O fundo eleitoral de 1,75 bilhão de reais aprovado pelo Congresso Nacional em outubro para custear campanhas com dinheiro público vai reduzir a aplicação de verbas na saúde, diferentemente do que os parlamentares prometeram quando propuseram o novo gasto. O modelo passou como uma alternativa à proibição das doações eleitorais por empresas.
A destinação de parte das emendas parlamentares ao FEFC (Fundo Especial de Financiamento de Campanha) pode retirar, em cálculos conservadores, 70,3 milhões de reais originalmente destinados a despesas com saúde. O valor não foi considerado na manifestação da AGU (Advocacia-Geral da União) assinada pelo presidente Michel Temer e enviada ao Supremo Tribunal Federal na quinta-feira, em uma ação que questiona o fundo. No documento, o órgão afirma que investimentos do governo em áreas sociais, como a saúde, não serão prejudicados.
Com a verba destinada para as eleições, o orçamento de 2018 do Fundo Nacional de Saúde perderá verbas que haviam sido previstas, no mês passado, por senadores e deputados de pelo menos três Estados: Ceará, Paraíba e Santa Catarina. O corte na saúde pode aumentar, a depender de como os parlamentares dos demais Estados vão decidir sacrificar suas emendas para dar a contribuição obrigatória às campanhas. A definição será feita nas próximas semanas na Comissão Mista de Orçamento.
O fundo eleitoral será composto de 1,3 bilhão de reais em emendas coletivas impositivas somados aos 450 milhões de reais advindos do fim da compensação fiscal para TVs na exibição de propaganda partidária. Dessa forma, cada uma das 27 bancadas estaduais vai retirar 48,7 milhões de reais do valor originalmente destinado em emendas ao Orçamento que haviam sido assinadas por deputados e senadores e cuja execução pelo governo era obrigatória. Antes da lei, cada uma delas dispunha de um total de 162,4 milhões de reais. Agora, 30% desse será destinado às campanhas eleitorais.
No caso do Ceará, por exemplo, os parlamentares alocaram toda a verba impositiva (162,4 milhões de reais) em apenas uma emenda para manutenção de unidades médicas. Ou seja, o corte de 48,7 milhões de reais vai recair obrigatoriamente na área da saúde.
A ata das emendas traz a assinatura do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), um dos que negavam durante a tramitação da proposta que saúde e educação perderiam verba. “Não aceito nada de fonte que mexa um centavo de saúde e educação”, disse ele à época. Um dos idealizadores da ideia, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), fez coro: “A proposta que eu fiz não tira dinheiro da educação, da saúde, de lugar nenhum”.
Já os parlamentares da Paraíba enviaram 129 milhões de reais para manutenção dos equipamentos de saúde e 33,4 milhões de reais para a construção do sistema adutor do ramal do Piancó pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca.
A situação é semelhante em Santa Catarina. A bancada reservou 42,4 milhões de reais do Orçamento da União no próximo ano para a compra de equipamentos agrícolas, pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Mesmo que os parlamentares catarinenses redistribuam toda essa quantia para o fundo bilionário de campanha, ainda terão de transferir 6,3 milhões de reais dos 120 milhões de reais dados ao Fundo Nacional de Saúde para aplicar no fundo eleitoral.
Existem ainda casos como o do Espírito Santo, em que as duas emendas impositivas foram divididas entre saúde (52,4 milhões de reais para compra de ambulâncias) e educação (110 milhões de reais para a Universidade Federal do Espírito Santo), justamente as áreas que não seriam mexidas.