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“O teto de gastos não acabou, não morreu”, diz o novo secretário do Tesouro

Paulo Valle disse considerar “normal” debate sobre greve após dois anos sem aumento salarial. (Foto: Pedro França/Agência Senado)

Novo secretário do Tesouro, Paulo Valle, assumiu o cargo em meio à tumultuada negociação da PEC dos Precatórios e do Auxílio Brasil de R$ 400, que levou à saída de quatro integrantes da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Após a votação da PEC e do Orçamento, Valle diz que a defesa do equilíbrio fiscal está na essência do trabalho do Tesouro. Na primeira entrevista, o secretário diz que o teto de gastos não morreu e que é possível reverter a percepção de piora das contas públicas ao longo de 2022.

Ele antecipa que ajustes terão que ser feitos no orçamento para remanejar recursos para áreas que ficaram com dotações abaixo do necessário.”Por ora, não estamos com a percepção de ter saído tanto das nossas projeções. Mas teremos que fazer ajustes no Orçamento ao longo do primeiro semestre”, afirma. Valle comenta a polêmica em torno do reajuste salarial apenas para os policiais em 2022: “Foi uma decisão política”. E lembra que os R$ 1,7 bilhão previstos no Orçamento não estão vinculados à nenhuma categoria específica.

1) O sr. assumiu o cargo num momento difícil, após a saída de integrantes da equipe econômica descontentes com os rumos das contas públicas na negociação da PEC dos precatórios. Qual será a estratégia agora?

A defesa do equilíbrio fiscal está na essência do trabalho do Tesouro. Essa defesa não é um fim em sim mesmo, mas um meio para possibilitar ao estado brasileiro a capacidade financeira futura de realizar políticas públicas meritórias. O Brasil, apesar do importante recuo pós-pandemia, ainda tem um nível de endividamento acima de seus pares e longe de ser confortável. Um equilíbrio fiscal crível e bem ancorado, que demonstre a capacidade do país de manter o nível de endividamento sob controle trará como benefícios uma redução no nível de juros, como aliás já experimentamos no passado recente, com reflexos no custo de endividamento do governo e dos cidadãos.

2) Qual é esse impacto?

Para se ter uma noção do que estamos falando, uma elevação média de um ponto percentual no custo da dívida pública federal produziria um impacto superior a todo investimento público e equivalente a mais da metade do programa Auxílio Brasil.

Apesar das previsões do governo mais otimistas com redução do déficit, há uma clara percepção de piora da política por conta das últimas votações do Congresso do Orçamento e da PEC dos precatórios.

Ainda temos o efeito da pandemia e a inflação que preocupa, mas em termos da política fiscal acredito que estamos alinhados com o projeto de irmos voltado aos poucos para o equilíbrio. Em 2021, teremos um déficit de 1%. A crítica maior que está tendo é mais em relação aos tipos de gastos, a qualidade, e não em relação ao montante. Quanto mais rápido voltarmos para o equilíbrio fiscal, melhor.

3) Mas os investimentos públicos estão no piso?

O Brasil está tendo uma performance melhor em termos de investimento privado, que está acima dos nossos pares entre os países emergentes. Boa parte é fruto dos projetos aprovados, como a reforma do saneamento. É uma recuperação rápida. O investimento público, que é necessário, passa por essa melhoria da eficiência do orçamento.

4) É possível reverter essa percepção de piora das contas públicas depois da votação do orçamento com mais despesas?

O fato é que o teto de gastos não acabou, não morreu. Por ora, não estamos com a percepção de ter saído tanto das nossas projeções. Mas teremos que fazer ajustes no Orçamento ao longo do primeiro semestre. Em 2022, não vamos chegar ao superávit primário, mas estamos na direção.

5) Quais ajustes?

Ajustes de despesas que a dotação ficou a abaixo (do necessário) do que pedimos. Vamos ter que recompor. Terá ter complementação de algumas despesas por projeto de lei. Devemos começar com um orçamento mais restritivo na execução e depois vamos fazer um projeto de lei para ajustar essas despesas, principalmente nas obrigatórias para a recomposição.

6) Como o governo fará essa recomposição?

Com remanejamento em detrimento de outras despesas. Mas é bem diferente do que aconteceu no ano passado, quando teve um corte muito grande das despesas obrigatórias que não eram factíveis. Estamos ainda ajustando os detalhes.

7) O orçamento de 2022 é administrável?

Sim, é administrável. A nossa expectativa é que clareando a PEC dos Precatórios (já promulgada), e a aprovação do Orçamento há um espaço, sim, para ancorar as expectativas e voltar parte dos prêmios de risco (dos títulos públicos) que aumentaram. Se voltará tudo, não sei dizer, porque estamos entrando num ano eleitoral, que sempre gera ruído. Mas já voltou boa parte, e nossa expectativa é essa. Na dívida externa, houve um aumento do custo de 60 pontos-base dos papeis brasileiros em relação aos países emergentes. Achamos que não se justifica. Há um espaço para voltar partes desses prêmios.

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