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Memórias do ex-chefe de Defesa dos Estados Unidos detalha explosões extraordinárias do ex-presidente Donald Trump que ele diz ter ajudado a desarmar

Para aliados próximos, o desejo de Trump por um acordo amplo com a China é comparável à sua obsessão por um Nobel da Paz. (Foto: Shealah Craighead/The White House)

O presidente Donald Trump perguntou a Mark Esper, então secretário de Defesa dos Estados Unidos, sobre a possibilidade de lançar mísseis no México para “destruir os laboratórios de drogas” e acabar com os cartéis, sustentando que o envolvimento americano em um ataque contra seus vizinho do sul poderia ser mantido em segredo.

O diálogo, que segundo Esper se passou em 2020, é um dos vários momentos narrados pelo ex-secretário de Defesa em seu novo livro de memórias (A Sacred Oath: Memoirs of a Defense Secretary in Extraordinary Times, que será publicado na próxima terça-feira, 10), em que ele diz ter ficado “sem palavras” enquanto servia ao governo do republicano.

Esper, o último secretário de Defesa confirmado pelo Senado sob o comando de Trump, também se preocupava com a especulação de que o presidente poderia fazer um mal uso das Forças Armadas no dia da eleição de 2020 – vencida pelo democrata Joe Biden –, exigindo, por exemplo, que soldados apreendessem urnas. Ele alertou os subordinados para ficarem atentos a ligações incomuns da Casa Branca no período que antecedeu a eleição.

Em seu novo livro, o ex-secretário de Defesa Mark Esper descreve um Trump de comportamento errático e cercado por influências perigosas.

O livro oferece uma perspectiva incrivelmente sincera de um ex-secretário de Defesa e ilumina episódios importantes da presidência de Trump, incluindo alguns que eram desconhecidos ou pouco explorados.

“Senti que estava escrevendo para a história e para o povo americano”, disse Esper, que passou pelo processo padrão de autorização de segurança do Pentágono para verificar informações confidenciais. Ele também enviou seus escritos para mais de duas dezenas de generais de quatro estrelas, alguns membros do gabinete, para avaliar a precisão e a justiça na colocação dos fatos nos escritos.

Pressionado sobre sua visão a respeito de Trump, Esper – que se esforçou ao longo do livro para ser justo com o homem que o demitiu, ao mesmo tempo em que denunciava seu comportamento cada vez mais errático após seu primeiro julgamento de impeachment terminar, em fevereiro de 2020 – disse com cuidado, mas sem rodeios: “Ele é uma pessoa sem princípios que, por interesse próprio, não deveria estar na posição de serviço público.”

Um porta-voz de Trump não respondeu imediatamente a um pedido de comentário do The New York Times.

Esper descreve um governo completamente tomado por preocupações sobre a campanha de reeleição de Trump, com todas as decisões vinculadas a esse objetivo. Ele escreve que poderia ter renunciado e que chegou a ponderar a ideia várias vezes, mas que acreditava que o presidente estava cercado por tantas pessoas dispostas a apenas concordarem com ele – e outras que sussurravam ideias perigosas – , que alguém leal teria sido colocado em seu lugar. O verdadeiro ato de serviço, ele decidiu, era permanecer em seu posto para garantir que tais coisas não acontecessem.

De acordo com Esper, Trump teria sugerido bombardear o México para atingir cartéis de drogas e pretendia encobrir a participação americana.

Uma dessas ideias surgiu de Trump, que estava descontente com o fluxo constante de drogas pela fronteira sul, durante o verão de 2020 (inverno no Hemisfério sul). Trump perguntou a Esper pelo menos duas vezes se os militares poderiam “disparar mísseis no México para destruir laboratórios de drogas”.

“Eles não têm o controle de seu próprio país”, Esper conta que Trump disse.

Quando Esper levantou várias objeções, Trump disse que “poderíamos simplesmente disparar alguns mísseis Patriot e eliminar os laboratórios, silenciosamente”, acrescentando que “ninguém saberia que fomos nós”. Trump disse que apenas negaria a participação dos EUA no ataque, contou Esper, escrevendo que teria pensado que era uma piada se não estivesse encarando Trump cara a cara.

Comportamento errático

Na narrativa de Esper, Trump parece ter ficado mais ousado e mais errático depois que foi absolvido em seu primeiro julgamento de impeachment. Esper escreve que as escolhas de pessoal refletiam essa realidade, já que Trump tentou apertar seu controle sobre o Poder Executivo com exigências de lealdade pessoal.

Presidente teria sugerido que militares disparassem contra manifestantes antirracismo que protestavam após o assassinato de George Floyd.

Entre os desejos de Trump estava colocar 10 mil soldados da ativa nas ruas de Washington em 1º de junho de 2020, depois que grandes protestos contra a brutalidade policial eclodiram após o assassinato de George Floyd pela polícia. Trump perguntou a Esper sobre os manifestantes: “Você não pode simplesmente atirar neles?”

Esper descreve outro episódio quase um mês antes, no qual Trump, cujas perspectivas de reeleição mudaram por suas repetidas falhas na resposta à pandemia de coronavírus, comportou-se de forma tão errática em uma reunião de 9 de maio sobre a China com o Estado-Maior que um oficial ficou alarmado.

O oficial, não identificado no livro, confidenciou ao secretário de Defesa meses depois que a reunião o levou a pesquisar a 25ª Emenda, segundo a qual o vice-presidente e os membros do gabinete podem remover um presidente do cargo, para ver o que era necessário e em que circunstâncias poderia ser usado.

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