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“O aquecimento global não é a minha praia”, disse o novo diretor do Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

Darcton Damião também afirma que preocupação internacional com a Amazônia é "normal" e não adianta fingir "não existir um elefante na sala". (Foto: Miguel Ângelo/CNI)

O diretor interino do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais ), o oficial da Aeronáutica Darcton Policarpo Damião, não está convencido de que o aquecimento global causado pela ação humana é um fato comprovado.

Em entrevista ao O Globo um dia após o anúncio de que ocuparia o cargo, o professor do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) afirmou que o assunto “não é a sua praia”. E que, do que leu até agora sobre o tema, não chegou a uma conclusão sobre o fenômeno.

Damião chegou à direção do Inpe após uma crise criada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) no mês passado, quando ele criticou a atuação do órgão por divulgar dados sobre o aumento dos alertas de desmatamento na Amazônia.

Na sexta-feira (2), o cientista Ricardo Galvão foi exonerado da direção do Inpe e, na segunda-feira (5), o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, anunciou Darcton Damião como diretor interino. Ele deverá comandar o cargo até que seja elaborada uma lista tríplice, de onde deverá sair o diretor definitivo do órgão.

Damião garantiu também que, sob sua gestão, o Inpe seguirá divulgando informações sobre desmatamento na Amazônia, com uma ressalva: em situações alarmantes, a Presidência e os ministérios do Meio Ambiente e da Ciência e Tecnologia receberão os informes em primeira mão.

1) Qual será a linha mestra da sua gestão no Inpe?

A ideia é melhorar a comunicação entre o Ministério de Ciência e Tecnologia e os seus clientes, notadamente o Ministério do Meio Ambiente, o da Agricultura, o Itamaraty e o Planalto. Quando a gente trata de desmatamento, clima e meio ambiente global, não é uma questão simplesmente nacional. Envolve o concerto das nações e a Presidência. Porque são eles que vão ter que responder às pressões lá fora.

2) Isso quer dizer que será modificada a divulgação dos dados do Deter (Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia Legal em Tempo Real)?

Não há qualquer receio em relação à transparência dos dados. O Inpe não cria história. Ele conta a história. Há determinadas situações que precisam ser verificadas. Vou usar como exemplo o sistema de água de uma cidade. Se alguma coisa muito ruim for acontecer com a água da cidade, em vez de ir pro jornal, em primeiro lugar você vai falar com o prefeito. Entendeu o exemplo? Você (tomador de decisão) precisa saber disso antes. Não precisa saber disso pelo jornal. Eu não estou dizendo que o jornal não deva dar a notícia. Pelo contrário. Ele deve dar a notícia. Mas a administração da cidade tem que cuidar daquilo que implica além da água e a responsabilidade seria do prefeito.

3) O senhor, então, concorda com o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, quando ele afirma que, sobre os alertas de desmatamento, há situações que poderiam ser tratadas internamente?

Não posso opinar sobre algo que o general Heleno disse. Posso falar sobre o que se espera de mim, um alinhamento e uma comunicação mais fluida com as instituições que demandam dados do Inpe.

4) O governo anunciou uma licitação para contratar monitoramento com imagens de maior resolução. É de fato necessário?

Tudo depende. Depende de qual é a finalidade.

5) Mas o sistema de que dispomos hoje não é suficiente e eficiente para o trabalho que ele precisa fazer?

O sistema de hoje é muito melhor que o de 20 anos atrás. E o que teremos em 20 anos será muito melhor que o que temos hoje. Uma imagem é uma representação da floresta. Nunca vamos ter a floresta refletida na escala 1 para 1. Agora, o que precisamos é o que nós temos.

6) O senhor acredita que o planeta sofre com o aquecimento global, causado pela ação humana?

Não sou estudioso de temas globais. Sou um interessado. Existem várias opiniões contra e a favor. Leio e estudo. Não adianta emitir a minha opinião sobre isso. Seria o mesmo que emitir uma opinião sobre futebol no Brasil. Adoro futebol, mas não sou bom de bola, nunca joguei, e dizer que é melhor ou pior com o Neymar, para mim, vai cair no vazio. Estudo o assunto, mas (aquecimento global) não é a minha praia. Não sou autoridade no assunto.

7) O senhor acha que existe, como o presidente Jair Bolsonaro mencionou, uma psicose ambiental no exterior em relação ao Brasil?

Não vou dizer psicose. Existe o que em inglês se chama de “awareness”. Um estado de alerta. Isso ficou cada vez maior na medida em que o mundo foi ficando mais complexo e as sociedades mais interligadas e que as pessoas entendem que o clima é global. De que não existem fronteiras para isso. Então, o nível de informação aumentou, e isso gera expectativa nas outras nações.

8) E o senhor acha que esse nível de alerta mais alto é justificável?

Não vou dizer se é justificável porque há vários pontos nesse espectro, mas certamente é natural. Essa é uma realidade e temos que lidar com ela. Não adianta fingir que não tem um elefante na sala.

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