018, um dia que havia começado com gosto de derrota. O maior revés da história do PT se consolidara pouco menos de 24 horas antes, quando a ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), proferiu o voto que abriu caminho para a prisão de Lula.
O ex-presidente não externou surpresa com o resultado. Tratando os aliados como ingênuos, disse que só eles tinham esperança de um desfecho diferente. “Eu vou ser preso. E não vão me prender para me soltar em três dias.”
Lula assistiu a pedaços do julgamento no Supremo. Entrava e saía da sala em que seus aliados estavam reunidos no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo (SP). Deteve-se por algum tempo somente durante o voto de Luís Roberto Barroso.
Não viu quando Rosa Weber, única incógnita naquela sessão, enfatizou que iria privilegiar a colegialidade. Rui Falcão, ex-presidente do PT, concluiu: “Já era”.
A magistrada decidiu seguir a orientação firmada pela maioria de seus pares em 2016, e não a convicção pessoal que expressara na ocasião, quando foi contrária ao cumprimento da pena a partir de condenação em segunda instância. Com a escolha, fez da prisão de Lula uma questão de tempo.
O PT calculava que o ex-presidente seria encarcerado somente após a rejeição do último recurso a que ele tinha direito contra a decisão tomada em janeiro pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
O veredicto, de 12 anos e um mês em regime fechado, diz respeito a apenas um dos seis processos dos quais o petista é alvo. Neste caso, foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro — os juízes entenderam que Lula recebeu um triplex no Guarujá (SP) da construtora OAS como forma de retribuição a vantagens obtidas pela empresa em contratos com a Petrobras.
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O dia seguinte ao do julgamento foi tomado por reuniões no Instituto Lula. A maior parte dos aliados do petista saiu de lá por volta de 17h a fim de iniciar os preparativos para os atos que marcariam seus últimos momentos de liberdade.
Não deu tempo. Às 17h50min, num lance inesperado, o juiz federal Sérgio Moro decretou a prisão; Lula seria o primeiro ex-presidente detido por crime comum.
Nos dias que antecederam o decreto da prisão, Lula ouviu uma série de sugestões. Houve desde apelos para se asilar em embaixadas de países simpáticos a sua causa até a proposta de sair de cena após um grande ato em Garanhuns (PE), sua cidade natal, rodeado por nordestinos.
O ex-presidente ignorou os mais radicais, como fez ao longo de toda sua vida. Decidiu que, após a ordem de prisão, se acantonaria no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, entidade que comandou nos anos 1970 e que o projetou como personagem da política nacional. Transformaria o local num bunker cercado por militantes de diversos partidos, bem como de movimentos sociais e sindicais.
Sua principal preocupação era com a imagem daquele momento. Queria deixar para a posteridade a sensação de que estavam levando para a cadeia o maior líder popular da história recente do País.
O PT, entretanto, não conseguiu dar a Lula o cenário que ele desejava. Surpreendido pela rapidez de Moro, o partido não pôde arregimentar militantes de outros Estados.
