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Criminalistas divergem sobre direito de Lula de não aceitar regime semiaberto

“O Bolsonaro parece o capitão do Titanic. O navio estava afundando e ele continuava fingindo que nada estava acontecendo”, disse o ex-presidente. (Foto: Reprodução de TV)

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva escreveu uma carta na tarde desta segunda-feira (30) em que diz que não aceita “barganhar” seus direitos e sua liberdade, em resposta à manifestação dos procuradores de Curitiba que na sexta-feira pediram à juíza Carolina Lebbos, responsável pela execução da pena do petista, que Lula seja transferido para o regime semiaberto. Especialistas divergem quanto à legalidade de um preso negar a progressão de regime.

Lula não diz na carta explicitamente que recusa a progressão de regime. No entanto, o texto reforça o discurso adotado pelo ex-presidente de que não utilizará de nenhum artifício jurídico para deixar a prisão que não seja sua declaração de inocência.

Para o criminalista Gontijo Conrado, um preso não tem liberdade para tomar a escolha de acatar ou não a progressão de pena. “A Lei de Execuções Penais de uma forma muito clara no artigo 112 prevê que a pena privativa de liberdade deve ser executada de forma progressiva”, disse.

Ele explicou que a manutenção de alguém aos cuidados do Estado, como o ex-presidente ou qualquer outro preso, envolve outros aspectos, como o custo de se manter uma pessoa sob custódia e, portanto, a decisão de manter um preso deve ser do Estado. “É necessário que se observe o rito procedimental e a lei é clara ao dizer que o juiz determinará a progressão do regime quando atingidos os requisitos objetivos [tempo mínimo de cumprimento da pena] e subjetivos [bom comportamento]”.

Vera Chemim, constitucionalista e mestre em Direito Público Administrativo pela FGV (Fundação Getulio Vargas), é mais taxativa ao dizer que Lula não tem a prerrogativa de recusar a transferência para o regime semiaberto ou domiciliar. “Se é determinado que ele faça a progressão de regime para o semiaberto ou mesmo para o aberto, ele teria que a princípio atender aquilo que prevê a lei ou aquilo que as instituições competentes determinam”, disse.

Vera afirmou ainda que a recusa pode ser encarada como uma estratégia do ex-presidente, uma vez que aceitar essa condição pode ser considerado um reconhecimento de culpa. “Talvez ele esteja esperando essa decisão do STF sobre a suspeição de Sérgio Moro, que pode anular toda a sentença, já que ao aceitar a progressão de pena, ele estaria, em outros termos, admitindo a culpabilidade.”

O criminalista João Paulo Martinelli também ressalta que a Lei de Execuções Penais prevê que o cumprimento da pena é por progressão. “Em nenhum momento a lei diz que a progressão é uma opção, uma faculdade”, afirma. No entanto, ele pondera que as condições impostas para a saída do regime fechado devem ser aceitas pelo sentenciado. “Se o preso diz que não aceita as condições, isso pode ser interpretado como um empecilho para a progressão. Apesar de a lei afirmar que o cumprimento de pena ocorrerá com o regime de progressão, ela também diz que isso só ocorre com o cumprimento de condições”, explicou.

Para Martinelli, não aceitar as condições pode significar o mesmo que descumpri-las, o que pode gerar a regressão de pena – quando um sujeito “volta” de um regime mais brando, como o semiaberto ou domiciliar, para o fechado. “Eu faço a seguinte interpretação, já que não está especificamente da lei: se o descumprimento da progressão autoriza a regressão, da mesma forma não aceitar as condições também seria uma forma de sequer dar início à progressão”, afirmou.

Já o criminalista Fernando Castelo Branco acredita que o ex-presidente Lula tem o direito de recusar a progressão. “É um direito, não é uma imposição. Então, como direito, não sendo uma atividade a qual ele está obrigado a acatar, diferentemente do inverso que seria a prisão, ele tem toda a possibilidade de recusa”, disse.

Castelo Branco também abordou o fato de o preso não ser obrigado a acatar as condições impostas. “Existe o requisito objetivo que é cumprimento do tempo, mas existem imposições de algumas regras também: por exemplo, a necessidade de trabalho, eventualmente monitoramento eletrônico. Nessas circunstâncias, ele também não está obrigado a aceitar essas imposições.”

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