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Reforma do Código Civil brasileiro mantém proibição a barriga de aluguel

O projeto de reforma do Código Civil mantém o veto a pagamentos por gestação por substituição. (Foto: Reprodução)

Protocolado em janeiro no Senado, o projeto de reforma do Código Civil mantém o veto a pagamentos por gestação por substituição – método popularmente conhecido como barriga de aluguel – e transforma em lei normas do CFM (Conselho Federal de Medicina) sobre reprodução assistida.

Atualmente parada na Casa, a proposta também abre a possibilidade para que a pessoa nascida de reprodução assistida possa pedir autorização judicial para saber quem é o pai biológico. Ao mesmo tempo, permite que o doador também possa ter acesso ao nome da criança. Atualmente as duas coisas são proibidas.

O projeto também libera a chamada barriga solidária (quando não há pagamento à mulher que engravida) para pessoas sem parentesco, desde que haja justificativa.

Atualmente, não existe no Brasil uma lei que trata da reprodução assistida. O tema é regulamentado por uma resolução do Conselho Federal de Medicina, cuja versão mais recente é de 2022.

Se aprovado, este ponto do projeto leva o assunto para o Código Civil. Situação que pode acabar engessando a legislação sobre o tema, segundo a advogada Silvia Marzagão, sócia do escritório Silvia Felipe Marzagão e Eleonora Mattos Advogadas.

“A mudança de qualquer coisa dentro de um código é mais difícil. Como estamos falando de uma situação que envolve tecnologias com mudanças constantes, talvez fizesse mais sentido isso não estar no Código Civil, mas sim numa lei apartada, que teria um trâmite legislativo mais fácil se houvesse necessidade de alteração posterior.”

Faria mais sentido a proposta se concentrar em questões de filiação, segundo a advogada. “Pessoas nascidas por reprodução assistida são filhos, assim como os nascidos de forma ‘natural’, vamos usar essa palavra. Isso faria mais sentido, mas não tratar do procedimento em si e do que se faz com o material (doado).”

Já a proposta que permite a divulgação da identidade de um nascido ou de um doador, pode ser um problema, diz Silvia. Atualmente, só é possível obter informações médicas sobre o material genético doado para reprodução assistida, mas não o nome.

“Na minha percepção, não há pai biológico. Há origem genética para fins médicos. Pai e mãe é quem faz parte do processo, do projeto parental, no caso da reprodução assistida. Isso é o que desvincula, por exemplo, o parentesco de mãe de quem faz o útero em substituição. Aquela pessoa serviu como meio do nascimento daquela criança.”

Já para a advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a mudança pode ser benéfica. Ela chegou a participar da subcomissão que discutiu a proposta do direito de família no projeto de reforma do Código Civil.

“Não vejo motivo algum para impedir que as pessoas conheçam. Se na adoção, que substitui no nascimento, tem essa possibilidade de saber quem são os pais biológicos, até por questão de simetria, as pessoas concebidas por essa inseminação deveriam ter essa possibilidade até por questões de saúde e prevenção de doenças”, diz. “De um lado existe o princípio da privacidade, mas o outro princípio, que acaba se chocando, é o princípio da identidade, que é o prevalente nessa história. Por isso que se faz esse balanço, esse diálogo entre as duas fontes, os dois princípios de natureza constitucional.”

Berenice diz que atualmente tanto a Justiça quanto os conselhos médicos não costumam investigar a fundo se há grau de parentesco nos casos de barriga solidária, para além de ouvirem as justificativas dos interessados. Por isso, ela considera que o projeto vai no caminho certo neste ponto, ao liberar o que já acontece na prática.

A advogada defende também que a possibilidade de barriga de aluguel também deveria ser liberada pela nova lei.

Já Marzagão afirma que o texto deixa o processo em aberto e pode significar um afrouxamento da fiscalização dos órgãos sobre os processos de reprodução assistida.

O projeto estabelece ainda o que deve acontecer com o material genético — óvulo, espermatozoide ou embrião — de quem morre. Nesses casos, a pessoa deve deixar em um documento escrito a autorização para o uso, com a indicação de quem vai recebê-lo. Para Berenice, a exigência de uma escritura pública dificulta e a manifestação dessa vontade. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.

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