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Ex-governador Tarso Genro diz que o PT ainda vive sob a sombra do mensalão

Tarso avalia que o escândalo do mensalão provocou um baque interno ao mostrar que o PT recorria a métodos que sempre condenou. (Foto: Lucas Uebel/O Sul)

Há dez anos, quando o escândalo do mensalão foi detonado pelas revelações do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) sobre o pagamento de recursos a parlamentares da base em troca de apoio ao governo Lula, o PT viveu o que pensava ser a maior crise de sua história. Apesar de não ter interrompido o projeto de poder da sigla, que venceria ainda três eleições presidenciais, o mensalão deixou marcas profundas, que têm ligação com a situação atual, ainda mais dramática.

Uma década depois, dirigentes do partido e analistas concordam: as agruras do PT em meio à crise política do governo Dilma e à Operação Lava-Jato têm como origem o escândalo do mensalão. O efeito imediato da revelação do caso por Jefferson, em 6 de junho de 2005, foi a destruição de toda a estrutura de comando partidário arquitetada pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, que brecou os conflitos entre as tendências petistas para viabilizar, assim, a chegada de Lula ao Planalto, na eleição de 2002.

“Internamente, foi um desastre. Havia um comando consolidado no PT que foi abatido”, lembrou um dirigente do grupo majoritário do PT. Para o ex-governador gaúcho Tarso Genro, da corrente opositora à de Dirceu, Mensagem ao Partido, a legenda ainda vive “sob a sombra do mensalão”. Ele avalia que o escândalo provocou um baque interno ao mostrar que a sigla recorria a métodos que sempre condenou.

“O mensalão produziu um impacto muito forte porque toda a militância do partido, suas direções e quadros intermediários, entenderam que o PT estava sujeito a ter as mesmas práticas dos partidos tradicionais. Sofrer das mesmas deformações da política tradicional, arriscando se tornar um partido comum, que derrota sua própria utopia e assume a governabilidade e o poder como essenciais”, disse Tarso, que assumiu a presidência da sigla logo após o escândalo vir à tona, em 2005, pregando a refundação da legenda.

O cientista político Carlos Melo, professor do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), avalia que o escândalo, ao abater lideranças petistas como Dirceu, Luiz Gushiken, José Genoíno, João Paulo Cunha, Silvio Pereira e Delúbio Soares, prejudicou a condução do PT.

“O partido perdeu quadros importantes, pessoas que tinham experiência e habilidade para manejar a disputa política interna e no Parlamento. Passou a ser dirigido por um segundo time”, disse Melo, para quem o atual presidente da legenda, Rui Falcão, dificilmente estaria hoje no posto sem o escândalo. “Talvez a direção nacional não fosse tão frágil como é”, completou o professor.

Líderes petistas entendem que, ao assumir publicamente a defesa de seus dirigentes envolvidos no escândalo, o partido agravou o desgaste diante da população. Em um primeiro momento, sob o comando de Tarso, a Executiva chegou a aprovar uma resolução pedindo “desculpas à nação”, mas, em seguida, passou a contestar provas recolhidas e os critérios do STF (Supremo Tribunal Federal) que condenaram os réus, entre eles Dirceu e Genoíno.

Foi também o mensalão que possibilitou que Dilma Rousseff, atualmente em conflito com o PT por causa do ajuste fiscal, fosse escolhida para suceder Lula. Com amplo controle da máquina partidária, Dirceu era o aspirante natural. Mas Lula dava sinais, segundo petistas, de que o seu preferido era o então ministro da Fazenda, Antonio Palocci.

De acordo com um dirigente do PT, o presidente mantinha certo “cuidado” na relação com Dirceu, evitando que seu poder crescesse muito. O suposto plano de Lula, porém, cairia por terra no ano seguinte, quando Palocci foi acusado da quebra do sigilo do caseiro Francenildo Costa, que o havia acusado de frequentar uma casa de lobby em Brasília.

“Surgiu mais uma janela de oportunidade para Lula, que passou a poder decidir o que bem entendesse sobre a sua sucessão. Dilma passou a ocupar um espaço como técnica sem expressão política, seja no PT ou na sociedade. Isso dava a Lula a tranquilidade de que poderia controlar Dilma como presidenta da República”, analisou Melo.

Tarso entende que a escolha solucionou um conflito interno do partido diante da falta de um nome de consenso: “O partido estava em crise, em meio a uma disputa entre as correntes. O presidente teve a capacidade de pacificar o partido naquele momento escolhendo a companheira Dilma, porque ela não era vinculada a nenhuma das correntes, portanto, pacificava o conflito.”

O ex-governador do Estado avalia, porém, que as consequências da escolha de uma pessoa desvinculada da vida partidária estão sendo vividas atualmente pelo PT. (AG)

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