Após o presidente dos EUA, Joe Biden, afirmar que o risco de um “Armagedom” relacionado a armas nucleares é o maior desde a Crise dos Mísseis, em 1962, integrantes do governo americano afirmaram que a retórica não está ligada a informações de que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, teria tomado uma decisão sobre um ataque, mas apenas reflete uma preocupação da Casa Branca.
“Ele não está brincando quando fala sobre o potencial uso de armas nucleares táticas ou armas químicas e biológicas”, disse Biden em um evento político na noite de quinta (6). “Não acho que exista tal coisa como a capacidade de alguém usar facilmente armas nucleares táticas e não acabar em um Armagedom.”
Apesar do tom elevado, que pode estar relacionado também às eleições legislativas do mês que vem, a Casa Branca foi rápida em pôr panos quentes. A começar pela comparação feita pelo presidente com a Crise dos Mísseis, em 1962, quando EUA e União Soviética estiveram perto de uma guerra nuclear: segundo integrantes do governo, o momento atual não traz os mesmos riscos de 70 anos atrás, e o risco de Putin recorrer a um ataque nuclear é pequeno, mesmo com armas táticas, que têm menor poder de destruição.
“Não vimos nenhum motivo para ajustar nossa própria postura nuclear estratégica nem temos indícios de que a Rússia esteja se preparando de maneira iminente para usar armas nucleares”, afirmou, a bordo do avião presidencial, a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre.
Além de alertar sobre a possibilidade de um ataque, Biden vem ressaltando as potenciais consequências caso Putin decida usar seu arsenal nuclear na Ucrânia. No mês passado, o secretário de Estado, Antony Blinken, confirmou que os EUA, em comunicações privadas com a Rússia, afirmaram que os russos deveriam parar de mencionar suas bombas atômicas em discursos e declarações à imprensa.
“Fomos bem claros com os russos publicamente e de forma privada para que parem com a conversa fiada sobre armas nucleares”, disse Blinken, em entrevista à CBS, no dia 25 de setembro. “É muito importante que Moscou escute de nós e saiba por nós que as consequências serão terríveis. E deixamos isso bem claro.”
Nesta sexta (7), a premier estoniana, Kaja Kallas, também afirmou que as ameaças de Putin devem ser levadas a sério, mas fez coro com Blinken ao lembrar dos custos envolvidos em um ataque nuclear.
Retórica nuclear
Embora serviços de inteligência ocidentais apontem que não há movimentações que indiquem um possível ataque nuclear, Putin fez, desde o início da guerra, diversas menções ao seu arsenal — na sexta-feira passada (30), quando oficializou a anexação de quatro regiões da Ucrânia, afirmou que usaria “todos os meios disponíveis” para defender as áreas que, agora, passaria a considerar seu território.
“Concordo que o mundo deveria levar as ameaças nucleares de Putin a sério. E acho que Biden sabe o que ele está tentando evitar: um ataque nuclear russo na Ucrânia”, afirmou, em diálogo promovido pela revista Foreign Policy, Matthew Kroenig, vice-diretor do Centro Scowcroft para Estratégia e Segurança, ligado ao Atlantic Council.
Mas há um fator que ainda preocupa os analistas e políticos: Putin vem acumulando derrotas militares, perdendo parte de áreas conquistadas em locais como Kharkiv, Kherson e Zaporíjia, graças a uma bem-sucedida contraofensiva ucraniana, apoiada por novas armas fornecidas pelo Ocidente.
A impopular mobilização parcial de 300 mil reservistas, anunciada no mês passado, deve demorar a surtir efeitos e talvez não seja suficiente para mudar os rumos da guerra. Aliados do governo já criticam abertamente os comandantes militares, chegando a defender que eles deveriam ser executados, e o líder checheno Ramzan Kadyrov, aliado de Putin e peça central na invasão, sugeriu, no sábado, que uma arma nuclear tática deveria ser usada, na primeira declaração do tipo de uma autoridade russa.
Por enquanto, não há sinais de que Putin esteja ameaçado no Kremlin: as críticas hoje são destinadas aos comandantes e ao seu ministro da Defesa, Sergei Shoigu. Mas a deterioração do cenário militar, aliada a problemas econômicos, podem deixar evidentes fissuras, e aí está o risco.
Em entrevista à CBS, o diretor da CIA, William Burns, afirma que o líder russo pode ser “muito perigoso e inconsequente” quando está pressionado — em um cenário extremo, ele poderia ser levado a tomar uma decisão extrema, como a autorização para um ataque nuclear para amenizar uma derrota militar que, como aponta Makarkian, não seria aceita pelos russos.
