Imagine que você está no início dos anos 2000.
Naquele momento, a internet era usada basicamente como forma de consulta, com as interações muito limitadas, mas o protocolo P2P começava a ter seu uso e disponibilidade exponenciais e tinha início o que mais tarde ficou conhecida como a Web 2.0.
Basicamente, essa tecnologia abriria as portas para novas possibilidades e um nível de interação mais profundo na rede, com usuários compartilhando arquivos, interagindo em redes sociais, criando conteúdos e tendo experiências até então impossíveis.
APIs (Interfaces de programação de Aplicativos) passaram a integrar sistemas e dados de uma forma jamais vista, criando inúmeras novas possibilidades.
Agora te convido caro leitor, a fazer uma viagem para este momento. O mundo como conhecemos hoje ainda não existia. Plataformas multibilionárias como Uber, Waze, Ifood, Airbnb, Facebook, Instagram, Whatsapp, Twitter, YoutTube, TikTok e muitos outros, ainda não existiam. O próprio Google, estava ainda praticamente dentro de uma garagem, enfim, a forma de vida era muito diferente.
E agora vamos refletir o seguinte:
Será que no início da Web 2.0, o mundo, as empresas e a sociedade em geral, poderiam imaginar as possibilidades de novos negócios viáveis de construir?
Afirmo categoricamente que praticamente a totalidade de pessoas e empresas não conseguiam enxergar esse cenário. E sabe por quê? Pelo simples fato de que quando olhamos o futuro, usamos nossas referências de passado.
Mas a nova reflexão que te convido a fazer é – Como vamos construir coisas novas se estivermos presos a possibilidades com as ferramentas que tínhamos disponíveis até hoje? O fato é que, tecnologias que nunca existiram, já estão disponíveis e ganham escala de adoção exponencial, assim como já ocorreu no início dos anos 2000 e em tantos outros, quando tecnologias disruptivas nasceram.
Aqui é importante pontuar um conceito importante: “Tecnologias disruptivas, são aquelas que mudam a nossa forma de viver”
Ou você acha que vivemos hoje da mesma forma que vivíamos antes do Uber, Waze, Whatsapp, redes sociais e por aí vai…?
Feita esta introdução, chegamos aos tempos atuais, onde o assunto do momento é Inteligência Artificial.
Vivemos hoje, um momento muito parecido com o dos anos 2000. Novas “coisas” serão criadas, novas empresas, novos serviços e novas formas de interação, produção e consumo.
Não é à toa que foi definido no Fórum Econômico Mundial de 2021 que a principal skill ou habilidade para um líder ou gestor nesses novos tempos é “Aprendizados de futuro”, já que reside exatamente na integração e conexão de possibilidades com as novas tecnologias o sucesso e a manutenção das empresas no mercado.
Vivemos a era da transição do Digital para o Artificial, e diria ainda em abordagem mais profunda – “Vivemos uma transição do Digital para o automatizado”.
Portanto, aqui vale um esclarecimento desses tempos que se iniciam: “Algoritmo” é uma coisa e “Modelo” é outra totalmente diferente.
Um algoritmo é uma fórmula matemática, que é necessária para criar modelos de I.A. Os modelos são a personificação da Inteligência Artificial, especialmente da generativa, porque eles são construídos com fórmulas matemáticas (algoritmos), que interagem com outros modelos já existentes, associadas a fluxos e regras configuráveis. Tudo isso, alimentados e treinados com conteúdo e dados específicos, vão gerar uma informação ou tarefa resultante ao fim do processo. E isso sim, é Inteligência Artificial.
Falando de chat GPT ele é basicamente um modelo de linguagem, que utiliza fontes de texto disponíveis na internet. A Open AI, empresa responsável pelo modelo, utiliza uma arquitetura de rede neural chamada “Transformer”. Vale a pena comentar o fato de que o Transformer foi desenvolvido por pesquisadores do Google.
Essa tecnologia desempenha papel tão importante neste modelo, que o próprio nome GPT é abreviação de Generative Pré-treined Transformer.
O grande ponto a considerar é o fato de que, para se considerar estar utilizando Inteligência Artificial nas organizações, é necessário criar modelos, com algoritmos, tecnologias e aprendizados, baseados na dinâmica específica de cada empresa, dotados de conteúdos e regras que façam sentido a própria organização e seus clientes ou usuários, ou no caso de governo, que possam atender cidadãos, e daí sim, entregando por meio da tecnologia, as tarefas, informações e automatizações necessárias para cada negócio, para cada indivíduo.
Portanto não se engane; conectar o ChatGPT nos atendimentos da sua empresa e pensar que com isso a sua organização estará na era da I.A é um equívoco.
Pensar isso, seria similar imaginar que com a chegada do Google não precisaríamos mais ir ao médico, pois se procurarmos tratamentos e diagnósticos baseados em sintomas, o Google é capaz de nos fornecer muitas alternativas e inclusive tratamentos.
Menos Artificial e mais inteligência. Não é apenas sobre tecnologia, mas especialmente sobre curadoria de conteúdo e treinamento dos modelos criados com as informações específicas de cada negócio.
Antes de criar uma I.A para uma organização, seja pública ou privada é necessário entender a dinâmica de atuação da organização, seus propósitos, objetivos e principalmente conteúdos que vão embasar o atendimento que a I.A irá realizar.
Treinar uma inteligência artificial é basicamente como treinar um novo colaborador, é como fazer um onboarding. Assim como um humano precisa conhecer as regras, cultura, produtos e especificidades da forma de operar da sua organização, a inteligência artificial, ou melhor ainda, o seu próprio modelo de I.A terá que “aprender” isso também. É sobre isso!
Dito isto, é inevitável concluir que vivemos um momento de grandes oportunidades e muitas transformações; e também um mundo que será cada vez mais eficiente, produtivo, abundante e automatizado.
A frase final que deixo caro leitor é uma afirmação. Nos próximos doze meses a pergunta que será feita para empresas, gestores públicos e privados não será – Você JÁ usa inteligência artificial na sua organização? – Mas sim: Você AINDA NÃO usa inteligência artificial na sua organização?
A largada já foi dada…
(Rafael Bechelin – Co Founder Grupo Líderes, Diretor e coordenador da Divisão de cidades inteligentes da Federasul, Presidente do Instituto de cidades inteligentes. Especialista em cidades inteligentes pelo Banco Mundial e Ecole Polytechnique Federale de Lausanne – EPFL. Palestrante de inovação, smartcities e tecnologias disruptivas)