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Uma pesquisa revelou o imediatismo dos brasileiros

O levantamento mostrou que 65% dos brasileiros não poupam para o futuro – mesmo entre os mais ricos, cerca da metade não faz reservas. (Foto: Arquivo/Agência Brasil)

O brasileiro é imediatista e tem baixíssima tendência à poupança, mostram cálculos inéditos feitos a partir de levantamento do Datafolha. Eles medem o excesso de peso dado ao presente – o que os economistas chamam de “present bias”, ou, em termos simples, imediatismo. O resultado do estudo é relevante para a formulação de políticas públicas porque indica a resistência das pessoas em abrir mão de consumo no presente em troca de poupar e elevar recursos no futuro. O levantamento mostra ainda que 65% não poupam para o futuro – mesmo entre os mais ricos, cerca da metade não faz reservas.

Uma explicação é que há pouco incentivo para poupar porque aposentadoria e FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) repõem ou superam a renda atual na maior parte dos casos, segundo o professor Ricardo Brito, especializado em finanças e decisões de poupança. O problema é que a reforma da Previdência deve reduzir benefícios e adiar sua obtenção, elevando a importância da poupança particular e voluntária. E o estudo mostra o brasileiro despreparado para isso, seja por ignorância, seja por imediatismo.

Pouca paciência 

A “paciência” do brasileiro é de 0,26, número que mostra “imediatismo exacerbado”, segundo Brito – que coordenou o estudo a partir dos dados da pesquisa do Datafolha. O índice tem como base apenas respostas que faziam sentido do ponto de vista lógico e financeiro – 70% dos quase 6.000 entrevistados em duas baterias não revelaram conhecimento financeiro suficiente para isso.

“É um índice muito baixo, por qualquer ângulo de análise”, afirmou o economista. Em 2011, pesquisadores da Alemanha e da Suíça compararam o imediatismo em 45 países. O menor resultado encontrado foi o da Rússia: 0,21. O 0,26 obtido agora para o Brasil é menos da metade da média latino-americana.

“Poupar para o futuro é algo que vai contra a natureza do ser humano”, disse o economista Paulo Costa, doutorando em economia em Harvard e autor do livro “Aprendendo a Lidar com Dinheiro”. Um dos principais campos de estudo de Costa é como fenômenos psicológicos e comportamentais afetam as decisões financeiras das pessoas.

Contra a natureza 

“Os homens das cavernas passaram muitos anos consumindo imediatamente tudo que caçavam”, declarou. Com o aumento da expectativa de vida, segundo ele, a necessidade de pensar no amanhã cresceu muito rapidamente.

“Nosso cérebro não se ajusta na mesma frequência que a tecnologia avança. Comer um pedaço de pizza agora parece muito mais atraente do que esperar para comê-lo daqui a 40 anos, quando irei me aposentar.” Se a decisão é difícil para os indivíduos, governos têm chamado para si a tarefa de decidir por eles – no que é chamado de “paternalismo libertário” por economistas e cientistas políticos.

Há países nórdicos em que a previdência privada é obrigatória e, nos EUA, a adesão ao fundo de pensão da empresa é automática, estratégia conhecida como “nudges (“cutucões” ou “empurrões” que estimulam a ação ou dispensam decisão). Para o economista Ricardo Brito, o forte imediatismo brasileiro e a baixa instrução financeira revelados pelo Datafolha podem indicar a necessidade dessas políticas.

Na pesquisa, só 14% dos empregados registrados ou funcionários públicos disseram ter previdência privada. Entre os do setor informal ou que trabalham por conta própria, a fração cai para 8%. Paulo Costa enumera características brasileiras que, em comparação com outros países, incentivam menos a poupança: “Há universidades públicas gratuitas. O sistema de aposentadoria é um dos mais generosos do mundo. E o sistema de saúde, embora falho, existe e atende parcela da população”.

Poupar é difícil para todos, diz o professor da Universidade de Zurique Guilherme Lichand. “Mesmo executivos e professores universitários tem dificuldade de tomar essas decisões como deveriam, já que o custo de poupar cai no presente, e os benefícios só aparecem no futuro.”

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