“Não podemos salvar o Brasil matando idoso”, disse Jair Bolsonaro, o próximo presidente do Brasil. Ele está se referindo ao principal problema de política pública do País: um projeto de lei que muda as regras da Previdência, área que consome mais da metade do orçamento federal e está crescendo a uma taxa de quatro pontos porcentuais acima da inflação todos os anos. Ele não é a única pessoa na próxima administração a manifestar ambivalência e falta de urgência quanto ao controle dos gastos. “Temos quatro anos para fazê-lo”, diz Onyx Lorenzoni, seu ministro chefe da Casa Civil.
E ainda há muitos apostando que Bolsonaro agirá rapidamente para resolver um problema que atormenta o Brasil há anos. O otimismo vem da escolha do futuro presidente para o ministério da Economia: Paulo Guedes, que estudou na Universidade de Chicago e foi cofundador do banco de investimentos BTG Pactual. Os investidores estão colocando sua fé nele para comandar um ajuste fiscal de 4% a 5% do PIB, exigido para estabilizar a dívida pública, e as reformas liberalizantes necessárias para reavivar o crescimento após uma recessão em que varreu 7,3% do PIB entre 2015 e 2016.
O presidente que está saindo, Michel Temer, conseguiu fazer algumas reformas fiscais, notadamente estabelecer um limite para gastos federais e cortes nos empréstimos subsidiados. Mas as aposentadorias o derrotaram. As eleições deste ano opuseram Bolsonaro, um candidato da lei e da ordem recentemente convertido à retidão econômica, contra Fernando Haddad, um seguidor de esquerda de Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente preso. Durante a rancorosa e imprevisível campanha, as reformas foram suspensas. Os investidores decidiram “esperar que tudo se resolvesse”, diz Tony Volpon, do banco UBS. Agora, eles estão comemorando, talvez prematuramente. A moeda, que despencou nos últimos dois anos, ensaiou uma recuperação.
Generosidade
Como o Brasil tem reservas saudáveis em moeda estrangeira e sua menor taxa de inflação em décadas, o progresso depende não dos mercados ou instituições financeiras globais, mas dos políticos em Brasília. Isso é tanto encorajador como preocupante. “Para reformar o sistema, você tem de estar dentro dele”, diz Ana Carla Abrão, da consultoria Oliver Wyman. Mas os “insiders” resistiram à reforma das aposentadorias por anos.
A generosidade deles data da transição da ditadura para a democracia nos anos 80. A pressão para mantê-los generosos é “inimaginável”, diz Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente que tentou a reforma nos anos 1990. O sistema já chegou a ser ainda mais insanamente generoso.
O esquema do governo para trabalhadores do setor privado é fortemente subsidiado. O esquema do setor público é ainda mais abundante; não é incomum que funcionários públicos se aposentem aos 50 anos com pagamento integral. As aposentadorias de militares são ainda mais generosas – mas é improvável que sejam tocadas. (Bolsonaro, capitão aposentado, começou a receber sua pensão aos 33 anos). Tais grupos privilegiados certamente resistirão à reforma. Segundo o Tesouro Nacional, 41% dos benefícios previdenciários vão para os 20% mais ricos dos brasileiros e 3% para os mais pobres.
Mas o envelhecimento da população mostra que o sistema é insustentável. Havia oito trabalhadores para cada aposentado em 2000. Até 2060 haverá apenas dois, diz Paulo Tafner, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, um centro de estudos ligado ao governo. O governo gasta 12% do PIB sobre as pensões, em comparação com uma média de 8% nos países ricos da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
As aposentadorias desempenharam um papel importante no sentido de empurrar o coeficiente da dívida pública para o PIB, de 52% no final de 2013, para 74%. Sem reforma, pode superar em breve os 90%. Um congelamento de dez anos nos gastos federais em 2016 desacelerou o aumento da dívida. Mas, à medida que as aposentadorias continuaram a inchar, exacerbaram o aperto sobre os serviços públicos e o investimento em infraestrutura.
Muitos esperavam que, antes de tomar posse, Bolsonaro fosse capaz de fazer com que o Congresso atuasse e aprovasse uma reforma previdenciária paralisada, apresentada por Temer. Embora seja difícil aprová-la, o novo presidente ainda pode revivê-la no próximo ano. A proposta de Temer mantém o sistema “pré-pago”, no qual os trabalhadores atuais sustentam as aposentadorias, mas estabelece etapas graduais para uma idade mínima de aposentadoria e período mínimo de contribuição. Isso economizaria R$ 400 bilhões (US$ 100 bilhões) na próxima década. (Em comparação, a dívida pública líquida aumentou em R$ 260 bilhões desde o início do ano).
Outros defendem um radicalismo maior. Durante a campanha, Guedes propôs um modelo de “capitalização”, com os aposentados sacando benefícios dos potes de poupança acumulados durante o período em que trabalharam. Vários esquemas, todos menos ousados, estão sendo considerados. Um dos mais notáveis seria um sistema pré-pago pela maioria das pessoas aposentadas, mas com regras de elegibilidade mais restritas; uma pensão mínima garantida para os mais pobres; e um sistema de capitalização para rendimentos elevados. Segundo Paulo Tafner, um de seus autores, isso economizaria R$ 1,3 trilhão em dez anos.
