Ainda em 2016, o deputado federal Darcísio Perondi (MDB-RS) foi protagonista da aprovação de um dos projetos mais emblemáticos do Congresso: a PEC (proposta de emenda à Constituição) que limitou o avanço dos gastos públicos federais ao índice de inflação do ano anterior, por 20 anos. O parlamentar, à época relator do texto, brigou durante seis meses pela matéria, envolvido em votações no plenário que se estenderam por mais de 12 horas.
Dois anos depois, nas eleições de 2018, não conseguiu a reeleição e ficou com apenas um terço dos votos conquistados quatro anos antes. Perdeu por alguns motivos – força de candidatos ligados a Jair Bolsonaro e voto a favor da reforma da Previdência, segundo especialistas, por exemplo – e, apesar do esforço, acabou com o trabalho no teto de gastos esquecido. Pouca gente associa Perondi ao texto. Todo o bônus ficou para o então governo Temer, que se desgastou por outros motivos, como se sabe. Um processo idêntico ocorre em Brasília atualmente.
A saga de Perondi é lembrada por parlamentares quando o tema é a reforma da Previdência do governo Bolsonaro. Ou seja, por mais que o Legislativo se esforce em aprovar o texto, os méritos ficarão com o Planalto, mesmo fragilizado com a falta de articulação no Congresso. É por isso que ganha cada vez mais força a tese de um projeto alternativo para a Previdência, como já disse o presidente da comissão especial, Marcelo Ramos (PR-AM). O raciocínio é que, mesmo com inaptidão de Bolsonaro, ele ganharia todos os pontos com o texto preparado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. A saída seria derrubar o texto e aprovar um outro.
“Por mais que haja esforço de avançar em pautas caras ao País ao mesmo tempo em que se tenta isolar Bolsonaro, é inevitável que o bônus recaia sobre o presidente”, atesta Thiago Vidal, analista político. “Isso ocorreu com a reforma trabalhista e o teto de gasto do governo Temer, por exemplo”, pondera.
Para ele, há um ambiente de parlamentarismo branco, ou governo paralelo, a partir do qual o Congresso tenta assumir a condução de propostas que o Planalto, por inabilidade ou por falta de vontade política, não consegue avançar. “Mas o desafio da Câmara e do Centrão, em particular, é como ganhar protagonismo em agendas que, a princípio, são patrocinadas pelo governo federal”, acrescenta. A partir daí, líderes do Centrão, chancelados por Maia, antecipam a discussão da reforma tributária na tentativa de atropelar o texto da Previdência. É o Congresso tentando se deslocar.
Desde o início do governo se falava da necessidade de interlocutores mais fortes para negociar com o Congresso. Não foi isso que Bolsonaro fez. Agora, ao tocar a própria agenda, como o projeto alternativo de Previdência, Maia reforça o argumento da incapacidade de Bolsonaro em estimular a economia – da qual o Congresso não pode se omitir. A partir dessa lógica, quanto mais forte os parlamentares ficarem, mais fracos o Planalto estará. Assim, os desafios do “parlamentarismo branco” são, justamente, como criar unidade e blindar o Legislativo em meio à insistência do governo em jogar a sociedade contra a classe política.
O Congresso está preparado para o que virá e vai defender a agenda econômica. “O governo acha que pode sempre jogar dessa forma, mostrando à sociedade que o Parlamento não quer votar as reformas, mas isso é mentira. Isso não existe e nós vamos votar, independentemente até do texto que o governo mandou, com ajustes ou não”, alerta o líder do PR na Câmara, Wellington Roberto (PB). O protagonismo do Legislativo vai tirar a imagem do que é ruim é culpa do Parlamento e o que dá certo é o governo quem fez.
“Enquanto o governo não construir maioria no Congresso, com diálogo e sem partir para o confronto, haverá um “parlamentarismo branco” instalado no Brasil no qual o Congresso vai pautar e dizer o que quer para o Brasil”, avisa o líder do PTB na Câmara (MA), Pedro Lucas Fernandes. “O governo parece que não faz questão de criar essa maioria. Está mais do que na hora de parar de achar que o Parlamento é podre e Executivo tem suas razões”, sustenta.