Na manhã de terça-feira (4), a professora Keli Adriane Aniecevski, de 30 anos, se prontificou a atender um estranho que apareceu na creche Pró-Infância Aquarela, onde trabalhava em Saudades, cidadezinha no oeste de Santa Catarina. Lugar pacato, quem imaginaria uma tragédia dessas? Pega desprevenida, acabou atacada a golpes de facão e, mesmo com ferimentos graves, correu para alertar os demais sobre o agressor e tentar proteger os meninos e meninas, todos de seis meses a dois anos.
Não houve tempo sequer para receber socorro médico: a professora foi a primeira a ter morte confirmada. O massacre somava cinco vítimas até esta quarta-feira (5), três crianças e duas funcionárias da creche. “Ela foi uma verdadeira super-heroína. Conseguiu proteger várias crianças, mas perdeu a própria vida”, diz a prima Silvana Ester Helfer, de 29 anos.
As duas eram bem amigas desde a infância, quando a família de Keli se mudou de uma área afastada para um casa mais perto do centro de Saudades, município localizado na região de Chapecó-SC. Neta mais velha, a professora era solteira, tinha um irmão e ainda morava com os pais.
Na verdade, Keli era formada em Sistemas de Informação, mas se dava bem mesmo com criança. Podia passar horas brincando ou cuidando delas, segundo a família. Tanto que conseguiu um emprego fora da sua área e virou professora da creche há mais de cinco anos.
“Eu tive uma filha, recém-nascida, que só viveu 2h30 e Keli seria a madrinha dela. Mas a nossa família nunca viveu nenhuma tragédia parecida com a de hoje”, afirma Silvana, que é mãe de outro menino. “Ele adora a tia. Na semana passada, até me perguntou quando a gente iria para a casa dela brincar.”
No seu perfil no Facebook, Keli costumava compartilhar mensagens positivas e campanhas beneficentes. Entre as ações, publicou recentemente imagens de uma visita a um lar de idosos em Pinhalzinho, cidade vizinha. Também há posts de quando deixou o cabelo crescer para doá-lo.
“Era uma pessoa muito alegre, espontânea e carismática. De uma luz interior incrível: passava tranquilidade para todo mundo e deixava todo lugar mais feliz”, descreve Silvana, que foi para a casa dos tios, ampará-los, após o ataque. “O município inteiro está em choque.”
Com população estimada de 9,8 mil habitantes, é comum que as pessoas sejam próximas em Saudades. No entanto, a família de Keli afirma nunca ter ouvido falar do criminoso – identificado pela Polícia Civil como Fabiano Kipper Mai, de 18 anos.
Silvana conta que acordou animada na manhã da tragédia. Pôs uma música e começou a tirar as roupas da máquina de lavar, quando o telefone tocou. Era a mãe: “Filha, está sentada? É melhor sentar”. “Levei um susto. A notícia chegou como uma bomba. Keli era uma pessoa tão boa que ninguém está acreditando ainda. Não há muito o que dizer. Já tentei deitar, puxar os olhos, dizer que é mentira. Queria muito que fosse mentira.”
Para os moradores de Saudades, no Oeste catarinense, as professoras e demais funcionários da creche onde ocorreu um ataque na terça (4) foram fundamentais para evitar que houvesse mais mortes.
Uma professora e uma agente educacional morreram tentando defender seus alunos. Os demais professores também agiram rápido, se trancando nas salas com as demais crianças.
“Elas foram muito corajosas em lutar, em entrar em contato com ele [assassino], tentar salvar as outras crianças. Infelizmente não conseguiram. Algumas pessoas tiveram sorte, outras não”, afirma Edna Dessoy, mãe de uma das crianças que estavam na creche no momento do ataque.
O assassino tentou entrar em todas as salas da creche, mas as professoras conseguiram se trancar em diferentes salas e proteger as crianças, entre elas, o pequeno Emanuel, filho de Edna.
“Sou eternamente grata pelas professoras por terem salvo a vida do meu filho e da menina que estava junto”, afirma a mãe.
Três crianças menores de 2 anos de idade e duas mulheres, sendo a professora Keli Adriane Aniecevski e a agente educacional Mirla Renner, morreram no ataque.
As cinco vítimas foram enterradas na manhã desta quarta (5). A única criança sobrevivente passou por cirurgia e até esta quarta estava na UTI com quadro estável. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo e do portal de notícias G1.