No ano passado, o veterano jornalista e comentarista político Alexandre Garcia, 78 anos, encerrou o seu vínculo de três décadas com a Rede Globo – de comum acordo, segundo as duas partes. Saiu do ar o profissional da imprensa que se destacou pelo jeito solene e, para muitos, um autêntico influenciador digital dos novos tempos: ele está chegando à impressionante marca de 1,1 milhão seguidores no Twitter e parece se divertir fazendo postagens sobre comida, animais de estimação, noticiário internacional e, é claro, política.
Mas Garcia não cortou completamente os laços com a mídia tradicional: faz um comentário diário para 290 emissoras de rádio e escreve uma coluna publicada em 20 jornais de todo o País. Há informações, que ele não confirma, de que estaria inclusive na mira da futura CNN Brasil. E em conversas com ex-colegas, ele revela que em breve terá um canal próprio no site de vídeos YouTube
A esquerda nunca foi muito simpática a Alexandre Garcia. Em sua carreira, ele ficou associado ao conservadorismo e à direita. Gaúcho que começou no “Jornal do Brasil”, ele foi porta-voz do general João Baptista Figueiredo, último presidente da ditadura militar (1979-85).
No final dos anos 1980, personificou na Globo o apoio da emissora ao então candidato e depois presidente Fernando Collor de Mello, ganhando a antipatia eterna de muitos petistas. Mais recentemente, foi convidado por Jair Bolsonaro para ser seu porta-voz, o que acabou recusando – segundo ele, por questões apenas profissionais, não ideológicas.
Mas ele não esconde sua simpatia por diversas bandeiras do atual governo, como endurecimento penal e direito às armas, e já ganhou elogios públicos do presidente. Na última quinta-feira, Garcia foi um dos 11 jornalistas selecionados por Bolsonaro para uma café da manhã no Palácio do Planalto.
Indagado sobre o que acha de ser considerado por muitos uma espécie de “porta-voz da direita”, ele rejeita de bate-pronto: “Eu não sou nada. Eu sou jornalista. Jornalista não pode ser nada, eu não tenho nem time de futebol”.
Ser rotulado, para ele, é algo que foge de seu controle. “Já votei no Lula, no Fernando Henrique Cardoso…”, garante. Tem mais: entre os seus amigos estão figurões do PT.
“Eu tenho amigos como por exemplo o Zé Dirceu, Aloizio Mercadante, José Genoino. Rótulo qualquer um pode pregar em qualquer pessoa. Minha escola é aquela que considera jornalismo algo isento, neutro, em que os fatos são mais fortes”.
Como Alexandre se definiria então? Conservador? Nacionalista? Liberal? “Eu me considero um patriota”, ele responde. “Eu amo meu país, ponto final”.
Militares
Uma ligação muito forte dele é com as Forças Armadas. Seu Twitter está cheio de imagens com militares, participando de eventos e fazendo comentários elogiosos a eles. A grande presença da caserna, segundo ele, é um ponto positivo do novo governo.
“Todos eles são muito bem preparados, gente muito simples, que não está se empolgando com o poder. Não têm interesses político-partidários. Aí dá para confiar, porque a pessoa só tem um interesse, que se chama Brasil”, prossegue.
Alexandre Garcia é reticente em suas análises sobre o governo. Diz que é cedo para ter um veredito. “Ainda tenho que esperar uma consolidação maior para dar opinião”, afirma. Também sai pela tangente quando peço para que comente a comunicação oficial, em especial a interferência de Carlos Bolsonaro, filho do presidente, via redes sociais.
“Não tenho o visto o Carlos Bolsonaro na comunicação, tenho visto nas redes sociais. Não sei se interferiu”, diz. Mas aposta que a escolha do general Otávio Rego Barros para o cargo que ele recusou, o de porta-voz da Presidência, foi um acerto. “Ele fez um grande trabalho Exército [onde cuidava da comunicação]”.
Alexandre gostou da proposta de reforma da Previdência apresentada por Bolsonaro. “Ela é necessária. Aprovar é uma obrigação do Congresso, não é favor, porque senão nós vamos ficar na mão”.
Mas também tem críticas ao atual governo. No dia em que conversamos, havia acabado de finalizar um artigo criticando a ideia do ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, de pedir que escolas filmassem crianças cantando o Hino Nacional.
Nada contra o hino, obviamente, para alguém que preza os símbolos pátrios. O problema, para Alexandre, foi o pedido para que os alunos repetissem o slogan de campanha de Bolsonaro, “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” – especialmente a segunda parte.
