O retrato da demência apresentado na peça “Le Père”, do ponto de vista de quem perde progressivamente as funções cerebrais, impressionou Christopher Hampton. Na mesma noite em que assistiu ao espetáculo, em 2014, no Théâtre Hébertot, em Paris, o britânico vencedor do Oscar de melhor roteiro adaptado por “Ligações Perigosas” (1988) já se candidatava para traduzir a obra para o inglês. E, de preferência, para uma adaptação cinematográfica.
“De tão comovente, essa deveria ser a peça que apresentaria o autor ao mundo da língua inglesa”, diz Hampton, referindo-se ao dramaturgo francês Florian Zeller. Vencedora do prêmio Molière de melhor peça daquele ano, com o francês Robert Hirsch no papel do idoso confuso, “Le Père” inicialmente foi apenas traduzida, ganhando os palcos de Londres e de Nova York como “The Father”, em 2016, com o americano Frank Langella encabeçando o elenco.
A versão para as telas, que Hampton coescreveu com Zeller, inaugurou na semana passada a 42ª edição do Festival Internacional de Cinema do Cairo e estreia neste mês nos EUA, de olho no próximo Oscar. O drama com lançamento previsto nas salas do Brasil no início do ano é um forte candidato às estatuetas de melhor roteiro adaptado, concorrendo com Hampton, e de melhor ator, com Anthony Hopkins.
“The Father” evita sentimentalismo “ao mostrar alguém fragilizado pela demência de forma realista”, diz Christopher Hampton.
O inglês, que já ganhou o Oscar em 1992 na pele do assassino canibal de “O Silêncio dos Inocentes”, está impecável como o octogenário perdido com o que se passa ao seu redor. Desde o momento em que o personagem acorda até a hora de dormir, o espectador praticamente só vê o que o idoso vê, para assim entender como deve ser devastador não reconhecer mais os familiares ou a própria casa. E o resultado é desconcertante, ainda mais por Hopkins traduzir tão habilmente o desespero do
protagonista.