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Há 30 anos no Brasil não havia um presidente da República com aliados tão infiéis

Terceiro mandato de Lula tem a coalizão mais infiel em 30 anos. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

O terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva registra a base mais infiel das últimas três décadas: apenas 72% dos votos de deputados de partidos com ministérios foram favoráveis ao Planalto nas votações de interesse do governo na Câmara dos Deputados. A fragilidade da coalizão ajuda a explicar uma sequência de derrotas recentes, como a aprovação do projeto que derrubou o decreto do IOF – medida apoiada por legendas como União Brasil, MDB, PSD, Republicanos, PP, PDT e PSB, que juntas controlam doze ministérios.

As dificuldades ganham ainda mais peso neste ano pré-eleitoral, quando o presidente petista precisa consolidar maiorias para aprovar pautas estratégicas de olho na disputa presidencial de 2026.

Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo, com base em dados da própria Câmara, analisou todas as votações nominais em que houve orientação oficial do Planalto, ou seja, ocasiões em que o governo indicou expressamente como esperava que sua base votasse. Nesse recorte, o desempenho da coalizão ministerial

Reação governista

Vice-líder diz que há tempo para presidente reverter cenário instável e minimiza queda de popularidade em Lula 3 é o pior desde 1995, empatando apenas com o segundo mandato de Dilma Rousseff, que registrou 72% no auge da crise do impeachment.

Presidentes anteriores tiveram índices mais altos: Fernando Henrique Cardoso, 95% no primeiro mandato e 93% no segundo; Lula 1, 91%, e Lula 2, 92%; Dilma 1, 81%; Michel Temer, 93%; e Jair Bolsonaro, 90%.

A última leva de derrotas incluiu a aprovação do projeto que suspende o decreto do governo sobre o IOF, com 63% dos votos favoráveis de deputados de partidos que hoje comandam ministérios, como União Brasil, PSD, MDB, PP, Republicanos, PDT e PSB. O movimento ganhou força após o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), pautar o tema em votação surpresa – o que resultou em uma reação rara na história do Congresso: em 40 anos, apenas dois decretos presidenciais haviam sido derrubados.

Para cientistas políticos ouvidos pela publicação, essa derrota expressiva e o baixo desempenho da base refletem fatores tanto conjunturais quanto estruturais, como o fortalecimento da maioria de direita no Congresso e o empoderamento do Legislativo após a consolidação das emendas parlamentares, mudando a lógica de negociação com o Executivo.

Falhas

Parlamentares aliados, por sua vez, apontam falhas na articulação política, como a resistência de Lula em se envolver diretamente nas conversas, a falta de diálogo com o Palácio do Planalto e a demora na liberação de emendas.

Na avaliação do deputado Mário Heringer, líder do PDT na Câmara – partido que comanda o Ministério da Previdência –, o presidente se afastou das relações com o Parlamento neste mandato. “É o período em que Lula está mais distante do Legislativo de verdade”, diz, alegando que isso contribuiu para uma série de derrotas no Congresso. Lula é o presidente que menos se reuniu com congressistas em agendas oficiais desde Dilma.

Outra reclamação frequente entre deputados, afirma ele, é a concentração dos principais ministérios no núcleo duro do PT, apesar de Lula ter vencido em 2022 com o discurso de frente ampla. “Comparativamente, sem dúvida, esse é o mandato em que menos alterações foram feitas pelo Lula. Há muito tempo criticamos o que, na nossa opinião, é uma má distribuição dos espaços no governo.”

Um influente deputado do PSD, sigla que comanda três ministérios, relata que Lula tem ignorado os apelos da bancada por pastas com maior relevância. Segundo ele, os parlamentares vêm cobrando espaços mais estratégicos na Esplanada. Um dos focos de insatisfação é o Ministério da Pesca, chefiado por André de Paula. O parlamentar diz que a sigla já vinha pedindo uma pasta “com mais visibilidade dentro do Palácio” e que não vê mais “timing” para uma reforma. Além da Pesca, o PSD de Gilberto Kassab controla as pastas da Agricultura e Pecuária e de Minas e Energia.

Com a queda de popularidade de Lula nas pesquisas, o mesmo deputado avalia que a fatura política para apoiar o Planalto tende a subir, enquanto as chances de o partido endossar sua candidatura à reeleição diminuem.

Pontas soltas

Na contramão do discurso entre os aliados, o deputado Zé Neto (PT-BA), vice-líder do governo na Câmara, minimiza o impacto da queda de popularidade e alega que ainda há tempo para o Planalto reverter o cenário de instabilidade. Ele diz que é hora de distensionar a relação entre Executivo e Congresso, e avalia que o governo precisa reunir os partidos com ministérios para “baixar a temperatura” e resolver o que descreve como “pontas soltas” da articulação política. Com informações de O Estado de S. Paulo

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