O empréstimo de R$ 20 bilhões que o governo Lula busca para os Correios — a ser obtido junto a bancos públicos e privados, com aval do Tesouro Nacional — é maior do que qualquer outra garantia concedida pela União para estatais, Estados e municípios nos últimos 15 anos.
De 2010 a 2025, o Tesouro foi avalista de 767 empréstimos internos (concedidos por instituições financeiras do Brasil) para Estados, municípios e estatais. Essas operações financiaram diferentes planos de investimentos e socorros financeiros.
No mesmo período, foram 407 operações externas, ou seja, com instituições estrangeiras. Nenhum dos empréstimos chegou a R$ 20 bilhões. O Estadão levantou as informações com dados da Secretaria do Tesouro Nacional. O Tesouro, o Ministério da Fazenda e os Correios não comentaram.
Os Correios querem um empréstimo de R$ 20 bilhões para socorrer o caixa da estatal, que registrou prejuízo de R$ 4,37 bilhões só no primeiro semestre de 2025. A empresa acumula 12 trimestres consecutivos de prejuízo, com aumento de gastos, de um lado, e redução de receitas, de outro.
A companhia busca a formação de um consórcio de bancos privados e públicos para a concessão do financiamento. A operação é questionada por especialistas, que veem como inevitável o risco de o governo federal acabar bancando o empréstimo com dinheiro do Tesouro Nacional.
Os Correios prometem apresentar um plano de reestruturação, incluindo um programa de demissão de funcionários, para demonstrar que poderão pagar a conta. Mas, se não pagarem, a União terá de arcar com a dívida.
Internamente, a maior operação com garantia do Tesouro Nacional foi um empréstimo do BNDES para a Caixa, no valor de R$ 5,9 bilhões, para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC e o programa Minha Casa, Minha Vida, em 2010).
A Eletrobras, por sua vez, recebeu R$ 12,8 bilhões por meio de quatro empréstimos do Banco do Brasil, da Caixa e do BNDES entre 2013 e 2014. Na ocasião, bancos privados se recusaram a conceder socorro à estatal do setor elétrico, que foi privatizada e recentemente mudou o nome para Axia Energia.
Entre os governos estaduais e municipais, o maior empréstimo com garantia da União foi dado pelo Banco do Brasil ao Estado de Minas Gerais em 2012, no valor de R$ 3,7 bilhões, para investimentos. Considerando os empréstimos externos, o maior também foi dado ao Estado de Minas Gerais, no valor de US$ 1,3 bilhão pelo Credit Suisse, no mesmo ano, para o programa de reestruturação da dívida da Cemig.
Os Correios são classificados como uma estatal não dependente de recursos do Tesouro Nacional. Se fosse classificada como dependente, não poderia coletar empréstimos com aval da União. Por isso, como o Estadão mostrou, questionam a operação, porque, na prática, os Correios passaram a depender do governo federal.
“Os Correios têm resultados negativos desde 2022 e não têm recursos para pagar sua folha. Portanto, deveria ser classificada como dependente e entrar no orçamento do governo”, diz Tiago Sbardelotto, auditor licenciado do Tesouro e economista da XP investimentos.
“Dado que isso não deve ocorrer, também porque não há espaço fiscal, minha visão é de que se trata de uma operação com um elevado risco para o Tesouro Nacional e que não deveria ser realizada sem um plano crível de recuperação da empresa“, afirma o analista.
O economista sugere que, além de uma análise do Tesouro, a operação solicitada passe pelo crível de algum tipo de avaliação independente sobre o quão factível é o processo de recuperação apresentado pela estatal. Com isso, a avaliação poderia considerar medidas de redução de dados para que o custo não recaia totalmente sobre o Tesouro.
Quando uma estatal, um Estado ou um município precisa de empréstimo, primeiro é necessário combinar as condições da operação com uma instituição financeira. Depois, o Tesouro Nacional avalia os limites, as condições e se aquela operação pode obter uma garantia da União.
O Tesouro consulta a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) em caso de questionamento jurídico. Só depois desse processo, e se for confirmado, é que a Fazenda concede autorização para a assinatura do contrato com garantia da União.
Até o momento, os Correios não informaram se algum banco concordou em dar o empréstimo. Como o Estadão mostrou, a Caixa e o Banco do Brasil têm ressalvas quanto ao pedido e ainda querem ver um plano consistente de recuperação dos Correios antes de dar os próximos passos, assim como o Ministério da Fazenda. “Entendo que o empréstimo não é uma solução estrutural e embute risco fiscal, dependendo do formato”, diz o ex-secretário de Fazenda do Estado de São Paulo e economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto. Com informações do portal Estadão.
