A cadeira vazia dos Estados Unidos em Belém do Pará representa um desafio para as negociações climáticas. Ausente da cúpula de líderes, na semana passada, o governo do presidente Donald Trump também não enviou representantes para a COP30, que começou nesta semana e, se não surgirem contratempos, vai até o próximo dia 21. No entanto, o maior emissor histórico de gases de efeito estufa – atrás apenas da China na atualidade – não está alijado dos debates na capital paraense. Com presença robusta na conferência, cabe a governadores, prefeitos e figuras da sociedade civil ou de empresas dos EUA enviar a mensagem de que existe um amplo setor do país comprometido com a proteção do planeta e disposto a desafiar o conhecido negacionismo do presidente republicano.
As autoridades americanas em Belém integram as coalizões nacionais “America is all in” (“A América está toda dentro”, em tradução livre), “Climate Mayors” (“Prefeitos climáticos”) e “US Climate Alliance” (“Aliança climática dos EUA”). Vieram à cidade governadores de estados como Califórnia, Novo México, Michigan e Wisconsin, além do prefeito de Phoenix, por exemplo.
Ao todo, mais de cem líderes americanos viajaram ao Brasil para a COP30. Segundo Mark Watts, diretor-executivo da Cúpula de Prefeitos C40, realizada antes da convenção no Rio, a delegação dos EUA é a segunda maior na conferência, atrás apenas do Brasil.
O caráter federativo dos EUA garante autonomia a estados e cidades, permitindo que adotem políticas próprias mesmo quando divergem do governo federal. Por isso, para além da simbologia da presença em Belém, gestores do país podem firmar compromissos climáticos e implementar metas próprias de redução de emissões, por exemplo.
São mais de 50 prefeitos e vários governadores, liderados, entre outros, pela governadora do Novo México, a democrata Lujan Grisham, e o governador da Califórnia, o também democrata Gavin Newsom. Todos estão reforçando seu compromisso com as metas do Acordo de Paris, do qual os EUA de Trump se retiraram formalmente – pela segunda vez –, e compartilhando soluções climáticas locais adotadas em seus territórios.
“Como estados podemos nos comprometer com as negociações, suas ideias, estratégias e metas. Representamos 24 estados e a metade da população dos EUA. E também temos nossas próprias políticas para a transição energética”, disse Grisham ao jornal O Globo, enquanto tinha suas primeiras reuniões em Belém na terça-feira. “A maioria dos americanos acredita nas mudanças climáticas, e exige resultados sérios. Se o presidente Trump não quer liderar, nós vamos preencher esse vazio. O que estamos fazendo aqui é dizer que ele não pode nos frear.”
Em seu primeiro dia no evento, Newsom visitou o Centro de Inovação do Pará junto ao governador Helder Barbalho, que na véspera rebatera uma crítica de Trump às estradas de seu estado e afirmara que o republicano deveria estar na COP30 discutindo mudanças climáticas. Após a agenda, na qual o governador americano chegou a provar cupuaçu e uma bebida de açaí, os dois assinaram um novo Memorando de Entendimento (MOU) entre Califórnia e Pará para fortalecer a cooperação na prevenção e combate a incêndios florestais.
“Podemos estar separados por continentes, mas estamos unidos na mesma luta: proteger nosso povo, nossas florestas e nosso futuro. O que vi em Belém foi inovação com raízes no respeito à natureza, uma lembrança de que as soluções para nossos maiores desafios são construídas do chão para cima”, avalia Newson, que chamou a ausência do governo federal americano de um ato “infantil”.
A Califórnia também esteve representada pelo senador democrata Josh Becker, que participou de várias reuniões em Belém e reforçou que “Donald Trump não fala em nome de todos os americanos”. O parlamentar ecoou a crítica de presidentes da América Latina ao republicano, chamado de “negacionista” e “mentiroso” por Gustavo Petro, da Colômbia, e Gabriel Boric, do Chile.
“Concordo totalmente, Trump é um mentiroso. Os americanos estão decepcionados”, enfatizou Becker. “É importante que nossas empresas estejam aqui, nossos legisladores, governadores e prefeitos. Estamos dando uma mensagem. Temos de chegar ao público americano e dizer que existe uma razão para que ocorram os furacões, os incêndios, tudo isso é mudança climática. E precisamos de uma ação global para enfrentar isso.”
Já Tony Evers, governador de Wisconsin e copresidente da US Climate Alliance, afirma que, em seu estado e por todo o país, existe a busca por “um futuro mais sustentável para nossos filhos e netos”. “A Aliança espera catalisar uma parceria e ação ainda mais profundas no Brasil, onde garantiremos que o mundo saiba que, independentemente dos obstáculos, estamos avançando”, previu.
Presidente da Climate Mayors e vice-presidente do C40, a prefeita de Phoenix, Kate Gallego, tem visão similar: “Estamos impulsionando soluções pragmáticas que trazem benefícios imediatos aos moradores, reduzindo as contas de energia, protegendo o acesso à água potável e à energia, e garantindo que nossos bairros estejam seguros contra eventos climáticos extremos.”
Dentro da Blue Zone, onde acontecem as negociações, alguns dos pavilhões que mais chamam a atenção são de países como Brasil, China, Indonésia, Alemanha, Canadá e Cingapura. Não existe espaço dos Estados Unidos, o que faz com o que os representantes extraoficiais do país realizem seus encontros no pavilhão de negócios, mais isolado.
ONGs internacionais também enviaram representantes dos EUA que, em alguns casos, acompanham as autoridades americanas. A diretora-executiva da Amazon Watch, Leila Salazar-López, é uma das que está batendo ponto em Belém. “Enquanto o governo federal dos EUA nega vergonhosamente a ciência climática e o Acordo de Paris, a sociedade civil e os governos subnacionais continuam a promover justiça e liderança climáticas”, destaca ela. As informações são do jornal O Globo.
