Não bastasse o aumento de preços dos alimentos, da gasolina e do gás de botijão neste início de ano, agora as contas de luz também poderão ficar mais salgadas a partir de maio.
Diante do baixo nível dos reservatórios hidrelétricos, após um período chuvoso que ficou aquém da média histórica, especialistas acreditam que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) pode acionar a bandeira vermelha 1 já no próximo mês.
A medida acrescenta um custo de R$ 4,169 a cada 100 kWh (quilowatt-hora) consumidos. Com isso, alguns economistas têm ajustado para cima suas expectativas para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) em maio.
Até março, o índice oficial de inflação do país acumula alta de 6,10% em 12 meses, acima da meta de inflação para este ano, que é de 3,75%. O dado de abril será divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) no dia 11 de maio.
Há quem acredite que a bandeira em maio possa ainda continuar no patamar amarelo (com cobrança adicional de R$ 1,343 a cada 100 kWh). Mas mesmo esses mais otimistas avaliam que o país não escapará da bandeira vermelha nos meses seguintes, até dezembro.
Criado em 2015, o sistema de bandeiras tarifárias das contas de luz é uma forma de sinalizar para os consumidores que os reservatórios hidrelétricos estão em baixa e que está sendo necessário o acionamento de usinas termelétricas, que produzem energia mais cara.
É uma maneira de estimular o consumidor a economizar, em momentos em que a energia hidrelétrica – que representa cerca de 65% da capacidade de geração de eletricidade no Brasil – está mais escassa, devido à falta de chuvas.
A Aneel divulga a bandeira das contas de luz que irá vigorar em maio nesta sexta-feira (30).
Reservatórios em baixa
“A previsão para maio é que a gente vá ter bandeira vermelha patamar 1”, afirma Cristopher Vlavianos, presidente da comercializadora Comerc Energia.
As comercializadoras são empresas que compram energia dos geradores e vendem aos consumidores livres, que são aqueles que não são atendidos pelas distribuidoras, como indústrias de vários segmentos, grandes comércios, shoppings, hospitais, supermercados, agronegócio etc.
Como trabalham com compra e venda de energia, as comercializadoras acompanham muito de perto as flutuações de preço e as condições de geração do setor elétrico.
“O nível dos reservatórios está mais baixo do que em outros anos”, diz Vlavianos. “No dia 29 de abril do ano passado, o reservatório do sistema interligado estava em 59,47% da capacidade. Hoje [28/04], ele está em 44,81%.”
O Sistema Interligado Nacional é o sistema de produção e transmissão de energia elétrica do Brasil. Ele é composto por quatro subsistemas (Sul, Sudeste/Centro-Oeste, Nordeste e a maior parte da região Norte), conectados entre si, o que permite mandar energia de um para outro, aproveitando os diferentes regimes de chuva e de vazão dos rios do país.
Maior uso de termelétricas
Gustavo Carvalho, gerente de preços e estudos de mercado da Thymos Energia, afirma que o modelo da consultoria também aponta para bandeira vermelha patamar 1 em maio.
“O Brasil é um país de matriz elétrica predominantemente hidráulica e o despacho [acionamento] das usinas é realizado de maneira centralizada”, explica.
“O ONS [Operador Nacional do Sistema Elétrico] executa um modelo de otimização para ver o quanto de térmica e de hidrelétricas precisam ser despachadas, de forma a atender a demanda prevista, tentando preservar o nível dos reservatórios, para ter a melhor operação possível em termos de custos e segurança do sistema.”
“O que a gente vem observando, de um tempo para cá, é que o comportamento hidrológico do país tem mudado bastante e nenhuma das usinas hidrelétricas tem gerado bem”, observa o gerente da Thymos.
“Qual é o impacto disso e por que isso tem a ver com as bandeiras da conta de luz? É que, quanto menos hidrelétrica gerar, mais térmica eu vou ter que usar para complementar e as térmicas vão sendo acionadas gradativamente, das mais baratas para as mais caras.”
Bandeiras suspensas em 2020
Além desse problema estrutural, de uma mudança do regime de chuvas do país que tem sido observada nos últimos 10 a 15 anos, há um outro fator de curto prazo que contribuiu para o baixo nível dos reservatórios, observa Étore Sanchez, economista-chefe da gestora Ativa Investimentos.
No ano passado, entre maio e novembro, a Aneel suspendeu o acionamento das bandeiras tarifárias, deixando as contas sem sobretaxas, como uma forma de aliviar os gastos dos consumidores em meio à pandemia da covid-19.
