O Movimento dos Sem Terra (MST) ampliou a lista de exigências ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva enquanto mantém áreas rurais produtivas e de pesquisa sob o controle de seus militantes. Após ter cedido e feito nomeações em órgãos federais, a gestão petista se mobilizou para receber mais demandas.
De Londres, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, abandonou um evento e foi chamado de volta ao Brasil por Lula para tratar da crise. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, abriu as portas do gabinete da pasta na capital paulista a líderes dos sem-terra e se dispôs a ouvir novos pedidos.
O governo já havia nomeado 19 superintendentes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para tentar pôr fim à onda de invasões deflagradas no chamado “Abril Vermelho”. Em contrapartida, áreas invadidas em Petrolina (PE) e Aracruz (ES), pertencentes à Embrapa e à Suzano, deveriam ser desocupadas, o que não se concretizou. Setores do agronegócio, governadores e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), criticaram a investida do MST.
O movimento passou a pedir a nomeação de mais sete superintendentes do Incra e a instalação de uma mesa de negociação com a participação do governo federal para deixar terras invadidas da Suzano, além de cobrar de Haddad mais verbas públicas para a compra de terras destinadas à desapropriação. De acordo com o MST, os recursos são insuficientes para atender às necessidades da reforma agrária.
Após o encontro com o ministro, o coordenador nacional do MST, João Paulo Rodrigues, afirmou que Haddad vai estudar um aumento da verba destinada à obtenção de terras para a reforma agrária para R$ 400 milhões.
“O Incra herdado de (Jair) Bolsonaro teve um orçamento de R$ 200 milhões. A necessidade para assentar todas as famílias acampadas hoje é de R$ 1,3 bilhão. O ministro disse que é muito difícil recompor o orçamento neste ano”, disse Rodrigues.
Ainda segundo o líder do MST, Haddad também avalia criar dois grupos de trabalho. Um seria dedicado a estudar a viabilidade de devedores da União pagarem a dívida entregando suas terras, e outro, a analisar crédito para financiamento da agricultura familiar. O Ministério da Fazenda disse apenas que vai “estudar” a pauta de reivindicações recebida.
De acordo com Rodrigues, o movimento se comprometeu a desocupar as duas áreas invadidas até o fim de semana. “O ministro fez o pedido que é importante a desocupação e nós falamos que vamos desocupar a Embrapa assim que acharmos um local para colocar as 800 famílias que estão lá e que vamos desocupar a área da Suzano”, disse.
Rodrigues declarou que não há motivos para o MST criar “constrangimento com o governo Lula”. “O MST é parceiro do governo. Está com uma agenda de produção de alimento. Mas nós achamos justo que, no mês de abril, o MST possa apresentar a nossa pauta, que é o assentamento imediato de 60 mil famílias acampadas, na sua grande maioria, desde o governo Dilma (Rousseff)”, afirmou.
Crise
Apesar da fala de Rodrigues, há uma crise no governo Lula. O titular da Agricultura, por exemplo, já classificou em suas redes sociais a ação do MST como “crime” e “inaceitável”. Fávaro tem destoado do restante da gestão petista no que diz respeito à atuação dos sem-terra.
O ministro chegou a Londres na última terça (18), após as primeiras invasões do fim de semana, e embarcou de volta ao Brasil na noite de quinta (20). Fávaro cancelou a palestra que faria a empresários no Lide Brazil Conference, em Londres, e voltou às pressas ao Brasil.
Ilegalidade
Também aliado de Lula, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), saiu na mesma linha. O “Abril Vermelho” é alusivo ao massacre de Eldorado dos Carajás (PA), quando 18 sem-terra foram mortos por policiais em 1996, enquanto ocupavam uma rodovia. “É fundamental que o Brasil possa ter tranquilidade no campo e segurança jurídica da propriedade de terra. Deve-se combater toda ilegalidade. Desejo que se construa uma pacificação desse ambiente e que possa valer a Justiça para coibir toda e qualquer ilegalidade”, disse Helder.
Filiado ao PL de Bolsonaro, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, definiu os objetivos do movimento como estritamente políticos. “Que bom o governo estar criticando a ação do MST em áreas públicas produtivas. Eles têm de rever o que querem. Não pode acontecer uma invasão dessa só para terem apoio político. Me parece muito mais uma ação política. Esse movimento é estritamente político. Quem faz balbúrdia perde a razão”, disse Castro.