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O pagamento do plano do governo federal para ajudar os mais necessitados durante a pandemia do coronavírus acaba nesta quinta e traz consigo um leque de incertezas

Benefício fez a pobreza diminuir durante a pandemia e investiu 3,5 vezes o orçamento da assistência social. (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

O que você planeja para o ano novo? Trocar de carro, fazer mais viagens, uma casa nova – com mais espaço para toda a família… 2021 se aproxima e traz consigo muitos desejos de renovação. Porém, para muita gente, milhões de brasileiros na verdade, não há nem mesmo o direito de sonhar com dias melhores. O motivo é a incerteza.

Na virada do ano, chega ao fim os pagamentos do auxílio emergencial, financiado pelo governo federal para socorrer os mais pobres na crise gerada pela covid-19. A doença e seus efeitos sanitários e econômicos ainda não deram trégua, mas o dinheiro já acabou e trouxe ainda mais angústia a quem teme novos lockdowns e não sabe como fará para garantir a própria sobrevivência.

Durante cinco meses de 2020, Mauro de Araujo, 41 anos, costumava ser reconhecido pela profissão. “Eu era promotor de vendas”, orgulha-se. Foi demitido no meio de uma das maiores crises sanitárias da história. A pandemia do novo coronavírus – embora ele agradeça não ter tirado-lhe a saúde – deixou-o sem renda e também perspectivas.

Como promotor de vendas, Araujo tinha um salário fixo todo o fim do mês, passagem para pegar ônibus e ajuda de custo com alimentação. O auxílio emergencial, embora não tenha chegado diretamente para ele, foi pago à esposa. R$ 600 passou a ser a renda da casa onde ele mora com a companheira e uma criança de quatro anos. De outro casamento há ainda despesa com outros dos filhos adolescentes.

“O auxílio ajudou muito. Mas o último pagamento da minha esposa foi em novembro. Agora, nem feira para o mês consigo fazer mais. Todos os dias levo para casa uma coisa ou outra que está faltando e a gente vai se virando. Não é pior porque graças a Deus minha esposa tem casa própria. Se tivesse aluguel também, nem sei o que iria fazer”, diz ele. Sem emprego formal, a nova ocupação do ex-promotor de vendas e numa banca de frutas no Centro de Camaragibe. Lá comercializa de caju a uva e fatura de R$ 30 a R$ 50 “num dia bom”.

Esse tal de “bom dia” é outro fator preocupante que insiste em não aparecer e recompor o rendimento de famílias inteiras. Em Pernambuco, desde o mês de junho o comércio passou a reabrir as portas após a fechada repentina para conter o avanço da curva de casos da covid-19. A medida adotada dentro do Plano de Convivência do governo do Estado para retomada da atividade econômica foi comemorada por quem preciso “fazer dinheiro todos os dias”, mas de lá até este mês de dezembro, o rendimento dos dias trabalhados não são nem os mesmos de 2019.

“Todos os dias eu estou aqui. Das 8h às 18h. É só a graça… tem dia que venho armo a barraca, passa o tempo, desarmo e vou embora. Sem vender nada. Eu recebi auxílio emergencial, e foi uma benção. Não quero receber para sempre. O que queria mesmo é que as coisas melhorassem. Como isso ainda não aconteceu, a gente fica assim perdido sobre como vai ser o ano que vem”, desabafa Cristiana Francisca Vidal, 55 anos.

Há pelo menos oito anos a renda dela era de no máximo R$ 100 ao dia com a venda de perfumes e cosméticos na rua. Para conseguir o auxílio emergencial foram três tentativas de cadastro. “Só veio sair (o primeiro pagamento) em meados de agosto. Recebo ainda agora em dezembro, está garantindo meu Natal, mas depois não sei. Tem gente que fala ser muito dinheiro, mas pegue R$1,2 mil, pague as contas e vá num supermercado. O dinheiro voa e você nem vê. Tudo é muito caro”, reclama.

Nas contas do Ministério da Cidadania, o auxílio emergencial chegará ao fim sendo pago a quase 69 milhões de brasileiros. Muitos deles são beneficiários do Bolsa Família, que viram a renda crescer, mas tantos outros são desempregados, trabalhadores informais e autônomos que passaram a ter o auxílio emergencial como única fonte de renda.

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