O número de internações por câncer de intestino (colorretal) aumentou 64% nos últimos dez anos, um resultado que preocupa especialistas de diferentes áreas. Todos apontam as mesmas causas para esse crescimento tão significativo: alimentação e estilo de vida. Com isso, os tumores de cólon já constituem o segundo tipo mais prevalente da enfermidade entre homens e mulheres, atrás apenas de próstata e mama, respectivamente. O levantamento inédito foi realizado pela Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (Sobed), Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP) e Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG).
Médicos explicam que o aumento do consumo de alimentos ultraprocessados e a redução do consumo de fibras, somados a sedentarismo, tabagismo e alcoolismo, são as principais causas do crescimento dos cânceres intestinais.
“O câncer colorretal sempre foi prevalente, mas os números vêm aumentando, e ele já é o segundo mais comum tanto para homens quanto para mulheres”, explicou o cirurgião Marcelo Averbach, do Hospital Sírio-Libanês, coordenador nacional da campanha março azul para prevenção do câncer de intestino. “O aumento do número de casos é decorrente, basicamente, de condições ambientais, sobretudo da dieta, rica em alimentos ultraprocessados e embutidos, baixa ingestão de fibras e de líquidos. Além disso, há outras questões comportamentais, como sedentarismo, tabagismo e alcoolismo.”
Segundo o trabalho, os registros de internação trazem números alarmantes: foram 657.183 hospitalizações só no Sistema Único de Saúde (SUS) para o tratamento dessa doença entre 2012 e 2021, com impactos imensuráveis para milhares de famílias brasileiras. Neste mesmo período, foi observado um crescimento de 64% das internações. Já os dados de mortalidade decorrentes desse tipo de neoplasia indicam que, somente em 2021, foram registrados 19.924 óbitos por câncer do cólon, da junção retossigmoide e do reto, um aumento de 40% em relação a 2012.
Nem mesmo a pandemia de covid baixou o número de internações por câncer de intestino. Os números revelam um aumento das hospitalizações em 21 Estados brasileiros no período. O maior aumento proporcional ocorreu em Mato Grosso, onde o número de internações passou de 917, em 2020, para 1.285, em 2022, um salto de 40%.
“A associação entre estilo de vida e câncer colorretal vem sendo demonstrada em vários estudos científicos”, afirmou a professora do Instituto de Nutrição Josué de Castro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Wilza Peres. “Isso envolve a má qualidade da alimentação e também o consumo de álcool, o tabagismo e o sedentarismo. A qualidade da alimentação vem piorando muito nos últimos anos, não só no Brasil mas em todos os países ocidentais.”
De fato, a última Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que o brasileiro come, por exemplo, cada vez menos feijão com arroz, um prato típico considerado excelente por nutricionistas, por reunir proteínas, carboidratos e fibras.
Entre a pesquisa realizada em 2002/2003 e a última, de 2017/2018, a média per capita anual de consumo de feijão caiu de 12,4 quilos para 5,9 quilos – uma redução de 52%. No caso do arroz, a redução foi um pouco menor, de 37%. O consumo passou de 31,6 quilos per capita por ano para 19,8 quilos.
Outros produtos, como a farinha de mandioca (70%), a farinha de trigo (56%) e leite (42%), também tiveram queda expressiva no mesmo período. Alimentos preparados e misturas industriais registraram alta de 56%, e as bebidas alcoólicas, de 19%. Os alimentos in natura ou minimamente processados estão perdendo espaço para a comida processada ou ultraprocessada, que passou a responder por quase 20% das calorias consumidas.