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Governo suspenderá sistema de inteligência federal em meio a apuração sobre uso massivo de CPFs

PF apura uso de 70 milhões de CPFs em contas do Rio de Janeiro. (Foto: Freepik)

O governo federal anunciou a suspensão do sistema Córtex por duas semanas depois de identificar mau uso da plataforma de vigilância por parte da Polícia Militar do Rio de Janeiro. O relatório do Ministério da Justiça apontou o uso de milhões de CPFs em pesquisas.

O Córtex é uma plataforma de vigilância que cruza dados de pessoas, empresas e veículos, além de fazer um pente-fino nos órgãos que utilizam o sistema. O sistema é usado por diversas polícias brasileiras. O acesso da PMERJ foi temporariamente revogado depois que a auditoria encontrou um uso indevido da ferramenta.

O Ministério da Justiça e a Polícia Federal investigam de que forma e com qual finalidade foram utilizados cerca de 70 milhões de CPFs em consultas na plataforma por meio das credenciais de acesso da gestão Cláudio Castro (PL-RJ). O número de documentos, registrados como autores das buscas, representa cerca de um terço da população brasileira.

Em nota, o Ministério da Justiça afirmou que a suspensão não está vinculada a “casos específicos”. A plataforma ficará bloqueada de 14 a 28 de janeiro de 2026, segundo ofício enviado pelo ministério a secretarias de segurança e outros órgãos que usam o Córtex.

O governo ainda irá recadastrar os órgãos que utilizam a plataforma, em processo que foi chamado de “prova de vida institucional” pela pasta comandada por Ricardo Lewandowski. Segundo o mesmo ofício, apenas os perfis de acesso dos órgãos recadastrados permanecerão ativos quando o Córtex for desbloqueado.

Assinado pelo secretário Nacional de Segurança Pública, Mario Sarrubbo, o documento não menciona o caso do Rio, mas afirma que a medida “decorre de razões técnicas e operacionais”.

A suspensão da plataforma ainda teria o propósito de viabilizar auditorias periódicas, revisões de conformidade e manutenções preventivas na plataforma, diz a pasta.

O ofício afirma que, mesmo após a reinicialização do sistema, serão guardados “todos os registros estruturados, logs e históricos”.

Apuração

Em nota, o Ministério da Justiça afirma que deseja atualizar perfis, credenciais, pontos focais e termos de sigilo da plataforma. “Eventuais indícios de uso em desconformidade com as normas estabelecidas são encaminhados à autoridade policial competente, responsável pela apuração de autoria e materialidade. Como medidas administrativas preventivas, o Ministério adota, quando necessário, o bloqueio cautelar de acessos e procedimentos internos destinados à apuração de responsabilidades individuais.”

A Data Privacy Brasil, organização da sociedade civil, manifestou apoio à suspensão, argumentando que as denúncias feitas sobre governo do Rio de Janeiro revelam a fragilidade desse tipo de arquitetura tecnológica. Segundo a instituição, o caso confirma um alerta que ela faz desde 2020: o uso indiscriminado e sem supervisão do sistema representa um elevado risco à liberdade de expressão, ao devido processo legal e a outros direitos e garantias fundamentais.

“A suspensão do Ministério da Justiça e Segurança Pública não deve ser uma simples revisão dos termos. É preciso repensar toda a arquitetura do sistema, impedindo a centralização de bases e capilaridade do sistema Córtex. O Córtex precisa de medidas básicas de revisão sobre controle de acesso associadas ao GovBr, sessões de log out automatizadas e medidas técnicas que impeçam a cópia dos dados da plataforma”, disse, em nota.

O uso indevido do sistema de inteligência foi detectado por auditoria do Ministério da Justiça. Os CPFs foram registrados como autores de 213 milhões de buscas com uma das chaves de acesso à plataforma ligadas ao governo do Rio.

Em avaliação preliminar, o ministério apontou “fortes indícios” de automação das pesquisas, além da geração de CPFs para driblar mecanismos de bloqueio da plataforma. A auditoria analisou 236 dias de buscas feitas a partir de setembro de 2024.

Em outra frente, a Polícia Federal abriu inquérito para apurar se foram cometidos crimes de inserção de dados falsos em sistema de informação, violação do sigilo funcional e invasão de dispositivo informático. As duas apurações miram ainda consultas envolvendo PEPs (Pessoas Expostas Politicamente).

O Córtex teve o uso regulamentado em 2021, no governo Jair Bolsonaro (PL). A plataforma só pode ser usada por integrantes de órgãos que firmam convênio com o governo federal para obter informações em tempo real, coletadas por câmeras e outras bases de dados, principalmente sobre pessoas e placas de veículos. Com informações do g1 e da Folha de S. Paulo

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