Ícone do site Jornal O Sul

Manifesto pelas “batidinhas” femininas

(Foto: reprodução)

Vou fazer um desabafo: sou “barbeira” e admito. Não com orgulho, claro, porque raspar a lataria do carro pelos pilares das garagens da cidade não só já me deu muita taquicardia, mas também porque já gastei bastante dinheiro pelos “martelinhos de ouro” por aí (pensando bem, pelo menos eu aqueço a economia do setor automobilístico). Mas o fato é que, lá no fundo, assumi minha inabilidade espacial. Sim, eu já bati o carro das formas mais improváveis possíveis. Felizmente, jamais me envolvi em acidentes graves.

Já aconteceram algumas situações fantásticas, como cair com meu Ka verde em um buraco de troca de óleo de caminhão, atolar em uma estrada no meio do nada, bater até o teto do meu carro (o teto, gente! Até hoje não sei como). Coisas assim. Houve uma vez em que bati ambos os carros da família na mesma semana (dessa vez, eu meio que fingi um desmaio ao chegar em casa, para me poupar do sermão que, certamente, viria – não me julguem, foi uma questão de sobrevivência).

Porém, é quase com alegria que admito essa minha falta de destreza, e são dois os motivos: primeiro, porque é a minha forma de comprovar para o mundo aquela máxima de que ninguém é perfeito. Está aí o meu defeito, gente! E é esse argumento que uso para justificar as minhas barbeiragens em casa, depois de encarar o Patrickão toda manhosa, com lágrimas nos olhos, explicando que o carro é largo demais, que as crianças faziam confusão no banco de trás, que eu estava nervosa pelos acontecimentos dos últimos dias, porque a coluna ganhou vida e se mexia (ui, essa foi ruim), ou tudo junto misturado. Aí ele fica indignado (como fica a maioria dos homens – até hoje não entendo esse apego gigante à incolumidade dos automóveis), eu dou mais uma lamuriada, então, cansada da injustiça da vida – afinal, eu faço tantas-coisas-para-tanta-gente-o-tempo-todo – rodo a baiana, digo que chega e profiro, em alto brado: “não sou perfeita, afinal!”

E penso que essa é uma grande lição, inclusive para os meus filhos. Na ânsia de cumprir as obrigações do dia a dia, todos erramos. Todos nos atrapalhamos. Todos deixamos “marcas” indesejáveis pelo caminho. E é daqui que rumo ao segundo motivo pelo qual quase me agrada ter esse probleminha ao volante: diante de tantas tragédias, acompanhando tantas tristezas espalhadas pelo mundo afora, eu tenho agradecido, diariamente, pelos problemas que tenho. Sim, caro leitor, acredite: eu sou grata pelos meus problemas. Porque, veja, problemas sempre existirão. Sempre. Por mais pleno e feliz que você seja, haverá momentos de ansiedade, de tristeza, de medo e até mesmo de raiva. Porque a vida é imperfeita e não é linear – ainda bem!

A felicidade é uma condição de fundo, como aquela base sobre a qual decoramos a casa. Mas modificamos a decoração, volta e meia, conforme nosso humor ou nosso estado de espírito. As instabilidades da vida podem dar um toque mais sombrio ou mais alegre, e está tudo certo, desde que a base seja sólida, saudável e repleta de amor.

Ou seja, eu prefiro viver uma vida com problemas como carros arranhados e outros incômodos desse tipo, e agradeço quando tais situações acontecem: é a vida me lembrando de sua imperfeição, e eu aviso ao universo que continue me mandando esse tipo de problema. Porque eu definitivamente prefiro esse a outro.

Então, antes de reclamar dos pequenos percalços do seu dia a dia, pense se você não deve é ser grato por ter esse problema para chamar de seu. Olhe ao redor para constatar que, se você está cercado de pessoas que ama (família ou amigos), se você está pagando as suas contas, com saúde e realizando seus sonhos… sinceramente, você já tem tudo. E mesmo que a vida te deixe cicatrizes, que sejam dos riscos de colunas de estacionamento por aí…

Sair da versão mobile