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O erro do IBGE que “mudou o signo” da maioria dos brasileiros, e foi tirado do ar após alerta da BBC

No País, a maioria dos nascimentos acontecem nos meses de março e maio. (Foto: Reprodução)

Desde o último dia 6) no fim da tarde, quem consultava nomes na plataforma Nomes no Brasil do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) não conseguia mais ver os dados de qual é o signo astrológico ou do horóscopo chinês mais comum para aquele nome.

Esse dado — um tanto exótico para uma publicação do IBGE, por não se tratar de uma estatística oficial — foi retirado do ar, após a BBC News Brasil questionar o fato de que, para a grande maioria dos nomes, a plataforma indicava que o signo mais comum era Aquário.

O sinal de alerta surgiu porque os aniversariantes de Aquário são pessoas nascidas entre o final de janeiro e o começo de fevereiro, uma época historicamente de baixo número de nascimentos no Brasil, segundo dados do próprio IBGE.

No País, a maioria dos nascimentos acontecem nos meses de março e maio — conforme reportagem publicada pela própria BBC em 2019. Já no último dia 10, o IBGE confirmou que os dados estavam errados.

“De acordo com a equipe técnica, houve de fato um erro de cálculo nos signos apresentados no site Nomes no Brasil. A informação foi retirada do ar, e quando os cálculos forem refeitos e revisados, serão disponibilizados novamente”, informou o instituto.

Questionado sobre por que signos foram incluídos num site estatístico oficial, o IBGE respondeu que isso foi feito “por mera curiosidade, para adicionar um pouco de leveza e ludicidade ao site”.

O site Nomes no Brasil foi lançado pelo IBGE no último dia 4. A ferramenta interativa permite consultar a ocorrência, período de nascimento, concentração geográfica e idade mediana de pessoas com determinados nomes e sobrenomes, a partir de dados do Censo de 2022.

Trata-se da segunda edição da ferramenta, que foi lançada pela primeira vez com dados do Censo de 2010 e idealizada pelo servidor Carlos Lessa como uma forma de dar visibilidade aos dados de nomes do Censo, sem ferir o sigilo individual das pessoas entrevistadas.

A divulgação dos dados de 2022, feita na semana passada, já havia sido marcada por um outro erro.

Os dados ficaram acessíveis pelos usuários por volta das 9h da manhã, quando a divulgação estava prevista para apenas às 10h.

Assim, veículos de imprensa publicaram reportagens sobre os dados antes da divulgação oficial, o que é incomum para estatísticas do IBGE, que em geral trabalha com dados embargados, para garantir a isonomia de acesso entre os diversos usuários.

A BBC News Brasil apurou que esse erro gerou desconforto dentro do próprio IBGE, sendo criticado reservadamente por servidores experientes.

A edição do Censo de 2022 sofreu atraso devido à pandemia e a corte de verbas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

A divulgação das estatísticas tem sido feita lentamente, devido à falta de servidores e recursos para processamento dos dados.

“Me choca muito, justamente em função da falta de recursos humanos, que o IBGE agora esteja gastando recursos — os parcos recursos que tem — para fazer coisas lúdicas”, diz Wasmália Bivar, ex-presidente do IBGE (2011-2016) e antes servidora de carreira do órgão estatístico, ao ser informada sobre o episódio pela BBC.

“O IBGE tem que fazer o seu trabalho, não é animador de programa de auditório. O IBGE é uma instituição séria. É a imagem institucional do IBGE que acaba ficando comprometida por decisões assim. A existência do IBGE não pode ser comprometida com uma coisa assim tão — desculpe a palavra — leviana.”

Desde o lançamento do site Nomes no Brasil, diversos usuários estranharam o fato de que, para quase todos os nomes pesquisados, a plataforma indicava que Aquário seria o signo mais comum.

Segundo levantamento da BBC News Brasil, apresentado ao IBGE como parte do questionamento sobre o possível erro, dos dez nomes mais comuns de mulher, para nove a plataforma dizia que Aquário era o signo mais comum, sendo Antônia (Gêmeos) a única exceção.

Entre os homens, eram sete dos dez mais comuns sob o signo de Aquário. As exceções — João (Câncer), Antônio (Gêmeos) e Pedro (Câncer) — são fáceis de entender, pois os signos batem com a data dos santos, quando nascem muitas pessoas que recebem seus nomes em homenagem.

“Esse é um dado mais interessante do que o signo em si, porque mostra algo da religiosidade do brasileiro”, comentou um técnico do IBGE em caráter reservado.

O jornal O Globo chegou a registrar a estranha confluência de Aquário nos dados do IBGE em uma reportagem publicada na quarta-feira, 5 de novembro.

No texto, o jornal listava que, dos 30 nomes mais populares do Brasil, 27 teriam Aquário como signo mais comum — dado que também foi levado pela BBC News Brasil ao IBGE como parte do questionamento.

No último dia 5, a reportagem questionou o IBGE sobre o motivo da inclusão de signos no site Nomes no Brasil, e se o dado estava correto, diante dessas coincidências listadas acima.

No dia 6, o IBGE respondeu através de sua assessoria de imprensa que “é natural que um mesmo signo predomine na população. Se há uma época do ano com maior número de nascimentos, é provável que a maioria dos nomes tenha o mesmo signo como predominante”.

Com base nessa resposta, a reportagem da BBC News Brasil questionou novamente o IBGE, ressaltando que, segundo dados do próprio instituto, os brasileiros nascem mais em março e maio, e não em janeiro e fevereiro — meses do signo de Aquário, segundo a astrologia.

Apenas após este segundo questionamento, a assessoria de imprensa do IBGE afirmou que os técnicos iriam verificar novamente a tabulação.

O instituto também informou que, enquanto isso, a opção de consultar o signo relacionado a cada nome seria desativada — o que de fato foi feito, conforme constatou a reportagem da BBC News Brasil.

A experiência de tentar reproduzir o cálculo do IBGE e a constatação de que não existem dados padronizados sobre as datas dos signos, e que um dia a mais ou a menos na tabela escolhida afeta muito os resultados finais, revela, porém, a fragilidade da inclusão de dados astrológicos em um site estatístico oficial.

A BBC News Brasil questionou o IBGE sobre quais datas foram usadas pelo instituto para fazer seu levantamento astrológico no site Nomes no Brasil, já que não existem dados oficiais sobre signos.

O instituto respondeu apenas que “como a Pnad Contínua é um levantamento amostral, que não pega toda a população brasileira, é possível que, mesmo após a correção dos dados, eles possam apresentar alguma diferença” com relação aos dados do Censo. As informações são da BBC News.

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