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O Ministério das Relações Exteriores demitiu um diplomata acusado de ter agredido duas ex-namoradas

Preso por ter espancado sua mulher, Renato de Ávila Viana foi liberado depois de pagar fiança. (Foto: Reprodução/Facebook)

O diplomata Renato de Ávila Flores foi demitido pelo MRE (Ministério das Relações Exteriores), ao final de um longo processo administrativo sobre acusações de agressão a duas ex-namoradas e liberação indevida de verba pública. A decisão foi publicada na edição desta quinta-feira (20) do DOU (Diário Oficial da União).

Na quarta (19), quando sua decisão já estava tomada pela cúpula do Itamaraty, ele foi detido pela Polícia Militar. Os vizinhos haviam ouvido os gritos e denunciado o diplomata por agressões a sua mulher. Segundo o jornal Correio Braziliense, Viana foi levado à 5ª Delegacia de Polícia, na área central de Brasília, mas liberado depois de pagar fiança de R$ 1.000. Viana responde ainda por dois processos criminais por espancamento de suas ex-namoradas na Justiça de Brasília.

O caso chocou a diplomacia brasileira e resultou na mobilização de mulheres diplomatas e oficiais e assistentes de chancelaria. Uma de suas vítimas relata ter perdido um dente ao ser golpeada pelo diplomata, no ano passado, e passado por uma cirurgia plástica reparadora. Ele respondera a outros dois processos administrativos por causa de suas agressões antes de enfrentar a Corregedoria do Serviço Exterior, o órgão que investiga denúncias contra funcionários do Itamaraty.

Por meio de nota, a ADB-Sindical (Associação dos Diplomatas do Brasil) reiterou “seu veemente repúdio a quaisquer atos de violência e discriminação contra as mulheres”. Como em outros recentes casos de demissão de diplomatas, o Itamaraty manteve-se em silêncio.

Primeiro-secretário na carreira diplomática, Viana formou-se em Direito pela Universidade de São Paulo antes de ingressar no Itamaraty. A nota de publicada no DOU detalha que sua demissão teve como base o desrespeito aos termos das leis que regem o serviço público federal. Segundo o Diário Oficial, ele incorreu em improbidade administrativa, por liberar recursos públicos sem observar as normas, desrespeitado os usos e costumes do País onde serviu, não mantido comportamento correto e decoroso na vida pública e privada nem conduta compatível com a moralidade administrativa, entre outros.

Casos de violência

O rapaz gentil, sorriso tímido e sedutor chamou a atenção de Joana (nome fictício), então colega na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP (Universidade de São Paulo), por imitar tão bem a voz melodiosa do cantor Chico Buarque – mérito conquistado graças às aulas de teatro no Colégio Bandeirantes. O encontro naquele ano de 1995 avançou para um relacionamento com Renato de Ávila Viana, o jovem, também estudante de direito, que se gabava, entre outros feitos, de citar frases de grandes autores. De O Pequeno Príncipe, por exemplo, pegou emprestado “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.

Desde então, Joana e outras mulheres escutariam essas mesmas citações. Infelizmente, esse não é o único elo que as une. Joana é uma das vítimas de agressão de Ávila, diplomata e primeiro-secretário do Ministério das Relações Exteriores. Se na década de 1990 as vítimas eram estudantes, as mais recentes incluem até uma funcionária do Itamaraty.

“Como me culpo por não ter feito nada, por não ter avisado minhas colegas na época. Mas eu achei que um dia a Justiça seria feita, que ele iria tropeçar. Mas nada deu errado até então”, disse Joana. Por três semanas, ela e Ávila ficaram juntos. Nesse tempo, ela diz que reconheceu no companheiro um agressor.

A insistência em seguir e controlar todos os passos dela e de sair do carro e esmurrar a lataria quando contrariado dispararam o sinal de alerta. “Na época, não havia celular. Então, ele ligava e falava com a minha família. Gritava dizendo que sabia que eu estava lá e não queria atender.” Em uma festa da faculdade, o fim trágico. Joana foi abatida com um soco no rosto.

Machucada, acuada e sozinha, calou-se. Não registrou um boletim de ocorrência. “Convivo até hoje com a minha inércia.” Meses depois, Joana soube de outra aluna espancada por Ávila. E depois outra. As estudantes se uniram e espalharam cartazes pela faculdade, ela diz. Sem citar nomes, alertavam para relações abusivas. Uma estudante registrou um boletim de ocorrência e acionou o então grêmio estudantil, conta Joana. Nada aconteceu. Um advogado contemporâneo de Ávila na USP, recentemente, contatou Joana para se solidarizar.

Mais de duas décadas depois, a agressão se repetiu. Dessa vez, a vítima não se calou. Se na USP o apelido do diplomata era “Renato, o espancador”, no Itamaraty ele é conhecido como “Renato facada” – uma ex-namorada o atingiu com objeto cortante após ele tê-la agredido. Mais uma mulher decidiu falar. Ela tem 22 anos e mora em Brasília. Acusa Ávila, de ter arrancado dela um dente, com chutes e uma cabeçada, da última vez que apanhou do então namorado.

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