Pedir um drink no final de semana ou abrir uma garrafa de vinho depois do expediente podem parecer decisões inofensivas. No entanto, à medida que o corpo envelhece, os efeitos do álcool se tornam mais intensos. E, após os 40 anos, os impactos metabólicos, hormonais e inflamatórios do consumo alcoólico aumentam significativamente os riscos do consumo.
“O álcool é sempre uma substância tóxica, mesmo que socialmente tolerada”, alerta a médica nutróloga Marcella Garcez, diretora da Associação Brasileira de Nutrologia. Segundo ela, para quem busca um envelhecimento saudável, o melhor caminho é uma redução significativa da substância – ou mesmo a abstinência.
Se você já passou dos 30, provavelmente já percebeu qua ressaca é mais forte e mais duradoura do que aos 20 e poucos anos. Isso acontece porque, a partir da terceira década de vida, sofremos uma queda progressiva na massa magra, no volume de água do corpo e também no funcionamento das enzimas hepáticas que metabolizam o álcool. Tudo isso faz com que mesmo pequenas doses causem efeitos mais intensos e prolongados – é o caso de distúrbios do sono, alterações cognitivas e riscos de queda.
Com o passar dos anos, o álcool também afeta a regulação hormonal: nas mulheres, pode interferir na metabolização do estrogênio e intensificar os sintomas da menopausa; nos homens, reduzir os níveis de testosterona e agravar a andropausa, nome dado ao climatério masculino.
A liberação de cortisol e do hormônio do crescimento, dois reguladores importantes do metabolismo, também sofrem impactos negativos do álcool. Na prática, a produção desregulada pode tornar mais intensos os distúrbios metabólicos que são mais frequentes à medida que envelhecemos – diabetes, hipotiroidismo, síndrome metabólica, osteoporose e sarcopenia.
Outros pontos de atenção para o consumo de álcool depois dos 40 anos são o metabolismo e órgãos como o fígado, o intestino e o pâncreas. O álcool é tratado como prioridade pelo fígado – o que significa que, quando entra no corpo, ele inibe a queima de gorduras e carboidratos. Com a queda natural da taxa metabólica basal que vem com a idade, esse mecanismo contribui para o acúmulo de gordura visceral, resistência insulínica e dificuldade para perder peso. “Também há um prejuízo progressivo na função hepática, com risco aumentado de esteatose, hepatite alcoólica e cirrose, mesmo em quem bebe socialmente”, explica Garcez. Além disso, álcool pode desencadear pancreatite crônica, comprometer a barreira intestinal, alterar a microbiota e aumentar a permeabilidade intestinal, o que favorece processos inflamatórios e a piora na prisão de ventre.
A nutrição e a saúde dos ossos também entram na conta: depois dos 40 anos, a absorção de nutrientes tende a diminuir naturalmente, o que se agrava com o consumo de álcool. Assim, nosso corpo retém cada vez menos vitaminas do complexo B, vitamina D, cálcio, magnésio e zinco – elementos essenciais para a imunidade, a cognição, os ossos e os músculos
Com isso, condições como osteoporose e sarcopenia (perda de massa muscular) se tornam ainda mais preocupantes. “O álcool inibe a formação óssea, reduz a síntese de proteínas musculares e aumenta marcadores inflamatórios como IL-6 e TNF-alfa, que aceleram o envelhecimento celular”, pontua a nutróloga.
Existe dose segura? A resposta é não. Marcella Garcez explica que diretrizes internacionais já recomendam há alguns anos uma moderação rigorosa do consumo de álcool a partir dos 60 anos, mas que revisões sistemáticas mais recentes vêm mostrando que a chamada “dose segura” pode simplesmente não existir, em qualquer etapa da vida.
Essa posição foi reforçada pela Organização Mundial da Saúde: em 2023, a OMS afirmou categoricamente que nenhuma quantidade de álcool é saudável, especialmente para a prevenção de doenças crônicas.
O oncologista Ramon Andrade de Mello, pesquisador honorário da Universidade de Oxford e membro do corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, reforça o alerta: “O etanol é um agente carcinogênico de classe 1. Ou seja, mesmo em pequenas doses, pode aumentar o risco de cânceres como de mama, de fígado e de trato gastrointestinal, principalmente quando somado a outros fatores como tabagismo e predisposição genética.”
Mas, mais do que cortar totalmente, especialistas defendem um consumo consciente e adaptado à realidade individual. “O conceito de uso de baixo risco é relativo e não equivale a uso seguro. A melhor escolha, especialmente para quem busca longevidade com qualidade, é repensar a presença do álcool na rotina”, fala Garcez. Se você tem mais de 40 anos, portanto, vale observar com atenção como seu corpo reage a cada gole.
A ideia não é demonizar o drink de sábado à noite, mas repensar se ele ainda serve ao seu bem-estar. Muitas vezes, o organismo dá sinais de que não lida bem com o álcool mesmo em quantidades consideradas pequenas, mas nós ignoramos. É o caso de ressacas prolongadas, insônia, dor de cabeça, palpitações, alterações de humor, refluxo e distensão abdominal. “Esses sintomas indicam baixa tolerância e uma possível sobrecarga dos sistemas de metabolização”, diz Garcez. Nesses casos, a recomendação é simples: reduza ou pare.
E o vinho tinto? Apesar da fama de “cardioprotetor” — graças ao resveratrol e outros polifenóis — nem mesmo o vinho escapa dos efeitos adversos do etanol. “O efeito protetor dos antioxidantes não anula o dano celular causado pelo álcool”, afirma Ramon Andrade de Mello. “Para quem busca os benefícios do resveratrol, há alternativas mais seguras como o suco de uva integral ou suplementos formulados.” As informações são da revista Vogue.