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Prisão de executiva chinesa evidencia a preocupação americana com o avanço de empresas asiáticas na computação quântica e internet das coisas. O Ocidente teme espionagem

O valor da fiança de Meng Wanzhou foi fixado em 10 milhões de dólares canadenses. (Foto: Reprodução)

A prisão, no Canadá, de Meng Wanzhou, executiva da gigante chinesa de tecnologia Huawei, a pedido dos Estados Unidos, derrubou Bolsas de Valores do mundo inteiro na quinta-feira e levou analistas a temerem o fim da trégua na guerra comercial entre EUA e China.

No dia 1º, Donald Trump e Xi Jinping fecharam um acordo, na reunião do G-20 em Buenos Aires, para suspender um aumento recíproco de tarifas sobre US$ 200 bilhões em exportações bilaterais, que entraria em vigor em janeiro.

Mas o alívio durou pouco. A crise desencadeada pela prisão da executiva da Huawei deixou claro que, muito além de aço, soja e automóveis, o que está em jogo na guerra comercial é uma corrida tecnológica que, segundo especialistas, pode determinar quem vai guiar a próxima revolução industrial. Antes líderes incontestes no setor, com Google, Facebook, Microsoft e Amazon, os americanos veem os chineses se aproximando rapidamente e, em algumas áreas, já ficaram para trás.

Da lista de 50 start-ups mais valiosas do mundo, 22 são chinesas, incluindo as duas primeiras do ranking: Ant Financial e Bytedance. Os EUA têm 18 companhias no ranking. No relatório anual da Organização Mundial da Propriedade Intelectual, divulgado no último dia 3, o escritório chinês foi recordista de patentes em 2017: 1,38 milhão de pedidos, mais que o dobro de sua contraparte americana, com 607 mil.

“Os EUA têm uma liderança significativa na indústria de tecnologia, porque temos um grande mercado consumidor e investimos em pesquisa e desenvolvimento. O problema é que a China também tem”, diz Robert Atkinson, presidente do think tank Information Technology & Innovation Foundation e que copresidiu o Escritório da Casa Branca para Políticas de Ciência e Tecnologia no governo Barack Obama. “O que os chineses estão fazendo é uma ameaça sistemática a essa liderança.”

O crescimento exponencial das empresas chinesas de tecnologia nos últimos anos ocorreu graças a pesados subsídios de Pequim à indústria loca. O governo chinês impõe barreiras à entrada de companhias estrangeiras no seu mercado doméstico, exigindo contrapartidas que incluem o repasse de tecnologias. Para Atkison, Pequim usa a espionagem cibernética “de forma agressiva” para roubar segredos da indústria e de governos e repassá-los a companhias chinesas.

No caso da prisão da executiva da Huawei, o pedido dos EUA se baseou na acusação de que a empresa usou uma companhia de Hong Kong para fazer negócios com o Irã, violando sanções impostas pelo Ocidente. No entanto, há meses a Huawei já estava na mira dos americanos. Agências de inteligência alegam que a empresa mantém relações com o governo chinês e que seus equipamentos têm portas secretas para espionagem. Nenhuma prova foi apresentada, e a empresa nega a acusação.

Mas a pressão americana levou Austrália e Nova Zelândia a banirem equipamentos Huawei na construção de suas redes de telefonia 5G. E operadoras do Reino Unido e Canadá também excluíram os aparelhos da Huawei.

A suspeita de espionagem se soma a um temor de ficar atrás na corrida tecnológica, que hoje ocorre em diferentes campos além da rede 5G, como inteligência artificial, painéis solares ou computação quântica.

No ano passado, Pequim divulgou projeto para se tornar líder no campo da inteligência artificial, ainda dominado pelos americanos. Segundo o documento, o primeiro passo é alcançar os EUA até 2020, para se tornar líder global até 2030. Nessa linha, o país respondeu por 48% dos investimentos globais em start-ups de inteligência artificial em 2017, assumindo a posição dos EUA, com 38% do montante total. No ano anterior, a participação chinesa era de apenas 11,3%.

Centro tecnológico

A China tem uma estratégia para estar à frente da próxima onda de inovação. Batizado como Made in China 2025, o plano pretende transformar o país de fábrica para centro tecnológico do mundo.

A China também investe para ser o primeiro país a alcançar a computação quântica. Em vez dos bits binários, esses computadores usam o movimento de partículas subatômicas para processar dados em quantidades impensáveis com as tecnologias atuais, com uma fração da energia. Em 2016, o país lançou o primeiro satélite quântico e anunciou o investimento de US$ 10 bilhões para a criação de um novo centro de pesquisas na área.

O satélite ainda não tem muitas funções, mas ilustra a estratégia chinesa de dominar a tecnologia. Pelo poder de processamento, os computadores quânticos tornarão os atuais sistemas de proteção cibernética obsoletos. Para o tráfego seguro de dados, a comunicação exigirá criptografia quântica, e o satélite chinês é a última palavra em tecnologia.

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