O governo, o Congresso e o Banco Central (BC) discutem com os bancos e com o varejo uma solução para os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito. O rotativo do cartão é a linha de crédito mais cara existente hoje no País, com juros médios de mais de 437% ao ano – mas as instituições chegam a cobrar quase 1.000%, segundo ranking do BC. O consumidor cai no rotativo toda vez que opta por pagar apenas uma parte da fatura do cartão até o vencimento.
Para o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o rotativo do cartão de crédito é o “maior problema de juro” no País hoje. No início do mês de agosto, ele falou sobre a negociação com o setor e afirmou que uma solução deverá ser apresentada em até 90 dias, o que também foi apontado pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que declarou que a modalidade deve deixar de existir. Entenda abaixo o que é o rotativo do cartão e o que está sendo discutido.
O que é
O rotativo é acionado quando o consumidor não paga a totalidade da fatura do cartão de crédito até a sua data de vencimento. Nesse sistema, é possível que o titular pague apenas uma parte do saldo devedor mensal. O restante dos valores devidos “rodam” para o próximo mês.
Para utilizar essa opção, no entanto, há um custo, que normalmente é alto. O saldo que não foi pago é sujeito a juros que normalmente são mais elevados do que taxas de juros de outros tipos de crédito. Por isso, ao pagar apenas uma parte do valor da fatura do cartão de crédito, o consumidor pode acumular juros sobre valor remanescente, o que aumenta o total devido.
Caso a situação se repita, são acumulados juros sobre juros (juros compostos), aumentando exponencialmente o valor que deverá ser pago. Por esse funcionamento, o rotativo do cartão de crédito é responsável por dívidas acumuladas rapidamente.
Congresso
No Congresso, discute-se a possibilidade de tabelamento dos juros, caso o setor não se autorregule. O deputado Alencar Santana (PT-SP), relator do projeto que vai receber o conteúdo do Desenrola (programa de renegociação de dívidas do governo federal, enviado originalmente como Medida Provisória), já chegou a afirmar que vai propor, no seu parecer, um prazo para a autorregulamentação do segmento.
Se isso não acontecer, o texto vai propor que o juro do rotativo seja limitado ao mesmo patamar do cheque especial, que tem taxa anual máxima de 151,8% (o equivalente a 8% ao mês). Santana também trabalha com um prazo de 90 dias, a contar da futura publicação da lei.
Bancos
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), no entanto, discorda da possibilidade do tabelamento de juros e quer uma “transição sem rupturas”, que incluiria o fim do rotativo e um redesenho das compras parceladas. A visão é corroborada pela Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs), que apontou que, se o risco do cliente for acima da taxa limite do juro, o emissor vai cortar o crédito dessa pessoa, gerando um corte na concessão de cartões hoje realizada pelos bancos. O setor financeiro estima que até 65 milhões de cartões de crédito hoje em circulação poderiam ser cortados caso a taxa do rotativo fosse nivelada à taxa do cheque especial, por exemplo, sem uma diluição de riscos.
Os bancos dizem que a construção de uma saída passa por algum tipo de restrição às compras parceladas sem juros, que são consideradas uma “jabuticaba” do mercado de crédito brasileiro – uma modalidade que só existe por aqui. O problema é que elas são um dos motores das vendas no varejo, que resiste a mudanças. Trata-se, porém, de um benefício cruzado, pois quem cai no rotativo acaba pagando pela suposta venda sem juros, segundo a coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. “É uma propaganda enganosa.”
Bancos afirmam que, atualmente, diversos atores se beneficiam do parcelamento (lojistas, bandeiras, maquininhas de cartão), mas o risco fica concentrado no setor bancário. As instituições admitem acabar com o rotativo, mas argumentam que, de maneira concomitante, é preciso encontrar um reequilíbrio na cadeia de crédito. Durante as negociações, foi proposto, por exemplo, uma limitação do número de parcelas sem juros. Setores do comércio se opõem a essa medida, já que, na visão deles, ela poderia afetar a capacidade de pagamento da população.