A morte de George Floyd, nos EUA, gerou uma nova onda de manifestações contra o racismo e o comportamento da polícia perante minorias na França, problema há décadas negligenciado.
É uma noite amena, e centenas de pessoas ajoelham-se em silêncio na histórica Place de la Republique, em Paris, para prestar homenagem a George Floyd, que estava sendo sepultado a mais de 8 mil quilômetros de distância, no estado americano do Texas.
Sob uma imponente estátua de Marianne, a personificação da República Francesa, cartazes dizem “Vidas negras importam também na França”, “Não ao racismo” e “Não consigo respirar”.
Manifestantes, muitos claramente desconfortáveis, lutam para ficar de joelhos por cerca de nove minutos – o tempo que um policial branco em Minneapolis manteve o joelho no pescoço de Floyd, levando-o à morte.
A brutalidade daqueles momentos finais da vida de Floyd, filmados e reproduzidos aos milhões na internet, ressoa fortemente na França, que há décadas lida com seu próprio problema de violência policial.
“Na França, dizemos que somos todos iguais, mas não somos todos tratados igualmente. Se você é um jovem negro ou um homem árabe, você é alvo e assediado pela polícia”, comenta Denis, um jovem negro de 22 anos, que prefere não dizer seu sobrenome. “Não estamos inventando isso, mas os brancos não querem nos ouvir ou acreditar em nós. Eles acham que estamos exagerando”.
Dina Sanches Tavares tem visão semelhante. “Meu irmão de 16 anos é constantemente parado e revistado pela polícia, mesmo quando simplesmente está voltando da academia de ginástica. Temo muito pela segurança dele”, diz. “Você consegue imaginar como é assustador ser tratado como um criminoso simplesmente por causa da sua aparência?”
A raiva é palpável na França, onde o assassinato de George Floyd reacendeu os apelos à justiça para Adama Traoré, um jovem negro de 24 anos que morreu sob custódia policial em julho de 2016. Apesar de não haver vídeo, as circunstâncias têm levado a comparações com a morte de Floyd.
No mês passado, um relatório médico ordenado por um tribunal determinou que os policiais que prenderam Traoré não tiveram envolvimento na sua morte e que ele morreu devido às condições de saúde subjacentes e à insuficiência cardíaca. No entanto, uma autópsia independente ordenada pela família concluiu que a morte de Traoré foi causada por técnicas de detenção, provocando protestos em toda a França, com a participação de milhares de pessoas.
“Hoje não estamos falando apenas da luta da família Traoré. É a luta por todos. Quando lutamos por George Floyd, lutamos por Adama Traoré”, disse sua irmã, Assa Traoré, em um protesto no início deste mês, à agência de notícias AFP.
Assim como nos Estados Unidos, as minorias na França também estão exigindo da polícia transparência.
“Tanto na polícia americana quanto na francesa, o racismo é estrutural”, diz Madjid Messaoudene, político e ativista local em Seine-Saint-Denis, um subúrbio do norte de Paris.
A França tem muito menos tiroteios fatais envolvendo a polícia do que os EUA, mas muitos dizem que o país está fazendo menos para combater a violência policial que os americanos.
“Temos muitas famílias na França que estão esperando por justiça para seus filhos mortos pela polícia. Eles não podem virar a página e seguir em frente porque sentem que a vida de seus filhos não é considerada importante. Isso tem que mudar”, afirma o político.
É uma história muito familiar em Seine-Saint-Denis, que é notória por seu alto desemprego, baixa renda e prédios altos. Assim como o banlieu – ou subúrbio – onde Adama Traoré morreu, Seine-Saint-Denis é o lar de muitos árabes e negros com raízes nas antigas colônias francesas.
As relações com a polícia são tensas há muito tempo. O dia a dia da maioria dos jovens, diz Madjid Messaoudene, envolve checagem de identidade, revistas, assédio e violência por parte dos policiais. As informações são da emissora internacional de notícias da Alemanha Deutsche Welle.
